Poucos sabem que eu já fui uma só. Antigamente isso aqui fazia parte de uma fazenda que, com o progresso da Cidade, foi sendo desmembrada e transformada em terrenos e lotes. Numa dessas áreas eu nasci, no meio do mato, pois que ainda não havia ruas demarcadas. O tal progresso, desordenadamente, tratou de fabricar ruas e foi assim que surgiu essa aqui onde fui erguida¹, pequenina, mas útil ao povo que então não tinha automóveis. Um dia, sei lá por qual motivo, fizeram uma enorme mudança em minha estrutura física. De repente, eu, que era uma só, me transformei numa vila com muitas casinhas. Sinceramente, até gostei, pois aumentou o número de almas ocupando o meu espaço. Foi um longo tempo de tranquilidade, até que eu comecei a me preocupar com as transformações físicas ao meu redor. Depois que asfaltaram todas as ruas percebi que casinhas simples como eu foram desaparecendo para ceder lugar a edifícios, como esse bitelo aí. Aí o bicho pegou, aí meu semblante foi caindo ritmicamente de acordo com o surgimento desses paredões. Até que há pouco tempo minhas inúmeras paredes ouviram vozes sinistras se perguntando se o terreno ia mesmo ser negociado. Aí bateu o desespero, veio a certeza de que, se um dia fui uma e me transformei em vila, agora não serei mais nada para ceder lugar ao inexorável progresso. E esse negrume na rua parece até uma sombra maligna querendo me devorar, querendo desaparecer comigo para sempre. É a vida, sempre falam por aí. É, é vida, desaparecerei para sempre, mas fazendo parte da História de Patos de Minas. E deixarei saudade!
* 1: Rua João Maria de Souza, no Bairro Rosário.
* Texto e foto (06/05/2019): Eitel Teixeira Dannemann.