“Onde quer que as maiores honras são decretadas ao civismo, à coragem e à dedicação pela Pátria, aí surgem os homens os mais ilustres e bravos”. (Péricles)
Quem se dirige à porta principal da Catedral de Patos de Minas, pela Av. Getúlio Vargas, passa por uma efigie cujos traços expressam as mais elevadas virtudes. Hoje, poucos corações, naquela contemplação, palpitam por causa da lembrança de uma pessoa de seu convívio. A maioria dos estudantes secundários ignora de quem seja aquele busto. Pouquíssimas pessoas o encaram com um arrepio cívico.
No dia 30/07/1936, o Prefeito Clarimundo José da Fonseca Sobrinho inaugurava solenemente o monumento. Não temos notícia de qualquer solenidade ali realizada desde então.
No entanto, de cima daquele modesto pedestal, contempla a cidade eleita de seu coração um dos mais grados cidadãos da História do Brasil. E a Pátria, se pudesse visitá-lo personificada, o reverenciaria.
É lastimável que a juventude patense e mineira não venham sendo formadas à luz da personalidade de Olegário Maciel. Assim fora e certamente seriam outros os tons de nossa História Contemporânea. Nunca é tarde, porém. Que não demorem “o dia e a hora”.
Não pretendemos biografá-lo aqui. Isto é obra para historiadores e, segundo parentes seus, ainda não apareceu em livro. Dados sobre ele estão nos livros de História do Brasil. Uma interessante síntese biográfica lê-se na obra “Domínio de Pecuários e Enxadachins – História de Patos de Minas”, de Geraldo Fonseca, às 214 e ss.
Queremos apenas render-lhe, no ano do cinquentenário da Revolução de 30 e de sua posse no Governo do Estado, nosso singelo, mas penhorado culto cívico.
O PATENSE OLEGÁRIO MACIEL
Alegar que ele aqui não nasceu para recusar-lhe tal condição seria ridículo. Para aqui veio, com seus pais, aos dois anos de idade (1858). Aqui viveram todos os seus 14 irmãos, sendo que 13 aqui nasceram. Aqui permaneceram seus pais até a morte. Aqui estudou as primeiras letras. Aqui foi fazendeiro. Aqui exerceu os cargos de: Juiz de Paz; Vereador, Presidente da Câmara e Agente Executivo (Prefeito) em três mandatos. Tendo aqui sua base eleitoral, foi: Deputado Provincial, no Império; Deputado Estadual e Constituinte, já na República; Deputado Federal; Vice-Presidente do Estado, tendo assumido a presidência interinamente por duas vêzes; Senador Estadual e Senador da República, casa legislativa esta de que foi Presidente. Aqui se fixou para refazer energias, quando, em 1910, voluntariamente, se retirou da política, tendo fundado e presidido Cia. Força e Luz da Cidade de Patos, que, em 1915, dotou a cidade da primeira usina de energia elétrica.
A Vila de Santo Antônio dos Patos fora elevada a cidade sem que preenchesse os requisitos legais porque aqui residia o Deputado Olegário Maciel e, segundo velho costume vindo de Portugal, a condição de vila era incompatível com a dignidade do cargo. Aqui era eleitor e aqui votou nas eleições de 11/05/1930, que o levaram ao Governo do Estado. E, para orgulho nosso, foi em Patos que, em 06/04/1930, lançou sua plataforma de Candidato à Presidência de Minas. Da plataforma, destacamos um parágrafo que grita à geração contemporânea sua competência e sua visão de Estadista:
“Nas regiões ainda não servidas pela viação férrea, a estrada de rodagem preenche uma função econômica de importância que já é considerável, e será ainda maior com a substituição total ou parcial do combustível importado pelo álcool ou outro sucedâneo nacional”.
O PRESIDENTE OLEGÁRIO MACIEL
Em 07/09/1930, assume o Governo. Quebrando o esquecimento ou modéstia dos patenses, queremos afirmar e proclamar, em honra ao nosso conterrâneo, que, como Presidente de Minas Gerais, por três vezes pelo menos, o Dr. Olegário teve em suas mãos e determinou os rumos da Moderna História do Brasil.
