Dentro daquela proposta, de que “roupa suja se lava em casa”, resolvemos acrescer na história da cultura em Patos mais três “lavadeiras” que têm todo o gabarito e porque não dizer direito, mesmo, de falar e gritar suas idéias em meio a essa babel.
Na casa do Marcinho (Casa de Cultura e Clubinho Carnavalesco do Povo), nós e o Bráulio Porto, e o Marquinhos (Clubinho e “do MEC”), o papo correu fácil e por isso descontraído.
Saíram um grande desabafo e ótimas idéias que dividimos com vocês agora.
Bom gente, depois de bater um papo com o pessoal da FUCAP (Debulha n.ºs 105/106)¹ onde se tentou explicar um monte de “disse-não-disse”, nós resolvemos continuar com o papo com outras pessoas ligadas à cultura de Patos. Primeiro a respeito da Casa de Cultura. Como é que está funcionando a coisa em termos de diretoria e outros esquemas assim?
MARCINHO – A Casa de Cultura depois do Encontrão ficou mais nas minhas mãos e da Maria Célia, porque o Romero parece que se sentiu um pouco traído quando da minha idéia de dividir tarefas e não de uma pessoa sozinha levar a coisa toda no peito. Nessa divisão, várias pessoas, inclusive o Romero, não concordaram com as tarefas que foram atribuídas a elas. Eu não coloquei uma pessoa só numa comissão. Ficaram duas ou três pessoas em cada e um coordenador, que podia convidar quem ele quisesse. O Romero que era um dos nossos braço direito, um grande trabalhador (ele trabalha demais para o movimento cultural de Patos) não gostou de ter ficado com uma tarefa só no Encontrão e se afastou em pouco. Não sei porque, mas eu acho que foi isso. O Vane Pimentel que é o tesoureiro da Casa de Cultura depois da posse também, não apareceu mais. A Casa de Cultura ficou muito dispersa, eu não sei porque. Nós estamos ai com um saldo de dívidas para pagar, mas estamos batalhando para isso. Já conversamos com os credores, dos quais o maior sou eu mesmo, e devagarinho estamos conseguindo o dinheiro. As dívidas são muitas, mas é coisa pequena para cada um dos credores. Em compensação eu acho que este último foi um dos melhores Encontrão que houve por aqui. Foi uma questão cultural mesmo, de intercâmbio com essa caravana que nós conseguimos trazer do Vale do Jequitinhonha com os debates, e tudo mais. Foi um mês de atividades. Agora, com dívida você perde o pique de trabalho. Eu principalmente voltei minhas atenções para pagar essas dívidas, sem importar que atividade eu tenha que fazer. Pode até fugir um pouco do nosso esquema de trabalho. Enquanto você está devendo você não tem cabeça para fazer nada!
Voltando um pouquinho nessa história cultural, durante a entrevista com a FUCAP, o Xaulim falou que…
BRÁULIO – Pera ai, João. Eu vou dar uma de Jaguar aqui. Essa entrevista é da Casa de Cultura ou do Clubinho? Não é do Carnaval do Clubinho, não?
Também. O que eu quero que se pare com essa história de que tal entidade é elitista, e tal é populista. Para isso, vale de tudo, inclusive saudosismo. O Xaulim disse que quando foi fundada a comissão Pró-Casa de Cultura, já existia a idéia de uma Fundação. Mas começaram a haver divergências e houve uma separação do pessoal. Vocês participaram disso tudo, como é que vocês viram isso?
MARCINHO – O Bráulio é melhor para falar disso porque ele participou do I Encontrão.
BRÁULIO – Em primeiro lugar… Será que isso vai sair registrado ai? (risos)
É claro que vai. O gravador está gravando e depois eu vou redigir tudinho!
