Dizem que lembrança é coisa de velho. Se é para os humanos, pouco me importa. Para nós, imóveis, tanto faz. Tanto faz porque de nada adianta nós termos lembrança de alguma verdade em nossas vidas porque isso simplesmente não altera o roteiro traçado desde o assentamento do primeiro tijolo: nós surgimos, servimos de abrigo a muitas almas e depois, sem sentimento algum, somos demolidas para que o progresso se instale. Vil progresso, como se ele fosse a cura para todos os males. Está lá o prédio da antiga Cadeia Pública, em ruínas, desprezada. Alguma autoridade já considerou a importância daquele imóvel para a nossa História? Fosse gente de cultura elaborada, aquela construção estaria sendo tratada a pão de ló por todos os serviços que nos prestou. E assim são muitas outras, algumas que, na calada da noite, foram impiedosamente assassinadas em nome do vil progresso.
Tenho uma lembrança que tem tudo a ver com o futuro de qualquer imóvel. Lá pelo final da década de 1980, as almas que me habitavam compraram um videocassete, que naquela época era caro pra caramba, e tinha até consórcio para adquiri-lo. Que felicidade, que euforia daquela gente com a novidade de tamanha tecnologia. Como o tempo é célere, veio o progresso, o DVD, e foi-se o videocassete, que ficou muitos anos enfurnado num canto qualquer de minhas entranhas até que deram um sumiço nele para sempre. O que isso tem a ver comigo? Eu sou um videocassete ainda em uso. Um dia, sei lá quando, quando não me considerarem mais útil, serei substituída por um DVD, um prédio como esse aí ao lado para abastecer o progresso. Assim será, sei disso, não me importuno, não me desespero, é a sina, não é assim, antiga Matriz? O que importa para mim é que vim e hoje sou elemento da História de Patos de Minas¹. E deixarei saudade!
* 1: Avenida Getúlio Vargas, entre as Avenidas Brasil e Paranaíba.
* Texto e foto (24/06/2018): Eitel Teixeira Dannemann.