DEIXAREI SAUDADE − 210

Postado 26 de agosto de 2022 por Eitel T. Dannemann e arquivado em 2022, DÉCADA DE 2020, FOTOS.

Depois de muitos anos abrigando humanos com suas quinquilharias, sim, muitos anos, pois sou um dos mais antigos imóveis dessa redondeza¹. Pois bem, então, depois de muitos anos fincada nesse chão, percebi uma forte característica dos humanos: saudosismo. Como é que eu sei disso? Ora, de tanto ouvir o povo daqui falar do passado, das lembranças disso, daquilo, que a Cidade já não é a mesma, bom mesmo foi no tempo do Genésio e do Binga², até que um falou que isso era saudosismo. Foi assim que fiquei sabendo. E cada vez que se juntam em um dos meus cômodos sempre comentam, principalmente os mais rodados, que as casas antigas estão sendo demolidas para a construção de edifícios. Ah, lembram até hoje da padaria que tinha aqui ao lado, e se não me engano, tinha o nome de São Rafael. Diziam na época que era o pão de sal mais saboroso da Cidade. Bem, como nunca comi pão, me isento de comentários. Pois bem, voltando ao saudosismo, sei lá, acho que não tenho isso não. Ouço direto eles falando de minhas semelhantes demolidas e, sinceramente, não tenho o que dizer. Afinal, dizer o que? Por um acaso um imóvel tem como lutar contra o progresso? A não ser aqueles tombados pelo patrimônio, raríssimos, os outros, todos os outros, tadinhos, vão se transformar em escombros para ceder lugar aos edifícios, assim como eu também. Sinceramente, não me desespero com isso, porque nada vai mudar a minha sina com desespero. Só me resta torcer para que ainda demore muito, o que eu duvido, pois o progresso é esfomeado, ganancioso, devorador. Assim como todas as minhas semelhantes ainda de pé e todas as que já tombaram, faço parte da História de Patos de Minas. Isso ninguém tira de mim e de nenhuma de nós. E também como as outras, quando eu for demolida, deixarei saudade!