BRÁULIO – Se a entrevista for mais ligada com pessoas que se encontram no centro da questão Casa de Cultura, eu pessoalmente e tenho a impressão que o Marcos também, não participamos de uma forma tão direta assim. Eu acho que o Romero, a Maria Célia, o Clênio – que infelizmente não está mais aqui com a gente – teriam mais autoridade para falar. Agora sob o ponto de vista pessoal, não sei se isso vale como depoimento, de fato eu tenho um monte de coisas para falar da Casa de Cultura, sobretudo no processo de formação. Nisso eu participei bastante, mesmo não estando morando aqui na época. Eu fazia viagens semanais nos fins de semana para poder contribuir com alguma coisa. Sobre a formação minha avaliação é muito semelhante a do Xaulim. Aliás, eu defendo um ponto de vista, já falei isso em um artigo que era o que o Xaulim defendia no tempo da formação da comissão. Ele achava que não era o momento de institucionalizar um grupo e formar uma comissão, que se fosse surgir esse tipo de legalização do trabalho devia vir em torno de uma consciência cultural muito bem formada. A coisa se precipitou por várias circunstâncias, históricas inclusive, e eu acho que houve uma precipitação. Foi um ano político, antes das eleições e o grupo que compunha essa comissão, participava também de partidos políticos. Houve uma polarização grande, uma confusão, uma batalha política em termos partidários passou para dentro da comissão e se tornou em conflitos aparentemente pessoais de simpatias e antipatias… a coisa se tornou em pontos de vista políticos-culturais. Essa fase é complicada! Houve disputa pelos cargos eletivos dentro da comissão. Formaram-se núcleos em torno da votação para presidente, etc. Na época a Casa de Cultura não detinha poder nenhum diante da opinião pública. Só contava com o I Encontrão que era uma atitude de um grupo jovem em torno da prática artístico cultural da cidade. Não existia nada de formar comissão, nem nada assim. O Encontrão seria uma síntese de expressões que serviriam como um espelho diante da própria realidade para que ela seguisse nas suas expressões mais autênticas.
Já que foi do Encontrão que surgiu a coisa em termos culturais, e depois tudo se transformou na comissão Pró-Casa de Cultura, como é que ficou a função dessa comissão? Ficou sendo a função de promoção do Encontrão?
BRÁULIO – A partir do momento que houve o I Encontrão a idéia original era avaliar o que foi o Encontrão: um evento inédito na cidade, que conjugou, que conseguiu sintetizar em um dia e trazer para a praça uma porção de imagens e significados a que a gente nem sempre tem dado a verdadeira importância que eles devem ter. Isto é uma forma de resistência da expressão da cultura popular diante da cultura de massa veiculada pela televisão. A idéia por isso, era continuar expandindo esse grupo, fazendo com que essas formas de expressão artísticas, entidades inclusive, criassem um consenso entre elas da necessidade de agrupamento. Fortalecer um trabalho comum de resistência em prol da cultura popular. Isso não foi feito porque essa polarização ocorreu e foi muito forte, chegando as raízes do dogmatismo e ficando inviável o diálogo. Eram reuniões que duravam 6 ou 7 horas sem chegar a ponto nenhum discutindo princípios estatutários que eram extremamente secundários diante do fundamental que seriam os fundamentos daquele grupo. A coisa tomou uma caráter muito administrativo. Aparentemente administrativo, mas no fundo muito polarizado politicamente. O PMDB de um lado e o PT do outro. Isso permitiu inclusive que problemas pessoais viessem intervir, amizades e inimizades começaram a ser um problema sério, evitando o diálogo não há nada mais o que fazer. Quando entramos no ano de eleição “petecou” mais ainda. Entramos num ano de eleição que foi claramente partidário – PMDB e PT – e houve uma decisão de suspensão dos trabalhos da comissão porque o processo de polarização era evidente. Essa suspensão durou quase um ano e isso esfriou um pouco.
Mas a melhor opção mesmo era que houvesse um desmembramento cultural para o pessoal repensar em termos culturais e separar em termos políticos?
BRÁULIO – Eu não acompanhei porque eu já não estava aqui. O que eu pude perceber foi por esforço de tomar informações e de fé.
Mas vocês acham que era necessário o pessoal se desmembrar e pensar de novo em relação e isso tudo?
BRAÚLIO – Pessoalmente, eu acho que não era a solução. Solução não é parar as atividades de uma comissão na esperança de que esse breque leve as pessoas a retirar a confusão que estava sendo provocada. Prova histórica é que não resolveu o problema. Estava insuportável continuar, mas… não dá para dizer: “se fosse voltar atrás”… Eu acho que foi falta de maturidade e a história ensinou que não se devem repetir os mesmos erros. Muita gente amadureceu, outros pararam no tempo. Tem gente que parou mesmo! Mas a solução não era parar, era retirar a confusão, não precisava ter parado.
Vamos falar um pouco de Clubinho, de simbiose. O Clubinho tem algum vínculo com a Casa de Cultura?
