DEIXAREI SAUDADE − 247

Postado por e arquivado em 2023, DÉCADA DE 2020, FOTOS.

Não sei quando foi assentado o meu primeiro tijolo, mas que faz muito tempo, isso faz. Enquanto os humanos não sentem absolutamente nada quando começam a se desenvolver nos úteros, nós imóveis participamos, damos vivas a cada parede erguida. Não importa se é uma mansão ou uma casinha simples como eu. A emoção exala pelas estruturas quando nos são colocadas as janelas, portas e o telhado. Quando a pintura vem a felicidade aumenta. Aí, olhamos pra dentro de cada pedacinho de reboco e dizemos a nós mesmos: − sou um imóvel e vou aconchegar almas humanas, e até animais. Eu surgi nessa rua de terra um pouco abaixo do nível da via, pois meus construtores não quiseram, ou não puderam, nivelar o lote. Quando o progresso começou a chegar por aqui, veio o asfalto, e então eu fiquei mais abaixada ainda do nível da via¹. Tudo bem, o que importa é que eu estava feliz com a minha existência simples e sendo útil. Mas o progresso é atroz, terrível, e vem nos consumindo como fogo em capim seco. De uns tempos para cá, percebo um relaxo com a minha condição física. Será algum sinal de que meus ocupantes vão abandonar-me? Com essa predaiada surgindo pra tudo quanto é lado, já tenho como certo que nós estamos invariavelmente perdidas, com o tempo de vida em contagem regressiva. Pelo menos um sujeito passou por aqui e me fotografou, e tenho certeza que estarei registrada na História de Patos de Minas. Sendo assim, deixarei saudade!

* 1: O imóvel localiza-se na curta Rua Independência, entre suas colegas General Osório e Dores do Indaiá/Olegário Maciel.

* Texto e foto (13/05/2023): Eitel Teixeira Dannemann.

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