PEDRO E O PSICÓLOGO − 5/5

Postado por e arquivado em CANTINHO LITERÁRIO DO EITEL.

– Primeiro contei tudo ao pai dela. Inicialmente o Humberto ficou revoltadíssimo e demonstrou que estava disposto a vingar a honra da família, chegando a avançar pra cima de mim. Quando lhe apontei um revólver ele sentou-se e a conversa transcorreu de modo tranquilo. Comprei uma casa pra Janaína e prometi ajudá-lo a reconquistar a filha para que os dois morassem juntos novamente. Também melhorei o seu salário. O duro foi a conversa com a Janaína. Eu cheguei e disse que precisávamos dar um tempo em nosso relacionamento. Ela ameaçou fazer um escândalo danado, mas foi só eu dizer que ia dar uma casa pra ela e que ela teria todas as condições financeiras para criar o filho é que se acalmou.  Imediatamente lembrei-me das palavras do doutor, quando disse que ela planejara a gravidez para se dar bem na vida.

– Ela então se acalmou e prometeu não falar nada?

– Ela e o pai. Eu fiz uma reunião com os dois e mostrei a eles que precisavam voltar a viver como verdadeiros pai e filha.

– Mas foi muito fácil, aquele seu desespero foi praticamente inútil.

– Doutor, tem momentos que esqueço que sou rico e que o dinheiro pode comprar as pessoas.

– Lembre-se sempre de que nem todas as pessoas se vendem.

– Pra mim toda pessoa tem seu preço, e estes dois se venderam numa boa.

– Nesta você deu sorte. Já pensou se a Janaína bate o pé e resolve não aceitar a sua oferta, optando por querer viver contigo?

– Concordo. Mas o senhor estava certo desde o início sobre seu caráter. Na realidade ela vendeu seu corpo, certo?

– Não posso afirmar com convicção que a jovem tenha se relacionado sexualmente contigo com o único propósito de conseguir bens. Digamos que ela uniu o útil ao agradável. Pois muito bem, o caso Janaína está resolvido. E quanto à Candinha e as outras?

– Com relação às outras foi fácil, pois se tratavam apenas de casos. Simplesmente parei de entrar em contato com elas. Já com a Candinha, está praticamente resolvido.

– Você e a Candinha continuam amantes?

– Sim, mas a coisa mudou. Tivemos uma conversa muito séria e eu ameacei despedi-la e ao Jorge se ela não tirasse da cabeça a ideia de se separar do marido para vivermos juntos. Consegui mostrar a ela que jamais isso iria acontecer, e que se gostava dos nossos encontros secretos, deveria assumir a condição de amante vivendo normalmente com o marido. Ainda mais depois que aumentei o salário do Jorge. Na verdade, não posso negar, ele é muito bom no que faz. Estou até pensando em colocá-lo como sócio da empresa, com uma pequena participação, é claro.  Ele é uma tranquilidade só, e nem liga mais quando marco uma daquelas famosas reuniões.

– Depois da conversa com a Candinha, vocês já foram ao apartamento do amor?

– Apartamento do amor? Que negócio é esse, doutor?

– É apenas uma brincadeira. Estou me referindo àquele apartamento mobiliado que você alugou para levar as suas amantes.

– Ah!, bom. Bem, eu e a Candinha ainda não saímos depois da conversa. Mas aquela danada de mulher é mesmo tinhosa. Ontem mesmo falou baixinho no meu ouvido que estava morrendo de vontade. Essa tal de mulher não é fácil não, sô.

– E a esposa e os filhos?

– Maravilha, doutor. A Daura está uma flor de mulher. Sabe como é, aumentei os carinhos com ela e mesmo ela não dando muito importância àquilo que mais gosto resolvi levar no jeito. Para falar a verdade, até a Soraia, que é outra que mexe com minha cabeça, deixei de lado.

– Fico satisfeito por tudo estar se encaixando da melhor maneira possível. Mas algo me intriga.

– Por quê?