BRÁULIO – Legalmente tem. Agora uma lei só funciona quando ele tem uma legitimidade, quando ele á uma ficção completa ela não existe. E hoje cinquenta por cento do projeto da Casa de Cultura é ficção, não foi levado adiante. Eu acho que os regulamentos institucionais que definem a Casa de Cultura como entidade que congrega outras entidades, não tem tanta importância. Legalmente o Clubinho é ligado, mas eu não vejo um vinculo orgânico. Aliás, a Casa de Cultura como instituição que tem papéis definidos e que funciona independente dos indivíduos, não existe. Não existe uma máquina que funcione em cima de papéis, de projetos e planos.
MARCOS – João, deixa eu só colocar umas coisinhas em cima do que o Bráulio falou, ele colocou o ponto de vista dele e é uma oportunidade prá gente falar. É o seguinte: quanto a esta questão de FUCAP – Casa de Cultura, se uma é elitista e tal, eu acho que – e eu insisto nesse ponto de vista – pode ser que me chamem até de ingênuo, de bobo, de pouco esclarecido, mas eu acho que está passando de hora, e não é de agora que eu tenho essa impressão, de que ao invés de acontecer essa luta, digamos assim, esfacelada ou partida, está na hora de Patos de Minas, onde existe uma efervescência artística, para não falar cultural, para não envolver classes, está na hora da gente sentar numa mesa, FUCAP, Casa de Cultura, e todas as entidades que ainda existem, (porque elas estão correndo o risco de não existirem) está na hora de sentar e ver o que que é… Veja bem, isso não é uma realidade só de Patos, não. Eu acho que é uma realidade nacional, questão de partido político. O que que acontece? Exatamente em função de individualidades, o que vem acontecendo é um arraso. Então eu acho que está na hora do pessoal fazer um retrocesso histórico, e saber como é que começou o movimento cultural em Patos, como é que cada entidade, UEP, Centro Cultural participava, e sentar e agir. Como ninguém suportava uma reunião da Casa de Cultura há três anos atrás, ninguém suporta essa divisão, essa distinção: “esse elemento é da Casa de Cultura e esse é da FUCAP”. Eu nunca fui convidado para nada da FUCAP, é uma mágoa que eu tenho! Já falei isso com o Xaulim e já falei com o João Marcos. Não me acho grande em coisa nenhuma, mas envolvido. Fui convidado para posse no Social, eu acho isso ridículo! Ridículo, a posse no Social. Então tudo bem, é uma crítica como eu faço mil críticas à Casa de Cultura eu acho que ela não existe! Então vai se parcelando, vai se fragmentando e falta quadro. Não é que eu esteja fazendo crítica direta à Casa de Cultura ou à FUCAP, eu pergunto ao movimento cultural de Patos de Minas. Só o ballet da FUCAP? Eu não estou falando que a FUCAP só faça ballet, mas só isso não é suficiente, é a mesma coisa só o Encontrão da Casa de Cultura? É necessário aglutinar o movimento cultural e sentar novamente, e é o seguinte: a nossa plataforma é essa e agir, é preciso a gente vencer esse vicio estudantil de questionar estatuto isso tudo eu acho muito superficial e ingênuo, então eu acho que a gente tem que retomar para chegar numa coisa mais consequente. Aquela hora que você falou sobre a parada, a retirada desses elementos que faziam parte da comissão Pró-Casa de Cultura, eu acho que isso até certo ponto é sacanagem. É sacanagem porque você está alheio, como sacanagem é nossa de deixar a Casa de Cultura correr pela imaturidade, não estou me dizendo maduro, não sem ter com que dirigir. É necessário a gente realmente se ater a uns dez anos atrás. O que que era o movimento cultural de Patos? As mesmas brigas João, acontecem hoje… as mesmas richas, os mesmos desencontros acontecem hoje… Eu não acho Jequitinhonha mais fértil, culturalmente do que Patos, nunca! Nossa região é extremamente fértil, mas está bloqueada. Por quê? Por causa de interesses pessoais! Não Gente! Que é que é isso? Vamos ver o que é preciso fazer, todo mundo entrar numa de vamos participar e largar de estatuto: “porque isso está no estatuto, porque a FUCAP é outorgada a isso…”. Não gente! Quê que é isso! Não pode! Não é o estatuto da Casa de Cultura que você deita e dorme duas horas na cadeira de uma reunião , isso é ridículo! Isso desgasta! Tem elemento querendo produzir, querendo criar e está obstruído por causa disso! Vamos simplificar as coisas e vamos criar!… Nós somos férteis em quê? Em criação, não é não? Então estatuto, essas coisas tudo bem mas… para o Clubinho, vamos ser mais específicos; existe um estatuto no Clubinho que é extremamente conservador, reacionário ao extremo. Nós nunca chegamos: vamos ver o estatuto aqui para punir esse cara, só se o cara beber demais (risos). Porque fora disso… E o negócio funciona na maior harmonia, o pessoal na maior descontração, disponibilidade, o que o pessoal trabalha não está escrito!
