LEISHMANIOSE VISCERAL CANINA

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LEISH 2No Brasil a Leishmaniose Visceral Canina (LVC), também denominada Calazar,  é uma antropozoonose (doença que se transmite de um animal ao homem ou vice-versa em condições naturais), causada por um protozoário flagelado do gênero Leishmania. É uma doença sistêmica grave de grande prevalência no país, de curso lento e crônico, difícil diagnóstico e cura. Os vetores são insetos denominados flebotomíneos e que consiste de várias espécies do gênero Lutzomya. A transmissão entre os canídeos e destes ao homem ocorre pela picada da fêmea. Outros meios de transmissão, como a transfusão de sangue, são de menor importância epidemiológica. Até o momento não foi evidenciada predisposição sexual, racial ou etária relacionada com a infecção. Existe uma forma de evolução aguda e grave, que leva o animal a óbito em poucas semanas. O cão doméstico é o principal reservatório do parasita.

O vetor da LVA é um pequeno mosquito de 2 a 3 mm que não faz o seu ciclo larval na água, e sim em matéria úmida, o que dificulta seu combate. É conhecido popularmente como mosquito palha, birigui ou tatusquira. Ainda que o período de maior intensidade de atividade diária possa variar de local para local, admite-se que esse seja, normalmente, entre as 18 e 22 horas, quando invade habitualmente as casas de zonas rurais, encontrando-se também em áreas urbanas de localidades pequenas ou na periferia de cidades grandes. Vive na vegetação de encostas parcialmente desmatadas dos morros e vão picar indiscriminadamente os animais ou o homem.

Ao picar um animal vertebrado infectado para exercer o repasto sanguíneo, o inseto ingere células parasitadas. Ao exercer novamente o repasto sanguíneo sobre um hospedeiro não infectado (homem ou algum animal), o inseto inocula as formas contaminantes.  A busca dos fatores que determinam a ocorrência da LVC em áreas urbanas verificou que este espaço se caracteriza por apresentar um conjunto de condições socioeconômicas e sanitárias muito precárias, com um grande número de animais domésticos e de criação no ambiente das residências, conferindo uma característica de ruralização extremamente propícia à ocorrência e expansão do Calazar.

Segundo a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA – 2003) os propósitos do Programa de Controle da Leishmaniose Visceral são reduzir o risco de transmissão pelo controle das populações de reservatórios e de insetos vetores e diagnosticar e tratar precocemente os doentes visando diminuir a letalidade e o número de casos. A LVC é uma doença que deve ser comunicada ao serviço de saúde mais próximo.  Havendo notificação, deve-se proceder imediatamente à investigação epidemiológica.

Em um estudo realizado no Hospital Veterinário da UNESP – Campus de Araçatuba, no período de janeiro a novembro de 1999, foram avaliados clinicamente 215 cães naturalmente acometidos por Leishmania Visceral. As alterações mais frequentes foram:

linfoadenomegalia (aumento anormal dos linfonodos – 81 %) seguida de alterações dermatológicas (queda de pelos, lesões ulcerativas, prurido intenso, pelame opaco e dermatite seborreica – 68 %); hiporexia (diminuição do apetite – 58 %); onicogrifose (crescimento anormal das unhas – 51 %) e emaciação (perda de massa muscular e de gordura – 47 %). A anemia foi um achado consistente em 30 % dos animais. De todos os cães estudados, 29% apresentaram sinais oculares; 21 % hipertermia (febre); 20 % êmese (vômito); 20 % diarreia e 10 % melena (fezes pastosas de cor escura e cheiro fétido, sinal de hemorragia digestiva). Observam-se quadros de pneumonia em 19 % e de epistaxe (sangramento ou hemorragia nasal) em 3 % dos animais acompanhados.  Outros achados clínicos importantes foram o comprometimento do sistema urinário em 19 % e as alterações hepáticas em 17 % dos animais.  Alterações neurológicas foram menos frequentemente observadas, perfazendo um total de 4 % dos casos atendidos.