– Desde a nossa primeira conversa, você demonstrou total relutância em abandonar seus relacionamentos amorosos extraconjugais. Hoje seria o dia de iniciarmos um tratamento específico para seu caso, pois já tenho articulado o que lhe provoca tamanho desejo sexual. Mas eis que, não mais que de repente, tudo mudou, e como se nada daquilo tudo tivesse tanta importância, você simplesmente passou uma régua. Acredito que houve algum acontecimento que propiciou este outro direcionamento em sua vida. Estou certo? Ou será que eu sou tão bom Psicólogo assim a ponto de resolver todos os seus problemas em apenas quatro consultas de bate-papo?

– Doutor, não é a toa que o preço da sua consulta é tão alto. Parece até que o senhor está lendo a minha mente.

– Então aconteceu alguma coisa nestes quarenta dias que o transformou?

– Na bucha! Bem, eu nem queria tocar no assunto, mas como o senhor pôs o dedo na ferida…

Você já devia ter em mente que não pode deixar de me contar nada.

– Esta bem, padre.

– Sem brincadeiras, Pedro. O que houve em sua vida que mudou seu modo de encarar as coisas?

– Adivinha?

– Não vai me dizer que entrou outra mulher na jogada?

– Mais uma vez, na bucha!

– Mas Pedro, sinceramente você está me deixando confuso. Após ouvir tudo o que eu disse eu imaginei que você tinha abandonado este hábito e que não precisaria mais do tratamento que elaborei para você.

– Qualé a sua, doutor, jamais vou abandonar o hábito de gostar de mulher.

– Não estou me referindo a você deixar de gostar de mulher, e sim ao hábito de relacionamento amoroso extraconjugal.

– Ah! sim, aí tudo bem. Realmente, após as suas opiniões, decidi dar uma brusca freada em minhas escapadas. Nada de quantidade. Como eu já expliquei, o senhor estava certo quando disse que eu estava exagerando em me relacionar com muitas mulheres e por isso…

– Pedro, eu fui claro em dizer que todo relacionamento amoroso fora do casamento é inconsequente, mesmo que seja somente um.

– Peraí, não foi isso que eu entendi. Pra mim, o senhor estava querendo dizer que o relacionamento com muitas mulheres ao mesmo tempo poderia me trazer transtornos, como realmente aconteceu. Por isso resolvi parar com a quantidade. Tanto é que já tinha me decidido ficar só com a Candinha. Depois do acordo com a Janaína, deixei-a para não transparecer de maneira alguma que o filho que ela espera é meu.

– Tudo bem, mas apareceu outra mulher.

– Doutor, do fundo do meu coração, eu juro por tudo quanto é mais sagrado neste mundo que desta vez é pra valer.

– O que é para valer desta vez?

– A partir de agora, só terei uma amante. Eu disse que ia ficar mesmo era com a Candinha, mas depois do que aconteceu, não teve jeito. Doutor, gamei mesmo.

– Pelo amor de Deus, Pedro, diga logo o que aconteceu. Estou começando a acreditar que minhas orientações não serão suficientes para curá-lo.

– Peraí, doutor, deixa eu contar o que aconteceu.

– Então conta.

– Semana passada fui à Biblioteca do UNIPAM fazer uma pesquisa. Foi quando surgiu uma sobrinha minha com uma colega. Ela parou para me cumprimentar e quando reparei na colega dela, quase meu queixo foi ao chão. Doutor, estava ali na minha frente uma estudante lindíssima, loura, olhos azuis, com o sorriso e os dentes mais lindos do mundo. E, o mais importante, quando desci os olhos e percebi aquele corpinho, fiquei maluco.

– Lá vem você de novo com fixação em adolescentes.

– Sinceramente, não teve jeito de segurar. Estava ali na minha frente um tremendo avião. E eu, o senhor bem sabe, mesmo com meus 46 anos, boto muito garoto metido a bonito no bolso.

– E aí, o que aconteceu?