MARCINHO – Agora tem um detalhe também, a gente, se tivesse um intercâmbio maior entre todas as entidades, o Clubinho, a gente especificamente falando, poderia promover mais coisa durante o ano. Por exemplo, essa reunião, que eu falei, que a gente teve essa semana, a gente está propondo para esse ano fazer um festival de músicas carnavalescas e fazer um show de marcha rancho, já são duas coisas. Tem 5 anos que a entidade sobrevive e até hoje não fêz isso, faz o quê? Faz o carnaval, vai lá na AABB fazer uma apresentação para eles, vai lá na APAE, no CIAME. A gente trabalha durante o ano, mas é um trabalho mais restrito a outras entidades. A gente poderia promover mais coisas durante o ano, mais coisas para a massa, mais coisas para o público. Acho que essa divisão implica nisso aí, não é que a diretoria do Clubinho é incompetente para isso, mas falta um pique também. Tendo uma pessoa para empurrar, né? Eu falei nesse show de marcha rancho com o Cominni e ele me deu a maior força, falou: “vou e ajudo no que eu puder”.
Os órgãos municipais e mesmo os empresários de Patos, ficam perdidos, totalmente perdidos. O pessoal não tem em que se basear para dar apoio. Tudo bem, eles apoiam esse festival de músicas carnavalescas, por exemplo, e aí depois vem outra coisa e vão atrás deles de novo, e eles não vão poder apoiar. Se fosse uma coisa mais esquematizada, poderiam os eventos permanecer por mais tempo.
MARCINHO – Aí que eu queria chegar. A gente está agindo mais em termos de indivíduo. Saímos ai eu e o Marquinho, vamos atrás de alguma pessoa: “bom nós vamos fazer isso”, e aí depois aparece o nome da entidade por trás.
MARCOS – Deixa eu só completar o que eu comecei. Na verdade o que eu acho é que era necessário, o pessoal de Patos que gosta, que curte, que cria e que transa: sentar, debater e deixar essa de divisão. A nossa Casa de Cultura que a gente aspira, que é a mesma que o Xaulim aspira, que é a mesma que o João Marcos aspira, ela tem que ser sentada e conversada, e estabelecer determinados parâmetros de infra estrutura. O pessoal criar e largar de interesses pessoais. Não estou acusando essa ou aquela pessoa, mas é necessário a gente sentar e falar o seguinte: nós que estamos tomando a frente, nós estamos travando o movimento cultural de Patos, falta quadro. Falta quadro na FUCAP, porque se não fôr o dinheiro é difícil de criar. Falta quadro na Casa de Cultura por causa de divisão, descrença, enquanto não se estabelece parâmetro. Ir nos bairros e despertar gente nova, despertar novos talentos, isso acabou em Patos! O festival, o FEPAMI, não tem mais gente criando, são os mesmos! É necessário incentivar e largar de divisão, de tendências individualistas e botar a moçada para criar. Porque nós estamos travando o progresso do movimento cultural de Patos! Ele vem perdendo pique, ele vem perdendo pulsação!
Isso do pessoal dos bairros, do pessoal da periferia, eu acho que são os maiores prejudicados na história toda. Que é o pessoal que tem condições de se mostrar, de fazer um bom trabalho e não está se mostrando porque não tem onde, não tem como. Enquanto o pessoal fica meio perdido, porque o cara acha que é difícil chegar numa entidade como a FUCAP, por exemplo, que trabalha com um nível sócio-econômico mais alto. Tudo bem, pode até ser que venham ocorrer mudanças, inclusive eles estão com uma proposta de montar um texto do Plinio Marcos, exatamente para pegar esta parte. O pessoal fica perdido porque não sabe como chegar a eles e ao mesmo tempo o cara não sabe o que faz para se mostrar, o cara fala: “mas pô, me mostrar no Encontrão como? Com quem eu vou conversar prá isso? O que vai acontecer?” Porque é exatamente isso que estão falando, já que é uma coisa que está partindo de vocês que participaram da luta mais diretamente. Casa de Cultura não está dando para entender mais nada, tanto que a minha primeira pergunta foi essa: “Como é que tá a coisa? Como é que está em termos de diretoria?” Eu não sabia mais nada. Não sabia quem que é o quê.
