A classificação e identificação das crises epilépticas em cães são muito limitadas, devido à dificuldade de descrição nos animais, a pouca utilização da eletroencefalografia na rotina veterinária e também ao fato de que o clínico, na maioria das vezes, não presencia o momento das crises, tendo como base somente a descrição do proprietário que muitas vezes é limitada. Portanto, o histórico detalhado, utilizando-se questionários sobre crises e observação de vídeos realizados pelo proprietário, auxiliam bastante o médico veterinário na identificação e classificação.
O pródromo é o período que precede a crise e consiste em mudanças comportamentais, que podem ocorrer horas ou dias antes das crises epilépticas. Alguns sinais como ansiedade e medo podem ser observados e são muitas vezes bem relatados pelos proprietários. Considera-se aura a fase inicial de uma crise epiléptica que corresponde também ao início de uma crise parcial simples antes da generalização.
O período ictal representa a crise propriamente dita, cuja manifestação é muito variável. Tem duração média de 30 a 90 segundos na maioria dos cães. Geralmente os cães apresentam alteração de tônus muscular, movimentos involuntários, perda de consciência, sialorréia, micção, defecação e vômito. O período pós-ictal, refere-se à fase de recuperação após a crise, em que o paciente pode apresentar-se confuso, com movimentos de marchas circulares, cegueira central transitória, sonolência por longos períodos e polifagia (fome excessiva). Representa a aparência de um paciente cujos neurônios estão exaustos devido à excessiva atividade neuronal. A duração e a apresentação dessa fase são variáveis, geralmente tem duração de uma hora e não existe correlação entre a gravidade e duração da crise com a gravidade e a duração do período pós-ictal. O período interictal relaciona-se ao período entre crises em que o paciente já se recuperou completamente do período pós-ictal, e em que o exame neurológico deve ser realizado.
Muitos proprietários utilizam a palavra convulsão para expressar uma variedade de distúrbios anormais que ocorre com seu animal, portanto é importante determinar, se, de fato, o animal apresenta uma crise, ou outro tipo de desordem mal interpretada pelo proprietário, como síncope, narcolepsia, cataplexia, desordens vestibulares e tremores de diversas origens. Portanto a avaliação diagnóstica deve primeiramente responder a duas perguntas: o animal tem crise epiléptica? Se tiver, qual a causa? Para tanto, a utilização de questionários auxilia bastante na definição de um episódio de crises epilépticas e sua evolução. Dados relevantes que devem ser inclusos no questionário são: raça, idade, sexo, histórico familiar, peso corporal, alimentação, esquema vacinal, doenças prévias ou em curso, possíveis traumas ou intoxicações, medicamentos administrados, data da primeira crise, frequência das crises, comportamento anterior à crise, fatores externos desencadeantes das crises, duração das crises, sinais observados durante as crises, comportamento observado após a crise, comportamentos anormais antes de ter-se iniciado o quadro de crises generalizadas. O histórico detalhado é fundamental, já que o início dos sinais clínicos e a sua progressão nos dizem muito sobre o tipo de injúria do sistema nervoso central que justificariam as crises epilépticas.
As crises epilépticas são manifestações frequentes de distúrbios neurológicos na clínica de pequenos animais, por isso o entendimento correto de termos e também sua correta identificação se tornam fundamentais para diagnóstico correto e início do esquema terapêutico. Compreender a patogênese e os fatores subjacentes que predispõem as crises é um passo fundamental na condução de um caso clínico. Quando identificável, a causa subjacente deve ser tratada, juntamente com a medicação para o controle das crises. Apesar de antigos, o fenobarbital e o brometo de potássio ainda são considerados primeira escolha na terapia antiepiléptica e devem ser usado de forma correta. A terapia com fármacos mais novos deve ser utilizada somente como complemento à terapia padrão, quando esta for inconsistente no controle das crises epilépticas. A retirada da medicação antiepiléptica depende de uma série de fatores, entre eles o tipo de epilepsia, efeitos colaterais do fármaco e droga utilizada. Animais com diagnóstico de epilepsia idiopática devem ser medicados pela vida inteira, mesmo estes não apresentando crises por longos períodos, já que é um distúrbio cerebral crônico e sem causa identificável que possa ser tratada.
* Fonte: Epilepsia em Cães, de Guilherme De Caro Martins, Monografia apresentada na Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (2011), como requisito parcial para conclusão do primeiro ano do Curso de Especialização em Residência Médico Veterinária, Área de concentração: Clínica Médica de Pequenos animais Preceptora: Prof.ª Adriane Pimenta da Costa Val Bicalho.
* Foto: Estimacao.com.br.