– Aconteceu que, percebendo que minha sobrinha estava com muita pressa, num estalo me ocorreu uma ideia. Pedi a ela que me levasse até o Departamento de Engenharia. Como eu já esperava, ela disse que estava com muita pressa e o que eu mais queria que acontecesse aconteceu: ela pediu à colega pra me levar lá. No caminho, não estava vendo nada. Com uma beldade daquela ao meu lado e com um baita sorriso no rosto eu lá ia querer saber de ver paredes?

– E aí?

– E aí que fui logo jogando uma conversa pra cima dela. Mas ela se manteve serena, não dando pinta que estava interessada.

– Interessada em que?

– Pô doutor, o senhor é mesmo muito ingênuo. É óbvio que meu papo começou a agradar a garota. E como o senhor bem sabe, estou enxutasso nos meus 46 anos. Papo vai, papo vem e a garota toda sorrisos pra mim. Até que resolvi simular um atendimento de celular para desviar a caminhada até meu carro. Educadamente, ela me acompanhou até meu carro. Aí ela disse: − que coincidência, seu carro é igual ao meu e até a cor também. Tentei puxar mais papo, mas ela, na maior educação, se despediu. É, pensei, tá dando uma de difícil e claro que vou tentar conquistá-la.

– Como era o aspecto físico da garota?

– Eu já falei, doutor.

– Queira ter a gentileza de repetir.

– Bem, a garota deve ter uns 20 anos. É linda, loura, com cabelo comprido e olhos azuis. Doutor, que sorriso e que dentes maravilhosos e, nossa senhora, que corpinho. E o mais importante, é claro, percebi claramente que ficou caidinha por mim.

– Diga-me, por favor, qual é a cor do carro dela.

– Pô doutor, por que você quer saber a cor do carro da beldade?

– Pedro, qual a cor do carro dela, diga-me logo.

– Uai, doutor, é importante para o senhor saber a cor do carro da garota?

– Vamos logo, Pedro, diga logo a cor do carro da jovem.

– Cinza.

– Agora, a última pergunta. Diga-me, pelo amor de Deus, qual é o nome da garota?

– Não estou entendendo essa. Você está meio estranho, doutor. Por que está assim tremendo e todo vermelho? Por que está me olhando assim com estes olhos arregalados?

– Pôrra, diga logo o nome da garota.

– Tudo bem, calma, se isso é importante para as suas anotações o nome dela é Renata.

O que aconteceu após a pronúncia do nome da garota foi uma confusão só, pois a Renata é a filha única e adorada do Psicólogo. Para maiores informações sobre o que aconteceu entre os dois, a secretária do Médico é a única fonte confiável, pois era a única pessoa presente no momento em que a primeira cadeira voou. Como profissional de total confiança, é praticamente certo que jamais saberemos sobre os assombrosos momentos vividos pelos dois dentro do consultório. Uma coisa é certa: o doutor continua clinicando no mesmo local, após ter sido obrigado a trocar toda a decoração, destruída por causa da estrondosa briga. Quando lhe perguntam o porquê da enorme cicatriz presente na testa, ele responde que foi por causa de um pequeno acidente de trânsito. Renata, que no encontro com o Pedro mostrou-se única e exclusivamente educada, não foi mais molestada pelo tarado, obviamente. A Candinha teve um filho com o amante – seria o Pedro? – e o Jorge, hoje sócio, ainda brinca com a semelhança entre seu filho e o ex-patrão. A Janaína, por ironia do destino, se casou com um Engenheiro que aceitou sem problemas o seu filho, e hoje é concorrente do ex-amante – será? Daura continua achando que o Pedro é um exemplo de marido fiel e bondoso e continua gerenciando a mansão e os dois filhos, sendo que o rapaz, de 17 anos, engravidou a namorada. As mulheres que eram consideradas casos tomaram cada um seu rumo na vida. E o Pedro, bem, depois da briga teve que se submeter a uma cirurgia nos dois testículos devido a um enorme hematoma provocado por um forte traumatismo que por pouco não resultou em extirpação. Mas o dito, incorrigível como sempre, continua com seus desarranjos intestinais, principalmente depois que a Francisca ficou grávida. Quem é Francisca? Adivinhe!

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Wdrfree.com, meramente ilustrativa.

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