MARCINHO – É difícil João, porque o I Encontrão, e acho que até o II, houve um surgimento de talentos, de artistas aqui em Patos, através do projeto “Palco Móvel”, que de repente morreu. Eu acho que os que apareceram estão até hoje aí, nasceram do projeto “Palco Móvel”. É uma coisa que eu bati desde o primeiro dia que participei da diretoria da Casa de Cultura, que foi em 83 quando eu fui tesoureiro: “o projeto ‘Palco Móvel’ não pode morrer, se o pessoal não está dando conta de fazer por falta de verba, vamos incorporar isso à Casa de Cultura. Deixa o ‘Palco Móvel’ de ser uma entidade e vamos fazer isso como um projeto da Casa de Cultura”. Eu acho que se o pessoal tivesse concordado esse projeto estaria vivo até hoje! O projeto “Palco Móvel” não tem que ser uma entidade. Até hoje nem regularizado não é. É uma preocupação de toda entidade, se regularizar. A questão do Encontrão por exemplo, seria o fruto do trabalho do “Palco Móvel”. Seria um trabalho que você viria fazendo durante um ano e a Casa de Cultura numa pesquisa, num debate ou algo assim, montaria isso tudo para o domingo de páscoa. Montar lá na praça para o pessoal ver. Eu tive uma série de dificuldades em colocar o pessoal daqui. A parte da manhã com a Doroty, foi muito interessante, inovadora, mas a nossa proposta era de apresentar o pessoal daqui, os de fora iam participar menos. Eles viriam só para ver. Foi morrendo muita coisa gradativamente, e hoje está no que é. Vai ser uma dificuldade montar o próximo. O que é que a gente vai mostrar? As mesmas coisas do ano passado?
Agora a coisa ficou um pouco carregada com a FUCAP tendo feito o “Show 84”. Podia ter sido feito uma mesclagem de “Encontrão” e “Show 84” e montado um só trabalho com todo o pessoal…
MÁRCIO – Eu não tive oportunidade de ver, mas acho que esse show inclusive, poderia ter sido montado em praça pública. Isso falando por comentários, já que foi mais um musical e um pouco de dança.
Porque não fazer essa reunião que o Marquinhos sugeriu antes do Encontrão e tentar montar um espetáculo realmente ao nível de Patos?
MARCOS – Eu acho que seria romper todas essas rixinhas que estão travando. As direções do movimento cultural é que travam o movimento.
MARCINHO – Ai é que vai ter que entrar a questão do debate, de todas as entidades culturais, para todo mundo discutir o Encontrão. O ano passado eu mandei convite para a FUCAP participar, mandei convite para o CET. O Eugênio esteve lá numa reunião, nós fizemos várias, eu acho que há necessidade de fazer várias reuniões entes do Encontrão, porque é uma coisa que está sendo realizada por várias pessoas. Então eu mandei convites, mandei para todo mundo. E o que que sobrou? Sobraram as comissões que eu mesmo organizei.
BRÁULIO – Se a sua intenção é pegar uma idéia, principal como outra entrevista, sobre quem estaria girando em torno da Casa de Cultura, algumas idéias desse pessoal, para poder colher inclusive, elementos complementares a entrevista que você fez com a FUCAP, eu tenho impressão que isso daqui não vai representar na íntegra, a sua pretensão. Porque o Romero, por exemplo, que é o secretário da Casa de Cultura, não representa essas mesmas idéias. É uma prova concreta de que não existe uma unidade dentro da Casa de Cultura em torno de uma política cultural, em torno de uma proposta de diálogo com outras entidades. Com a FUCAP em particular, que foi criada assim, maior preocupação em torno de oposição. Então se o presidente, que é o Marcinho, fala numa linguagem, eu tenho certeza que outros membros falam em outra. Isso foi uma queixa que o Xaulim me fez, e que o Arlindo fez para ele também, que você passa a não saber quem representa a Casa de Cultura, quem fala em nome da Casa de Cultura. Então é expressivo que não falta unidade só entre as entidades, falta uma unidade dentro da própria Casa de Cultura. Agora essa polarização, da FUCAP ser elitista, Casa de Cultura ser popular é problemática. A FUCAP pela sua própria natureza de ser uma fundação de caráter privado em todo o seu patrimônio, tem como finalidade, sobreviver economicamente e promove um tipo de artes que convencionalmente se promove no país. A produção de arte no Brasil, é para uma classe média. Isso pode elitizar o seu público, e pode elitizar os produtos que ela cria. Eu não tenho dúvida que o Centro de Artes é uma idéia muito importante na FUCAP, criar um espaço, manter vivo um espaço de criação, de formação de novos músicos, novos atores, isso é muito importante. Agora, de fato, fazer arte no Brasil hoje, o risco que você corre é tornar a coisa restrita a quem pode pagar. A Casa de Cultura é penalizada por outro lado, de querer uma alternativa de abertura à participação das camadas populares, em termos de expressão artística. E sem poder contar com os recursos de uma camada que não tem, então ela vai ter que cavar dinheiro, onde? Subsídio de Prefeitura, de Secretaria da Cultura, promoções…
Mas uma coisa pode suprir a outra.
