Abandonada por você, tenho tentado te esquecer, no fim da tarde uma paixão, no fim da noite uma ilusão, no fim de tudo, a solidão. Quantas vezes ouvi essas palavras de uma música que meus ocupantes adoravam¹. Naqueles momentos não atinava sobre o meu futuro, e com minhas paredes ligadas naquele som eu apenas apreciava a curtição daquelas pessoas. Aí aconteceu o de sempre: enjoaram da música e depois nunca mais ouvi. Se não me engano isso foi na década de 1990. Nessa época aqui era um lugar só de casas². Eu e minhas semelhantes levávamos as nossas vidas de imóveis reparando numa reforma ao lado, numa reforma acolá, até que começaram a demolir as casas para erguerem edifícios. Isso me encucou, pois eu me perguntava o que estava acontecendo. Certo dia, demoliram a minha vizinha de lado e ergueram esse edifício aí. Não muito tempo depois, meus ocupantes foram aos poucos me abandonando, com todas as minhas estruturas já sem o cuidado de antes. Sinceramente, não me lembro da última vez que recebi um trato legal. Até que fui abandonada, completamente abandonada. Foi quando entrei numa espécie de transe ao não ouvir mais nenhum som dentro de minhas entranhas. E foi quando, ao perceber logo adiante a demolição de outra semelhante, que me veio aquelas palavras lá do início. Abandonada, a solidão me pegou com força, e nessa maldita solidão, espero o meu fim. Quer queiram ou não, faço parte da História de Patos de Minas, e quando eu for demolida, deixarei saudade!
* 1: Da música “Abandonada”, 1996, de Michael Sullivan e Paulo Sérgio Valle.
* 2: O imóvel localiza-se na Rua Rui Barbosa entre suas colegas Carmo do Paranaíba e Minas Gerais, no Bairro Santa Terezinha.
* Texto e foto (06/06/2021): Eitel Teixeira Dannemann.