PRIMEIRO MOMENTO
A revolução de 30 teve bases essencialmente civis. Poucos foram os oficiais superiores das forças federais que participaram de sua articulação. Olegário tinha tentado deflagrá-la ainda na gestão de seu antecessor, Antônio Carlos, não encontrando apoio. Foi eleito concomitantemente Presidente de Minas e Senador. Indo ao Rio tomar posse no Senado consuma o pacto revolucionário com o líder gaúcho João Neves da Fontoura. No Governo, visitado pelo emissário gaúcho Lindolfo Collor, ouve deste, com aparente indiferença, a explanação de minuciosos planos revolucionários. Narra o “Jornal da Noite”, de 03/11/1930, rememorando o episódio: “Um pressentimento angustioso varou a alma do gaúcho: – Sr. Presidente, acha que está faltando alguma coisa? E o Sr. Olegário Maciel, seco, em duas palavras: – ESTÁ: O DIA E A HORA… Com efeito, marcaram-se dia e hora. O movimento deveria começar no dia 03 de outubro, às 17:30h, ao mesmo tempo, no Rio Grande do Sul, em Minas Gerais e na Paraíba. Por engano, falhou a Paraíba, onde só começou no dia seguinte, mas, aqui, Olegário Maciel o deflagrou no dia e hora em que os gaúchos também o iniciavam. No Sul, as forças federais não ofereceram maiores resistências, mas, em Minas, as lutas foram encarniçadas. Não obstante, quando um levante militar, na iminência da vitória revolucionária, depõe no Rio de Janeiro o Presidente Washington Luiz, a 24 de outubro (estando as tropas sulistas estacionadas em Ponta Grossa, no Paraná, sob o comando de Getúlio Vargas), as forças comandadas por Olegário Maciel, já haviam rendido, em duras batalhas, todas as unidades federais do Estado, já haviam transposto as divisas da Bahia e alcançado a Capital do Espírito Santo, bem como as cidades fluminenses de Campos e Magé, esta às portas da então Capital da República. Vitoriosa a revolução, uma Junta Militar assume o Poder, chegando a nomear o Ministério, no dia 25. Os gaúchos não acatam a investidura da Junta Militar, ameaçando prosseguir a luta armada. A posição de Minas Gerais seria outra vez decisiva.
SEGUNDO MOMENTO
A Junta Militar, às pressas, manda um emissário secreto a Minas, em busca de apoio à sua permanência no Poder. Infrutiferamente. A liderança civil do velho Olegário Maciel e o espírito de luta dos mineiros eram incontrastáveis. No dia 30 de outubro, o jovem líder civil Getúlio Vargas toma posse como Chefe do Governo Provisório. Depois, este Governo concederia a Olegário Maciel o título de General Honorário, que o povo gaúcho simbolizou na espada de ouro com que o presenteou.
TERCEIRO MOMENTO
Todos os estados brasileiros estavam sob a intervenção federal consagradora da situação de fato criada pelos tenentes que se apoderaram dos governos estaduais durante a Revolução. Menos o nosso, onde Olegário Maciel, incontestável, fazia valer a força e o prestígio implacáveis de seu povo, mantendo a autonomia do Estado, suas prerrogativas constitucionais e o título de Presidente, que só morreu com ele. Pois bem, governava o Presidente Olegário hostilizado, mas respeitado pelo Governo Federal. O tenentismo, em vão, havia tentado derrubá-lo. Em 1932, intensificam-se também os preparativos de um movimento destinado a depor Getúlio Vargas, cujo prestígio estava seriamente abalado. É deflagrada, a 9 de julho, a Revolução Constitucionalista. Bastaria um pouco de ambição pessoal a Olegário Maciel para que ele negociasse seu apoio ao movimento e tivesse à sua mercê a Presidência da República. Dotado, todavia, daquelas virtudes raras de que fala Montaigne – ordem, moderação e constância – não queria ver a Pátria mergulhada numa guerra civil de rumos e consequências imprevisíveis. Olegário Maciel sufoca o núcleo rebelde em Minas. As tropas mineiras marcham em defesa do Governo Federal. Estava selada a sorte da rebelião. Getúlio Vargas é mantido no Poder.