BRÁULIO – Há uma possibilidade de encontrarmos pontos comuns, agora anular as identidades, é ai que vai ficar a dimensão política em relação a concepção de visão do mundo, ideológico.
Mesmo que não haja anulação das entidades, mas já é uma coisa interessante saber que, não vamos dizer que vocês estejam representando diretamente a Casa de Cultura ou o povo, sem dúvida nenhuma, vocês estão representando o Clubinho Carnavalesco do Povo, que para mim é uma das maiores entidades culturais que tem aqui dentro de Patos atualmente. É importante, que algumas lideranças, mesmo o Marcos não gostando do termo, culturais de Patos e da região, se interessem para que haja uma unidade de trabalho.
BRÁULIO – Eu acho que a preocupação que deve ser comum e que há pontos fundamentais de consenso. Um ponto é uma Casa de Espetáculos. Nunca foi tão fácil, penso eu, de conseguir um teatro, uma Casa de Espetáculos, como agora. Desde que a rodoviária velha foi destinada a uma Casa de Espetáculos. Não sei porque razão algumas pessoas entenderam que é um patrimônio da Casa de Cultura, e eu acho que não. É um patrimônio público! E deve ser uma Casa de Espetáculos pública, a aberta a todo mundo. Então é a partir dai, de um ponto dessa natureza, que a gente vai conseguir um consenso.
MARCOS – E essa crítica, estou falando como povo, não é chute, não. Isso dai se você fizer um levantamento aqui em Patos, você vai constatar numa boa. A opinião pública de Patos de Minas tem que a FUCAP é uma entidade elitista.
BRÁULIO – E eu tenho impressão que pode ter sua dimensão pela própria natureza da FUCAP, ela tem um tipo de promoção que o seu produto e o seu público, é um público determinado que pode pagar. Se a FUCAP limita o seu trabalho a esse tipo de promoção toda a sua atividade fica congregada em torno de um setor, de camadas sociais particulares e o trabalho se torna elitista. Agora a alternativa, uma preocupação alternativa que é a desse grupo que compõe a Casa de Cultura, originária que hoje ainda vive pelo menos como simpatizante da Casa de Cultura, em particular eu. Eu não me sinto como um membro da Casa de Cultura, tenho simpatia pela proposta, pelo projeto, mas essa preocupação alternativa com essas classes populares, em relação à sua produção de estética, enfim a alternativa envolve uma política cultural que tem que ser muito clara porque ela vai ter que mexer, em termos materiais, com o poder público para conseguir subsídios. Porque individualmente não se banca um Encontrão, não se banca nenhuma promoção com o dinheiro do bolso. Prova, é que a tendência é nem ter Encontrão mais para não ficar com um milhão de dívida durante o ano todo.
Mudando agora, para falar do Clubinho. Como que está a montagem do carnaval, em termos inclusive financeiros? O Clubinho também passou por uns apertos bons, né?
MARCINHO – A gente está é com uma dívida antiga que não deu para a gente cobrir. O último carnaval foi até razoável.
Pois é, mas vocês ficaram num sufoco aí numa época, né?
MARCOS – Ficamos. Mas depois que o Arlindo assumiu a Prefeitura foi formada uma comissão Municipal de Carnaval e destinou verba a essa comissão. Que por sinal foi muito mais equivalente à nossa realidade, do que acontecia anteriormente.
Em termo de carnaval aqui em Patos eu acho que é uma coisa importante com relação a essa ligação a uma entidade cultural, porque uma das coisas mais fortes culturalmente, não só com relação a manifestação popular, mais em torno de cultura mesmo aqui dentro de Patos, é o carnaval. Prova está aí, um compositor como o Tonhão. Por que as entidades culturais não participarem junto com o Clubinho nisso daí?
