NORMAS DE FUNCIONAMENTO DO 1.º MATADOURO E DOS AÇOUGUES

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Camara Municipal
Resolução n.º 104 de 15 de janeiro de 1908

O povo do Municipio de Santo Antonio dos Patos, por seus representantes na Camara Municipal, resolveu e eu, em seu nome sancciono o seguinte decreto:

Art. 1.º − O matadouro municipal é o único logar da Cidade e suburbios em que se deverá fazer a matança do gado de qualquer especie destinado ao consumo publico.

Art. 2.º − A entrada do gado a abater-se, para o matadouro, effectuar-se-á em hora do dia designada por edital.

Art. 3.º − Não se poderá receber nos curraes e chiqueiros do matadouro mais gado do que elles comportar folgadamente.

Art. 4.º − O gado vaccum não poderá permanecer nos curraes do matadouro por mais de dois dias.

Art. 5.º − Os porcos, carneiros e cabritos devem ser alimentados por conta dos seus donos que farão a matança dentro de trinta dias.

Art. 6.º − A falta de alimento a esses animaes e de pagamento das respectivas despezas, bem como a não terminação da matança no prazo declarado nos artigos 4 e 5 darão logar a venda delles em hasta publica para ter deduzida a importancia dispendida e o excedente será recolhido ao cofre municipal para ser entregue, em tempo, a quem de direito.

Art. 7.º − A matança de porcos, carneiros e cabritos se fará em seguida a do gado vaccum, quando simultaneamente não possa ser effectuada.
§ 1.º − As visceras serão immediatamente lavadas no logar designado pelo administrador e colocadas em vasilhas apropriadas para serem conduzidas ao seu destino.
§ 2.º − Os couros serão immediatamente espichados ou salgados e guardados no compartimento do matadouro para esse fim destinado.

Art. 8.º − É absolutamente prohibido, dentro da cidade, o deposito de gado de qualquer especie para ser abatido.

Art. 9.º − É absolutamente prohibido matarem-se touros, rezes suspeitas de doentes ou hervadas e as que estejam muito magras.

Art. 10.º − É prohibido maltratar e dar pancadas nos animaes que tenham de ser abatidos, não podendo o administrador permittir que sejam recolhidos aos curraes do matadouro aquelles que apresentarem signaes de máo trato.

Art. 11.º − O administrador examinará o gado de qualquer especie que chegar ao matadouro para ser abatido e regeitará as rezes que se referem os ats. 9 e 10.
§1.º − As rezes regeitadas serão immediatamente separadas e marcadas pelo administrador do matadouro.
§ 2.º − Os donos das rezes regeitadas serão obrigados a retira-las no mesmo dia, sob pena de serem vendidas em hasta publica e o producto recolhido ao cofre municipal para ser entregue a quem de direito, depois de deduzidas as despezas e multas.

Art. 12.º − O administrador, no acto de recolher o gado, tomando nota do dia e hora da entrada do mesmo, do numero de cabeças pertencentes a cada dono, da qualidade e estado das rezes e logar de onde vieram, fará separação das que não estiverem nas condições de ser abatidas.

Art. 13.º − Alem do exame procedido no gado em pé, o administrador procederá a outro no gado abatido  e esquartejado antes de serem transportadas as carnes para os açougues afim de verificar o estado dellas e fará incinerar as que não forem julgadas em condições de servirem de alimentação, por nocivas a’ saude.
§ 1.º − Só poderão ser transportadas para os açougues e dadas ao consumo publico as carnes que forem consideradas bôas.
§ 2.º − No caso de duvida ou de reclamação da parte será ouvido o médico de partido da Camara, ou na falta deste, o Agente executivo que definira definitivamente.

Art. 14.º − Não podem ser expostas a venda carne de animaes que não sejam abatidas no matadouro. Multa de 50$000 e apprehensão da carne.

Art. 15.º − A matança do gado começará pela manhã a hora em que o administrador, de accordo com o medico de partido, determinar, affixando-se editaes com cinco dias de antecedencia. Depois do signal dado para a suspensão da matança nenhuma rez mais poderá ser abatida.

Art. 16.º − Qualquer que seja o modo adoptado para matança do gado é essencial que seja sangrado immediatamente deixando-se escoar o sangue convenientemente.
§ Unico − Para o esfolamento e abertura serão os animaes suspensos em ganchos apropriados e se procederá com o necessario cuidado para que nem a parte pelluda do couro e nem as vísceras se ponham em contacto com a carne.

Art. 17.º − A Camara estabelecerá o serviço de transporte das carnes do matadouro para os açougues em carros apropriados, fechados por venezianas e de accôrdo com as prescripções hygienicas.
§ 1.º − Enquanto não for estabelecido o serviço de transportes as carnes serão pelos interessados conduzidas do matadouro para os açougues de modo que fiquem resguardadas do sol e das impurezas do ar.

