O Clubinho Carnavalesco do Povo (CCP) surgiu em 13 de agosto de 1980. Foi criado com o objetivo primordial de animar o carnaval de rua. Em 31 de janeiro de 1981, a revista A Debulha, em seu n.º 17, publicou o texto a seguir:
“No decorrer da história, duas coisas com certeza serviram de substrato para a existência humana: o trabalho digno e o lazer; elementos de cuja síntese se tem o prazer de viver.
Nesse sentido, o Clubinho Carnavalesco do Povo procura, mediante um trabalho coletivo, promover aquilo que se traduz como nossa maior festa popular, o Carnaval, considerado como uma manifestação cultural e histórica, cujas raízes remontam à própria formação de nossa cultura nacional; manifestação que trás em seus estandartes os progressos da música popular – a participação da cultura negra e portuguesa.
Apesar do Clubinho ter sido fundado em 13/agosto/1980, sua gênese histórica se deu com a idealização e realização do Carnaval de Rua 80 em nossa cidade, com resultados realmente animadores.
A criação dos estatutos do C.C.P. não foi, senão, a formalização desses princípios fundamentais que inspiraram seus atuais membros na realização desse trabalho.
O Clubinho Carnavalesco do Povo procura, assim, oferecer condições para que as pessoas participem não só da festa, mas, sobretudo, na própria organização desta.
“O Trio-Elétrico / Sobe o morro / Desce o morro / Vem ao povo / Traz o novo / Na alegria de brincar” (Jayme Wesley) – Eis aí a nossa esperança.
Procuramos criar uma entidade dinâmica e alegre, onde as pessoas se sintam felizes em realizar um trabalho comum em prol da paz entre os homens.
Dentro de uma visão realista, haja visto que o mundo vive sob conflitos constantes de raça, de poder econômico e luta de classes, o Clubinho “entende que deve estender apoio e solidariedade às diversas atividades culturais comprometidas com a elevação do espírito popular, no sentido de uma plena democracia”.
Por isso, o Clubinho irá crescer, e se nos permitem o otimismo exacerbado, ser tão grande como o próprio povo.
Em linhas gerais, eis aí o perfil de nossa entidade. Este ano vamos novamente trazer as pessoas para a rua. E, para tal, contamos com a colaboração de todos.
Participe!
Aguardem para o próximo número uma entrevista com o Presidente do Clubinho Carnavalesco do Povo.
Bráulio Porto (Relações Públicas)”
Como prometido, a revista A Debulha, em seu número 18 do dia 15 de fevereiro, publicou a entrevista:
“Como havíamos previsto na edição passada de “A Debulha”, trazemos para o leitor uma entrevista com o Presidente do Clubinho Carnavalesco do Povo, Márcio Maciel, o Tesoureiro Marcos Rassi, e o Relações Públicas, Bráulio Porto. Com o intuito de esclarecer e relatar o trabalho árduo e gratificante desse pessoal, que conseguiu no Carnaval de Rua de 1980, levar mais de 5.000 pessoas a se esbaldarem na Rua Major Gote, mostrando assim que vale a pena tentar: e estão tentando, com bastante êxito. Agora só resta este ano sair com eles no Trio Elétrico, cantando o “Hino do Carnaval de Rua Patense” de autoria de Antônio Andrade, o “Tonhão” e o Frevo “Bota logo o pé no chão” de Jaime Wesley. É isso aí moçada, o CCP conta com você.
Em que vocês se fundamentaram para fazer o Carnaval de Rua em 80?
O fato principal foi a própria definição do que vem a ser o carnaval, esta festa profundamente popular que em Patos não era realizada como tal. Era extremamente limitada a participação.
Baseando-nos, pois, no próprio conceito de Carnaval e na realização deste em outros lugares, onde isto se dá de maneira mais natural. Como por exemplo temos o Rio de Janeiro, Recife, Pirapora, etc., com intensa participação popular. Entretanto, o Rio merece uma ressalva, pois, lá o Carnaval está perdendo este valor de coletividade e vem tomando um caráter bastante “comercial”, uma espécie de “Industrialização do Carnaval”. Eles aproveitam o tipo de festa, carregada de ornamentações, para jogarem produtos no mercado. Inclusive, existem reclamações contra a eliminação da fauna, sobretudo de aves, para se fazer ornamentos luxuosos. Assim substituem a originalidade, a simplicidade e a alegria das “velhas” fantasias e passam a fazer coisas faraônicas…
Para se ter uma ideia, a ornamentação de duas Avenidas este ano no Rio, ficará nada menos do que Cr$ 25.000.000,00.
Sem dúvida, deve-se analisar as diferenças culturais, porque, com o Trio Elétrico veio a eletrização do som, e o frevo, de ritmo ardente e alegre, tomou conta da moçada. Nós optamos mesmo por uma questão de viabilidade pelo frevo. Mas esta preocupação com o “destino” (e desatino) do Carnaval carioca é só nosso.
Paulinho da Viola prestou depoimento dizendo que tinha parado de desfilar pela Portela, justamente porque, de repente, não podia entrar na escola. Agora, se não tem uma fantasia bonita, não pode desfilar. Já está perdendo o sentido popular. O próprio povão do Rio mesmo, no dia do desfile, não pode ver porque não tem dinheiro para pagar arquibancada… muito menos para fazer fantasias.
Por outro lado em Salvador sai todo mundo atrás do Trio Elétrico e é animado.
Qual o resultado do Carnaval 80?