LEISH 4De uma maneira geral o diagnóstico da LVC vem se apresentando como um problema para os serviços de saúde pública. A problemática deve-se principalmente, a três fatores: 1 – Variedade de sinais clínicos semelhantes às observadas em outras doenças infecciosas; 2 – Alterações histopatológicas inespecíficas e 3 – Inexistência de um teste diagnóstico 100 % específico e sensível. O diagnóstico da leishmaniose canina é semelhante ao da doença na espécie humana, e pode ser feito com base nas características clínicas apresentadas pelos animais, pela demonstração do parasita em punções aspirativas de órgãos linfoides, por provas sorológicas e por meio de métodos moleculares.

O Ministério da Saúde preconiza como medida de controle três ações básicas, que seriam o diagnóstico e tratamento dos casos humanos, controle de vetores e a eliminação dos cães positivos. O combate ao vetor é feito através de pulverização do domicílio e arredores com pesticidas, limpeza de quintais e lotes, além da educação sanitária da população. Banhos sistemáticos com produtos à base de permetrina indicam redução da prevalência da doença canina.  Foram divulgados experimentos com coleiras impregnadas com deltametrina, mostrando resultados promissores para proteção dos cães e consequentemente, quebra do ciclo de transmissão.

A eliminação do cão positivo para leishmaniose, assintomático ou não, é o ponto mais controverso, ainda que este seja o principal reservatório fora do ciclo silvestre. Muitos veterinários e sociedades protetoras dos animais têm questionado o sacrifício dos cães positivos, principalmente os assintomáticos, e reivindicando uma ação centrada no combate ao vetor. O cão, mesmo assintomático, possui uma quantidade de parasitos superior ao homem. Não ser sintomático não elimina o risco de servir de fonte de infecção para o vetor e de reservatório para a doença. Ressalta-se que é preciso reconhecer que apesar de todo envolvimento emocional e vontade de preservar a vida do animal de estimação, ao veterinário cabe a responsabilidade de esclarecer ao proprietário os riscos e consequências da manutenção de um animal positivo e que, por mais que seja doloroso ter que sacrificar um ente tão próximo, o bem individual não pode se sobrepor ao bem da comunidade.

Uma medida que não pode ser esquecida é o controle de cães vadios, modestamente realizada nos centros urbanos, que deveria ser assumida como prioridade, pois estes animais podem ser veiculadores não somente de Leishmania, mas também de outros agentes zoonóticos. Tendo em vista que os métodos até agora utilizados têm sido somente parcialmente efetivos na prevenção e controle da doença, novas estratégias de controle devem ser desenvolvidas.  As perspectivas para vacinas contra LV humana e canina foram recentemente revistas. Não há até o presente uma vacina humana eficaz. As vacinas contra a LVC são ainda recentes e vem sendo avaliadas quanto a sua eficácia, além disso o alto custo dificulta seu uso como medida de vigilância e controle.

Concluindo, a Leishmaniose Visceral Canina é uma doença grave e de difícil diagnóstico que vem se tornando um grande desafio dentro da prática da Medicina Veterinária. Atualmente, mesmo com o desenvolvimento de alguns protocolos de tratamento, os órgãos de saúde pública determinam a eutanásia dos animais portadores da doença. Esforços devem ser realizados por todas as partes envolvidas (órgãos de saúde pública, sociedade e médicos veterinários) visando encontrar a cura para a doença ou prevenir ao máximo a incidência de novos casos.

* Fonte e fotos: Leishmaniose Visceral Canina – Revisão de Literatura, de Fabiana Kelly Alves da Silva. Monografia apresentada à Universidade Federal Rural do Semiárido – UFERSA, para a obtenção do título de especialização em Clínica Médica de Pequenos Animais.  Orientadora: Grazielle Anahy de Sousa Aleixo Mestre em Ciência Veterinária – UFRPE. Recife – 2009.

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