MARCOS – João isso já foi proposto em reuniões anteriores, inclusive da Casa de Cultura. Agora eu queria ressaltar, já que você citou o Tonhão em termo de revelação como artista, eu queria falar o seguinte: aqui em Patos, como em todo o Brasil, sambista não é compositor, nem é arte, nem é nada. Ele é malandro. Em termo de revelação, você veja bem, quando a gente formou o Clubinho, eu não conhecia o Marcinho, Bráulio não conhecia, mas esse trabalho aconchegante e amigo de chegar e se relacionar com as pessoas, que eu acho que isso é que precisa na FUCAP e na Casa de Cultura. O que nós conseguimos? Hoje nós temos o José Lito, que é um excelente percussionista; o Zezé; o Tonhão, que é um compositor de extrema habilidade, de uma criatividade fora de série, você tem que contar nos dedos em termo de música carnavalesca, inclusive moda sertaneja; o Tonho Jorge; e vai por aí a fora. Então o que a gente conseguiu aglutinar em termo de criatividade assim no nosso ramo, carnaval, samba e tudo mais. Eu queria ressaltar a importância da gente permitir a criatividade, em termo de Clubinho. Eu acho que isso é fundamental! É você abrir as portas da FUCAP, Casa de Cultura, quem é que faz, quem é que não faz. Está aqui o caso do Clubinho, nós vamos fazer uma batucada e o espaço está aberto para isso, para aquilo outro, independente de raça e cor (risos). Realmente para revelar talentos. Quem é sambista, se gosta, que não venha para nós, e gosta de escola de samba, que vá para a Escola de Samba. Tem aí uma proposta genial de se fazer um bloco, junto com a gente. É o bloco “Unidos da Ouro Preto”. Tem uma moçada querendo fazer um grupo de samba com blocos e tudo mais, fantasias, alegorias e bateria e tudo mais. É uma proposta que a gente tem o maior prazer em cooperar. Em andar junto. Eu acho que é necessário isso. O carnaval tem que caminhar para esse lado. As vezes a coisa fica meio sobrecarregada só para o Clubinho, porque a gente faz o trabalho até de marceneiro, carpinteiro no caminhão, então é necessário que a Prefeitura, ou as entidades destinem as pessoas para isso para sobrar mais tempo para a gente executar outras atividades. Alegorias e tudo mais. Realmente criar opções para o carnaval realmente ser diversificado. Porque a nossa proposta eu acho que transcende ao trio elétrico, parado. Sabe? Aquela coisa! Não é paternalismo mais chegamos a isso, aquele imobilismo do caminhão lá parado. Eu acho que é necessário as ruas serem mais vivas.
MARCINHO – Porque esse ano a gente teve um problema com a aparelhagem de som. Na hora que a gente chegou aqui em cima queimaram dois aparelhos, pegaram fogo por causa do gerador e o pessoal começou a jogar bucha de papel na gente, querendo que começasse de qualquer forma. Então se tivesse outra atividade, por exemplo, um bloco pulando lá na outra esquina então o pessoal ia virar a atenção para aquele lado. Então o carnaval gira em torno do Clubinho.
MARCOS – Eu acho que o pessoal estava certo, tinha mais é que jogar mesmo…
MARCINHO – Exato! Mas se o pessoal tivesse outra opção?
MARCOS – Mas eu acho que essa opção tinha que ser dividida em comum. Não é ficar nessa: “Ah! agora tem essa opção lá. Você quer ir?” Não, opção é o seguinte, horário para isso, horário para aquilo. Inclusive há uma proposta do Comini da banda participar junto com a gente que eu acho excelente!
É, isso aí é uma coisa interessante de se colocar, porque realmente a nível de manifestação popular cultural o carnaval é o maior. Isso que você falou é bom deixar claro, porque realmente tem aquela visão de que o pessoal que está fazendo carnaval não quer fazer mais nada. Inclusive de repente começou aí um monte de coisa, logo depois que vocês resolveram separar, desintegrar o “Canto Chão”, você começou com o pessoal do carnaval, começou a ficar mais ligado ao samba e desapareceu, em termos, para um monte de gente você deixou de ser o Marquinho da viola, o cara que cantava em conjunto, deixou de ser o artista que era naquela época. Isso aí é muito bom você colocar que esse nível cultural tem que ser retomado. E já que a gente partiu para esse lado, seria muito bom ressaltar isso para as entidades, para a FUCAP, para a Casa de Cultura, essa retomada do Clubinho. Talvez alguém fazendo essa produção para o Clubinho facilitasse muito mais para vocês, os artistas. Vocês não teriam que se preocupar em montar o caminhão, com isso, com aquilo.