Art. 18.º − As carnes serão removidas do matadouro para os açougues, no inverno, das duas horas da tarde em diante e no verão das quatro em diante.

Art. 19.º −  Os donos das carnes ou açougueiros pagarão adiantadamente a importancia do transporte para os açougues, as taxas do matadouro e o imposto de consumo, de accordo com a tabella fixada pela Camara e pela lei do orçamento em vigor.

Art. 20.º − Durante o transporte as carnes deverão ser penduradas em ganchos presos no tecto ou lados da carroça e fixadas em baixo de modo a não soffrerem choques reciprocos.

Art. 21.º − As carnes que tenham de ser vendidas nos domicilios serão conduzidas em carros apropriados, taboleiros ou cestos, cobertos com tela de arame ou toalhas perfeitamente limpas, de modo que recebam o ar e não fiquem expostas ás moscas.

Art. 22.º − Os carros e vasilhas para condução de carnes como os conductores deverão ter o maior asseio possivel.

Art. 23.º − Ao administrador do matadouro compete:
§ 1.º − Manter a policia do estabelecimento de accôrdo com este regulamento e assistir o serviço todos os dias uteis desde o principio da matança até a conducção da carne para os açougues, nas horas declaradas no art. 18, não permittindo que creanças assistam a matança do gado e nem que pessoas estranhas ao matadouro se conservem no perimetro delle sem sua licença previa.
§ 2.º − Prohibir que abata gado de qualquer especie que suspeitar estar doente e reparal-o logo, participando immediatamente ao medico de partido ou ao Agente Executivo Municipal.
§ 3.º − Reclamar desta auctoridade todas as medidas necessarias a bôa ordem e conservação do estabelecimento e della receber as instrucções convencentes ao serviço.
§ 4.º − Manter o edificio, curraes e todas as dependencias do matadouro no maior asseio possivel, tratar da arborisação e mais plantações alli existentes e não permittir a entrada de cães no estabelecimento.
§ 5.º − Conservar sempre os tanques com agua limpa.
§ 6.º − Enviar semanalmente ao Agente Executivo um boletim contendo o numero de rezes de toda especie abatidas, peso, nome de seus donos e numero das que tiveram sido rejeitadas.
§ 7.º − Entregar semanalmente ao Procurador da Camara os dinheiros arrecadados.
§ 8.º − Fiscalisar o material empregado no serviço de transporte de carne; a limpeza das respectivas carroças; tratar dos animaes; requisitar os fornecimentos; pedir os concertos dos vehiculos; fiscalizar e multar os cocheiros, magarefes e mais subalternos que não cumprirem as suas ordens.
§ 9.º − Passar guias aos vendedores ambulantes de carnes.

Art. 24.º − Ao administrador poderão ser impostas pelo Agente Executivo as penas disciplinares a’ que estão sujeitas os fiscaes, nos termos do referido regimento.

Dos açougues

Art. 25.º − Os açougues só poderão ser estabelecidos, precedendo licença do Agente Executivo, em casas que satisfaçam as condições seguintes:
1.ª − Ter sala que receba ventilação abundante e constante e separada de qualquer outro commodo de negocio diverso do de sua especialidade.
2.ª − Ser munida de mezas ou balcões e de toda a ferragem, destinada a pendurar, pesar e expedir a carne, perfeitamente limpa e sem pintura.
3.ª − A sala do talho deverá ser conservada perfeitamente limpa e não conter objectos que sejam estranhos a esse ramo de negocio.

Art. 26.º −  Os requerimentos de licença para abertura de açougues serão informados pelo medico de partido, que mencionará em seu parecer, circunstanciadamente, si a casa indicada e local escolhido estão ou não nas condições necessarias.

Art. 27.º − Tres mezes depois da publicação deste regulamento nenhum açougue poderá funccionar sem que nelles sejam observadas as prescripções acima.

