Por que esse portão aberto? Quem hoje é meu dono quer o que com isso? Por um acaso está querendo mostrar a todos os passantes por aqui a minha degradação¹? Tem dó, Deiró, não mereço isso. Sou dos áureos tempos em que apreciava à minha frente aquela marcenaria². Sou dos áureos tempos em que apreciava também a garagem da Viação São Cristóvão logo ali na esquina³. Nos idos tempos não tinha esse muro e muito menos esse portão, porque naquele tempo não tinha motivo essas porcariadas. Eu, no meu esplendor, era vista por todos. Eu sou, sem falsa modéstia, um imóvel representativo nessas bandas. Depois que servi meus construtores, servi mais um mundaréu de gente. Gente do Céu, o que adiantou tudo isso? Por aqui tem história demais da conta, todos esses imóveis no meu entorno se pudessem falar, enriqueceriam a nossa Memória Cultural. Mas, ô diacho, não temos a capacidade da fala, e eu tenho um monte, um mundaréu de informações a relatar. Disgrama, sô, se eu pudesse me comunicar com esse sujeito que me fotografou, que definitivamente registrou para a História de Patos de Minas a minha existência, ô, ele ia consumir várias, inúmeras páginas sobre o nosso Passado. Mas não posso falar, não tenho a quem clamar. Observando o desenvolvimento progressivo nessa região, o surgimento de tantos edifícios nos escombros das minhas semelhantes, sentindo em cada tijolo de minhas paredes o cruel descaso à minha existência, só me resta esperar o meu fim, e quando acontecer, deixarei saudade!
* 1: O imóvel localiza-se na Avenida Brasil entre as Ruas Dona Luiza e Barão do Rio Branco, no Centro.
* 2: Leia “Deixarei Saudade − 31”, “Clóvis Simões Cunha: Guaratinga, 30 de Janeiro de 1944”, “1.º Acidente Aéreo”.
* 3: Leia “Deixarei Saudade − 68”.
* Texto e foto (30/06/2021): Eitel Teixeira Dannemann.