Graves preocupações afligiam o Presidente Olegário quando de sua morte. Seus sublimes ideais nos ficam como imperecível legado. Que tenha eco em nossos corações a frase que o Artista gravou no pedestal do monumento a ele, erguido pelos patenses: “Arrebatar a Pátria às sombras e aos males presentes, para que ela viva na luz e no bem a que tanto tem aspirado”.
E porque não dizer que especialmente os jovens devem-se inspirar em Olegário Maciel e empunhar sua bandeira? Sim, pois ele, no dizer de Gustavo Capanema à beira de sua sepultura: “Conhecia o valor da mocidade e chamou-a a partilhar do seu ideal, da sua orientação e do seu poder”.
JUSTIÇA A OLEGÁRIO MACIEL
Aos poderes públicos municipal e estadual, cujas chefias ele exerceu com insuperável dignidade, deixamos um apelo patense: Que incentivem o estudo da vida e da obra de Olegário Maciel, visando o cumprimento da sentença de Péricles que nos serviu de epígrafe.
Para tal empresa, deixamos as seguintes sugestões: 1.ª – Que, no mês de setembro próximo, em que se comemoram o cinquentenário de sua posse no Governo do Estado e da Revolução de 30, bem como o aniversário de sua morte, seja ele alvo de grandes homenagens, inclusive em sonelidades ao pé do monumento patense, devendo, para uma delas, ser convidado o atual Governador do Estado; 2.ª – Que seja tombada, para que futuramente abrigue um Museu Histórico Regional, sua casa, ao lado daquele monumento; 3.ª – Que a Municipalidade promova anualmente uma Semana de Olegário Maciel, com as mesmas solenidades, aqui e ao pé de seu mausoléu na Capital do Estado; 4.ª – Que, nas escolas deste Município, de todos os níveis, sejam incentivados os estudos e a pesquisa sobre sua vida e sua obra; 5.ª – Que, a nível estadual, seja criado um Centro de Estudos sobre Olegário Maciel, com sede nesta cidade e sob a direção do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Patos de Minas; 6.ª – Que o ano 1983, cinquentenário de sua morte, seja instituído “Ano Municipal e Estadual de Olegário Maciel”, concretizando-se, no correr do mesmo, planos cuja execução demandar maior tempo; 7.ª – Que conste do programa de todas as festas cívicas desta cidade e de todas as visitas oficiais que recebermos a deposição de flores ao pé do monumento patense; 8.ª – Que o povo de Patos de Minas participe de todas sonelidades que se prestarem ao maior de nossos conterrâneos, tanto para homenageá-lo, quanto para, usando legitimamente seu nome como bandeira, fazer chegar aos poderes públicos nossas justas reivindicações; 9.ª – Que, mediante ato legislativo competente, seja Olegário Maciel proclamado Patrono de Patos de Minas (Não há sequer notícia de que, em algum tempo, ainda que post mortem, lhe tenha sido conferido o título de cidadão honorário, aliás e a bem da verdade, supérfluo em seu caso); 10.ª – Que se instituam prêmios e menções honrosas para trabalhos sobre a vida e a obra de Olegário Maciel, contemplando-se separadamente os que se elaborarem aqui e alhures; 11.ª – Que se reivindique a imediata instalação, em Patos de Minas, de cursos técnicos agrícolas e agro-industriais, recrudescendo-se a luta pela criação de nossa Universidade, que deverá ter o nome de Olegário Maciel; 12.ª – Que a Municipalidade crie a Ordem Honorífica de Olegário Maciel para condecorar os grandes benfeitores do Município, mediante a aprovação de uma Comissão, que adotará rígidos critérios a fim de não se desvalorizar a condecoração pelo abuso.
* Fonte: Texto de Dílson Abel Pacheco publicado com o título “1983 – Ano de Olegário Maciel” e os subtítulos “Olegário Maciel” e “Um Patense que foi Líder Civil da Pátria” no n.º 62 da revista A Debulha de 31 de janeiro de 1983, do arquivo do Laboratório de História do Unipam.
* Foto 1: Capa da referida edição de A Debulha, desenho de Amelinha.
* Foto 2: Do livro Domínio de Pecuários e Enxadachins, de Geraldo Fonseca.