Art. 28.º − Os açougueiros deverão observar, alem do mais disposto neste regulamento e no Estatuto Municipal, as disposições seguintes:
§ 1.º − São obrigados a manter os seus estabelecimentos em completo estado de asseio, não lhes sendo permittido ter nos mesmos qualquer ramo de negocio diverso de sua especialidade e nem tão pouco guardar nos mesmos objectos que lhe sejam estranhos.
§ 2.º − Disporão de facas, e serras apropriadas para o conveniente talho de carnes e ossos, de uma balança de metal com os respectivos pesos de 50 grammas até 10 kilogrammos, devidamente aferidos, collocada em logar onde os compradores possam verificar a exatidão do peso.
§ 3.º − As carnes serão mantidas suspensas em ganchos affastados da parede e não poderão ser expostas nas portas ou logares que recebam os raios solares, devendo sempre ser cobertas com pannos proprios e perfeitamente limpos.
§ 4.º − A carne não vendida até as quatro horas da tarde será incontinenti salgada e só nesse estado poderá ser dada ao consumo publico.
§ 5.º − Toda a carne que, por seu aspecto e cheiro, revele começo de decomposição ou alteração, será immediatamente conduzida, a custa do dono ou açougueiro, para ser incinerada no logar conveniente.
§ 6.º − A venda de carne nessas condições ou da não vendida ou guardada sem salgar-se contra a disposição do § 4.º deste artigo, assim como a falta no peso para menos na quantidade comprada, sujeitarão o açougueiro á multa de 50$000 e a prisão por oito dias, sendo cassada a licença no caso de reincidencia.

Art. 29.º − E’ absolutamente prohibido as pessôas que soffrem de molestias contagiosas ou repugnantes vender carne ou entrar nos açougues.

Art. 30.º − Os vendedores ambulantes de carne verde serão obrigados a observar o disposto no art. 21 e tanto elles como as venderem nos açougues deverão apresentar, quando reclamado pela auctoridade fiscal, uma guia passada pelo administrador do matadouro.
§ Único − Esta guia conterá o estado das carnes e o pagamento do respectivo imposto e taxas.

Art. 31.º − As infracções destas disposições serão punidas com a pena de 3 a 7 dias de prisão e multa de 10$ a 50$000, conforme a gravidade do caso e elevadas ao dobro no caso de reincidencia, alem de serem apprehendidas as carnes para terem o destino declarado no art. 13 e no art. 28 podendo tambem ser cassadas as respectivas licenças.

Disposições geraes

Art. 32.º − O damno causado pelo gado que fugir do matadouro será satisfeito pelo administrador quando a fuga se der por negligencia ou culpa delle.

Art. 33.º − São competentes para impor multas, nas formas regulamentares, o administrador do matadouro e os fiscaes.

Art. 34.º − Os açougueiros são obrigados a portar-se com decencia não proferindo palavras obcenas e deverão tratar com urbanidade os seus freguezes.

Art. 35.º − O Agente Executivo expedirá as instrucções necessarias para a execução do presente regulamento e marcará o salario do magarefe e do seu ajudante accumulando este o serviço de transporte de carne, podendo, nos dias de serviço extraordinario, mandar contatar o pessoal que julgar necessario.

Art. 36.º − Toda e qualquer infracção deste regulamento que não tiver pena especial será punida com a multa de 10$ a 100$000 e com a pena de 15 dias de prisão nas reincidencias.

Art. 37.º − O presente regulamento vigorará desde que seja inaugurado o matadouro ora em construcção na Cidade¹, ficando revogadas as disposições em contrario.

Paço da Camara Municipal de Patos, 15 de Janeiro de 1908.
Olegario Maciel − Presidente.

Tabella

– Matança, esfolamento, espichamento ou salga do couro e lavagem das visceras do gado vaccum por cabeça − 4:000
– Matança do gado suíno e lavagem das visceras por cabeça − 1:000
– Matança do gado ovino e caprino, por cabeça −  :500
– Transporte da carne do matadouro para os açougues, por cabeça:
– Gado vaccum − 1:000
– Gado suíno − :500
– Gado ovino e caprino − :200

Observações

1.ª − Esta tabella não comprehende o imposto de sangue, que continuará a ser cobrado de conformidade com a tabella annexa á do orçamento em vigor.

2.ª − No caso de ser feita no matadouro matança de porcos para o preparo de toucinho salgado, este poderá ser retirado, depois de preparado, pelos proprios donos, pagando a taxa de 1:000 por cabeça.

Paço da Camara Municipal da Cidade de Patos, 15 de Janeiro de 1908.
Olegario Maciel − Presidente.

Sellada, publicada e registrada nesta Secretaria da Camara Municipal da Cidade de Patos, aos 17 de Janeiro de 1907².
Official da Camara
Americo José de Sant’Anna.

* 1: O 1.º Matadouro Municipal foi inaugurado no mês e ano dessa resolução.

* 2: Não é “1907”, e sim “1908”. Óbvio que foi erro no momento da escrita, pois o jornal “O Trabalho” era escrito à mão e depois mimeografado para distribuição. Nesse caso, a revisão não foi adequada.

* Fonte: Edição de 31 de janeiro de 1908 do jornal O Trabalho, do arquivo da Hemeroteca Digital do Triângulo Mineiro a Alto Paranaíba, via Altamir Fernandes.

* Fotos: Do texto original.

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