A obesidade trata-se de uma condição patológica caracterizada por um acúmulo de gordura maior que o necessário. Em cães, ocorre quando o peso está pelo menos 15% acima do ideal. O conceito de obesidade leva implícito um transtorno prejudicial para a saúde do indivíduo, sendo esta, capaz de aumentar a incidência de algumas enfermidades. Este fato unido à elevada frequência com que se observa a afecção faz da obesidade uma das formas mais importantes de má nutrição na prática clínica de pequenos animais.
Consideram-se dois tipos de obesidade: hipertrófica e hiperplásica. A obesidade hipertrófica, também conhecida como simples ou comum refere- se à presença de tecido adiposo com adipócitos aumentados de tamanho. Já a obesidade hiperplásica é causada por um número excessivo de adipócitos, que podem ser controlados geneticamente, mas estão certamente envolvidos com a excessiva e precoce ingestão energética. Quanto maior a idade há uma tendência de aumento no número de adipócitos.
Apesar de ser considerada doença essencialmente nutricional, na origem da obesidade existem fatores genéticos, sociais, culturais, metabólicos e endócrinos, que determinam caráter multifatorial à afecção. O hábito alimentar dos cães passou por mudanças nas últimas décadas, devido a influência do homem; tornou-se comum a alimentação desses animais com petiscos e guloseimas. Fatores dietéticos como a alta densidade energética, quantidade de alimento oferecido, número de refeições, fornecimento de petiscos e sobras de mesa também apresentam estreita relação com a gênese da obesidade. A mudança no estilo de vida dos animais também contribuiu muito para a elevação dos índices da obesidade canina. Atualmente, os animais vivem em apartamentos e casas, não caçam e não se exercitam como quando tinham vida livre. Cães de meia idade a velhos são os mais predispostos, o intervalo de idade de maior prevalência se situa entre 5 a 10 anos.
A castração é outro fator de risco importante. Muitos estudos sugerem que é devido à redução na taxa metabólica após a castração. Fêmeas castradas têm maior predisposição à obesidade por terem ausência de hormônios sexuais, o que favorece o balanço energético positivo. O estrógeno exerce um efeito inibitório no apetite e machos castrados podem ter diminuição de estímulos sexuais o que reduz sua atividade física. A ausência do efeito de hormônios gonadotróficos pode levar também o maior consumo de alimento. Existem diferenças genéticas entre animais, de tal maneira que alguns têm necessidades energéticas significativamente menores e precisam de menos calorias diárias para manter seu peso ideal. Essas diferenças energéticas podem ser notadas na crescente propensão de certas raças a ganharem peso.
O excesso de peso é um desequilíbrio orgânico que põe em risco à saúde geral, por ser um fator altamente predisponente a muitas outras patologias, determinando problemas do sistema locomotor e das articulações, alterações cardiopulmonares e endócrinas, como a diabetes mellitus, maior susceptibilidade às enfermidades infecciosas, além de aumentar os riscos de complicações cirúrgicas. De um modo geral, a obesidade dificulta a avaliação clínica de um animal. Num exame físico a um paciente obeso, a auscultação torácica, a palpação abdominal e os exames complementares de diagnóstico, especialmente a ultrassonografia, são de difícil execução.
Tem sido relatado que a incidência de problemas reprodutivos é 64% mais elevada em cães com excesso de peso. A obesidade diminui a concentração de testosterona e a viabilidade e qualidade dos espermatozoides. Também causa infertilidade nas fêmeas e aumenta o risco de produção de ninhadas pequenas e da mortalidade neonatal. O excesso de tecido adiposo em torno e dentro do canal de nascimento aumenta o risco de distorcia. Em cães obesos, a excessiva ingestão de comida pode induzir gastrite. Há enfraquecimento do ângulo esófago-estômago que permite o refluxo do ácido gástrico, causando esofagite e halitose. Também tendem a sofrer de enterites, constipação e flatulência.
A prevenção é a melhor maneira de tratar a obesidade. Os cães devem ser alimentados de maneira que permita a manutenção de um peso ideal. Um alimento rico em gordura, que está sendo fornecido a um animal sedentário deve ser racionado de maneira muito rigorosa. O fornecimento de petiscos, doces, ou restos de refeições ao animal de companhia é um acréscimo calórico, devendo ser reduzido na mesma proporção da ração diária consumida. Apesar da restrição energética imposta, a dieta deve assegurar que todos os nutrientes sejam fornecidos em quantidades suficientes de modo a cobrir as necessidades nutricionais adequadas à etapa de vida do animal. Deve ser recomendada uma dieta, caseira ou comercial, especialmente concebida para a perda de peso, que contém níveis de nutrientes ajustados à restrição calórica. As dietas caseiras são especificadas pelo Médico Veterinário e exigem uma rigorosa formulação, de modo a assegurar que é completa e equilibrada.
Os passeios devem se tornar uma rotina diária. Inicialmente, o cão pode ser levado a dois ou três passeios curtos por dia; a duração de cada passeio pode ser gradualmente aumentada à medida que o cão se torne acostumado ao exercício e que a perda de peso comece a ocorrer. Apesar de os passeios serem uma chave integral para o sucesso de um programa de redução de peso, eles não devem ser um estresse excessivo ao cão.
É de grande importância fazer a identificação dos fatores nutricionais e ambientais envolvidos no desenvolvimento da obesidade em cães, para que se possa adotar medidas preventivas e desenvolver melhores estratégias para o tratamento. Devido à dificuldade de identificação pelos proprietários, o Médico Veterinário é fundamental para o reconhecimento desse distúrbio e estabelecer tratamento adequado.
* Fonte e foto: Obesidade canina: Revisão, de Sayenne Ferreira Silva, Allana Karolyne Figueredo de Brito, Bruno Aguiar Andrade Freire, Layane Marques de Sousa e Irley Milarindo Pereira, publicado na edição n.º 4 da revista PubVet em abril de 2017.