Sou uma privilegiada, pois surgi na condição de quem tinha condições de me erguer assim como sou agora. Se fui erguida sobre os escombros de alguma semelhante dos idos tempos, fazer o que, não tenho culpa. Sinto pena, realmente sinto pena de quem cedeu lugar para mim. Minha vida tem sido saudável por demais da conta. Durante muito tempo nem tive a preocupação de perceber mudanças estruturais no meu entorno¹. Foi acontecendo e eu fui ao som da balada. É, balada, de boa música, daqueles tempos em que havia música de qualidade, tanto daqui quanto de fora, aos montes. Hoje, minha Nossa Senhora da Abadia, é cada troço que escuto aqui dentro de mim que às vezes tenho vontade de me desgarrar desse solo e sumir no mundo. De uns anos para cá é que comecei a reparar nas tais mudanças estruturais. Lugar de só casas, quando muito de dois andares, começaram a ceder lugar para os fatídicos edifícios, símbolos-mor do progresso. Repara nesse aí atrás de mim². Que nem ele, maior ou menor, estão surgindo que nem mosca em carne. Isso pode ter alguma coisa a ver comigo? Primeiramente pensei que não. Depois que minhas paredes ouviram que é mais fácil a Cidade crescer para cima ao invés de para os lados, sei lá, ligou-se o meu desconfiômetro. Foi então que percebi que meu futuro, como o de todas as casas por aqui, será ceder lugar para um edifício. Quando isso vai acontecer não tenho a mínima ideia, mas que vai acontecer, isso é como dois mais dois igual a quatro. E nessa, estarei definitivamente fazendo parte da História de Patos de Minas. E o melhor, deixarei saudade!
* 1: O imóvel localiza-se na esquina da Rua Olímpio Pereira de Melo (à esquerda) com sua colega Carajás (à direita), no Bairro Caiçaras.
* 2: Hotel Ibes, na Avenida Marabá.
* Texto e foto (22/12/2021): Eitel Teixeira Dannemann.