Quanto ao resultado, a gente mais que ninguém, ficou otimista. Vimos no último dia quase 5.000 mil pessoas na rua. Tudo isso sem falar na chuva que nos deixou bastante preocupados. Mesmo assim, o pessoal participou. Como em todo trabalho, a dificuldade financeira se apresentou como ponto fundamental. Este ano as coisas estão melhores. Outra dificuldade apresentada foi a falta de costume, de oportunidade para praticar e realizar o que se entende por liberdade…
O que vem a ser então, o Clubinho Carnavalesco do Povo?
O Clubinho é justamente a síntese de tudo o que a gente tem na cabeça em relação ao carnaval: a preocupação em fazer um carnaval voltado para participação de todos. Tal preocupação deu origem a formação de uma entidade exclusivamente voltada para este tipo de trabalho.
Qual a forma prática encontrada pelo Clubinho para as pessoas participarem?
No momento, procuramos criar uma infra-estrutura que facilitará imensamente o desenvolvimento das atividades. Assim, estamos empenhados na aquisição de instrumentos e aparelhos cujo custo é relativamente bem alto. Uma boa experiência que tivemos foi a promoção de um grito de carnaval no Caiçaras. O Clube lotou, não teve briga nenhuma, e foi acessível a muita gente, Cr$100, 00 o ingresso.
Temos outras promoções em vista, como um grito de carnaval na Lagoa Formosa e outro na Recreativa.
O Clubinho agora está definitivamente legalizado. Contando com cerca de 100 associados e convidamos a todos que se mostrarem sensíveis ao nosso trabalho, que participem efetivamente do Clubinho. A discussão dos Estatutos é de fundamental importância para que estes se tornem, além de legais, legítimos.
A forma de filiação é simples, bastando que o interessado procure algum membro do Clubinho para que este apresente seu pedido, à diretoria. Existe uma taxa mensal de Cr$ 50,00 que é usada para manutenção da entidade durante o ano.
Sendo o Clubinho uma associação voltada para a cultura popular, como vocês pretendem realizar uma ligação maior com os bairros da cidade?
Realmente, queremos todo mundo no carnaval, seja rico, pobre, do bairro ou do centro. Foi apresentada uma excelente proposta por um dos membros do clubinho, onde este sugeriu que uma forma de permitir objetivamente a participação dos bairros, seria incentivar a criação de blocos de bairros. Tais blocos participariam através de um prêmio de originalidade ou coisa parecida. Contudo, lembrando uma crítica feita anteriormente, não pretendemos despertar o interesse por fantasias suntuosas, pelo contrário, buscamos a simplicidade, originalidade, uma forma na qual o homem seja o elemento mais importante.
Quanto a banda do Clubinho, gostaríamos de saber como ela se compõe?
Nossa banda é, de certa forma, uma extensão do trabalho do ano passado. Na verdade, é até difícil explicar como as pessoas que a compõem se conheceram. Foi simplesmente incrível como o samba conseguiu criar uma corrente de amizades tão boas.
Todos, sem exceção, tocam sem nenhum interesse financeiro, pelo prazer que a música oferece. Lembrar nomes agora seria um pouco difícil pois temos gente paca. Lembramos, porém, que temos um time de primeira qualidade, sobretudo como pessoas.
Sabemos que o Clubinho Carnavalesco do Povo apresentou ao prefeito, Dr. Dácio, um anteprojeto no qual se propõe a construção de um coreto em nossa cidade. Qual o propósito de vocês e como anda o desenvolvimento desta idéia?
O Clubinho apresentou a cerca de 4 meses tal anteprojeto. No memorial elaborado pelo projetista Jaime Wesley, que inclusive é secretário auxiliar do Clubinho, expomos a necessidade do coreto, tendo em vista a importância de um espaço físico e cultural, onde se possa realizar uma série de atividades culturais. Desta forma, o Coreto não só é tido como um elemento cultural digno de preservação de várias outras atividades artísticas.
Notemos por exemplo: a Banda Municipal, que vem aos trancos e barrancos sobrevivendo, a Feira de Arte, que necessita de um centro onde as pessoas se aglomerem, as Folias de Reis, os shows musicais, etc. Eliminaríamos inclusive a necessidade da construção de palanques temporários em épocas festivas. Sob o Coreto está previsto também a construção de um barzinho Cultural com o objetivo de dinamizar o local, manter sempre a presença das pessoas, dos visitantes e dar oportunidades para que os artistas locais se apresentem. Esse bar ficaria sob a administração direta do Clubinho em convênio com a Prefeitura. Os termos desse acordo ainda não foram definidos. Com uma renda, constante, o Clubinho ficaria isento da necessidade de outra contribuição pública.
A Prefeitura até agora se mostrou sensível e otimista quanto à execução do projeto e atualmente a situação está em vias de se saber qual o orçamento necessário. O projetista está fazendo o projeto final. Lembramos ainda que não é pretensão nossa, de forma alguma, sacrificar o orçamento público e desviar verbas que prioritariamente devem ser destinadas para um saneamento básico por exemplo. Mas é importante que se tenha em mente também a importância do lazer público como uma necessidade da população.
Qual a dica de vocês para este Carnaval?
No dia 28 estaremos aí de novo em ação e esperamos fazer um carnaval melhor, mais organizado e se possível, com matinê para as crianças. Desde já convidamos a todos”.
* Fonte: Revista A Debulha, do arquivo de Dácio Pereira da Fonseca.
* Foto: Akatu.org.br, meramente ilustrativa.