BRÁULIO – Isso que você falou sobre os nosso projetos para esse ano, o papo envolveu com relação à grana do ano passado, com os recursos e pensar sobre isso é pensar sobre muita coisa e inclusive sobre essa questão da produção. Na verdade não temos que clamar o fato de ter que construir um caminhão, o problema é a intensidade que a gente tem que fazer as coisas, e essa questão do subsídio é um ponto importante em torno disso. De fato é preciso uma consciência por parte do poder público. Primeiro: de que é impossível a gente fazer um carnaval que tem uma natureza aberta, sem fim lucrativo, sem uma participação do poder público, porque você paga imposto para isso. Você paga imposto e quer ter também um pouco de lazer público. E uma cidade interiorana como Patos não tem ônus durante o ano com lazer público. Então esse aspecto de distribuir verba para o lazer é uma obrigação da Prefeitura e depende, evidentemente da sensibilidade dos nossos governantes. Não é uma obrigação do trabalhador que paga o seu imposto contribuir com mais, a gente bate na porta da casa dele para pedir mais dinheiro para fazer o carnaval. Infelizmente nós tivemos até que fazer isso três anos. Apelar para a bondade do camarada que está pulando ali para ele contribuir com um pouco. Não funcionou, mas ensinou a gente. Se a nossa economia vive, os nossos industriais, as multinacionais vivem com o subsídio que o governo dá, a infra-estrutura que o governo oferece, se isso é considerado por muita gente como permissível, e é de fato, muita gente recebe subsídio sem ser necessário. Se na economia se tem investido, na cultura eu tenho um ponto de vista claro, é preciso que o estado invista na cultura desde que não seja uma inversão com fins de tutela. Como foi o nosso sindicalismo durante todo o período cooperativista. Ai entra um problema interessante, investir em arte é promover um estímulo à libertação, um estímulo à conscientização, o próprio processo de criação é um processo de afirmação das pessoas, de afirmação do seu ser, da sua capacidade de criar, da sua personalidade. Então investir em arte neste país não é de interesse do estado, porque o estado não está interessado que as pessoas obtenham consciência, uma consciência que pode atingir a direção política. E o carnaval por mais festa que seja é um movimento que oferece às pessoas uma certa ação de participação, de necessidade de exteriorização, não é só essa idéia , há uma idéia primária de que o carnaval é alienação, de que o pessoal está ali é para extravasar as suas preocupações diárias, é um pouco isso, mas é também participação; e a gente acha bom participar, envolver outras pessoas, porque a pessoa toma consciência de que fazer festa, fazer o carnaval não é somente o momento, o instante, há todo um processo de envolvimento com políticos, com dinheiro. Por isso que o Clubinho transcende o carnaval, é uma preocupação de política cultural que a gente tem. De oferecer um mínimo de condições para que uma entidade de caráter popular encontre no poder público um apoio material concreto. E de fato a gente encontrou uma postura melhor dentro da atual administração, inclusive a nossa dívida que a gente está carregando, ela vem da administração anterior, do Dácio, ela vem de lá, que a gente teve como processo de atuação dos trabalhos do Clubinho, ampliação, melhoria do caminhão, do equipamento. Uma coisa que começou numa carroceria de um caminhão sem nada, e foi crescendo, aumentou também as exigências monetárias nossas e o dinheiro diminuindo, e a gente deu um salto qualitativo desse período do Dácio para o do Arlindo, adquirimos um caminhãozinho naquela época por Cr$ 70.000,00 e a gente não tinha condições, tivemos que fazer um empréstimo de Cr$ 100.000,00, e em três anos. Então o apoio que a gente recebeu depois foi insuficiente para cobrir essa dívida passada que vem sendo rolada. Agora, eu acho fundamental, é uma exigência que nós vamos fazer esse ano para a Prefeitura, que ela contemple a pretensão do Clubinho de um ponto de vista diferente, que o Clubinho não é uma entidade que vai fazer só o carnaval, o Clubinho é uma entidade que quer fazer promoções durante o ano todo, que quer investir numa entidade que promove muitas festas. A gente vai pedir um subsídio que permita a gente fazer uma festa de São João, fazer um samba nos fins-de-semana, nos bairros e conquistar mais talentos nos bairros, sair do centro da cidade!
Essa é a proposta do Clubinho, e cabe a nós apoiá-los, como devemos apoiar o movimento cultural de Patos! É isso aí gente!
Fonte: Entrevista de Dirce Djanira Pacheco e João Vicente Deocleciano Pacheco publicada na edição n.º 109 de 15 de fevereiro de 1985 da revista A Debulha, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
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