A oficialização do ensino em Patos de Minas data de 1853, ocasião em que é criada a primeira “cadeira de instrução primária” tendo como primeiro professor Francisco de Paula e Souza Bretas, nomeado em 13 de maio de 1853, permanecendo no cargo até 1857, ano em que, devido a interesses políticos locais, pede demissão.
No que se refere à instrução, o governo enfrentou sérios problemas, pois era muito difícil achar professores disponíveis ou devidamente habilitados para ensinar em lugares distantes e em vilas de maior importância. Além disso, constituiu problema de maior dimensão a falta das cadeiras para o sexo feminino. Apesar das dificuldades, a nomeação da primeira mestra, Maria Madalena de Negreiros Maciel, ocorreu em 1868.
Em 1912, Patos contava com quatro escolas, sendo 3 do sexo masculino e 1 de ambos os sexos. Nas 3 primeiras, estudavam 154 alunos. Na escola mista, 36 alunos e 11 alunas. Na mesma época funcionavam 4 escolas particulares, sendo 2 do sexo masculino com 31 alunos, 1 do feminino com 23 alunas, e 1 mista com 39 alunos e 24 alunas. O recenseamento de 1920 apurou 1.088 mulheres sabendo ler e escrever na sede do município.
Representando um grande avanço no campo educacional e apresentando‐se como imponente elemento do progresso em Patos de Minas, o Grupo Escolar Marcolino de Barros é instalado em 04 de junho de 1917, tendo como diretor o professor Modesto de Mello Ribeiro. Paulatinamente, o cenário educacional de Patos de Minas começa a firmar‐se como palco de manifestações culturais que anunciavam paradigma de conduta e posturas individuais em nome da harmonia coletiva, tão almejada pelos benfeitores de Patos; incansáveis “guardiões do progresso” que tomam para si a missão de guiar o povo para a edificação da cidade civilizada. Ideia essa, amalgamada pelos princípios da moral e dos bons costumes.
A elite, tomando para si os “louros” do progresso da cidade, conduzia o povo rumo à modernidade, por meio da disciplinarização, articulando mecanismos de controle com o intuito de moralizar a mesma, fazendo com que o povo assimilasse suas ideias sentindo‐se como parte constitutiva e indispensável do processo de modernização. Vários fatores são utilizados para disseminar a ideia de progresso; fatores esses que atingem muito a vida cotidiana e o imaginário das pessoas. Isto posto, surge em Patos de Minas, da elite para as elites, a imprensa, processo que não poderia ser diferente, uma vez que o povo não tinha instrução para encabeçar a criação de um evento de tamanha magnitude, tarefa atribuída a homens letrados, como foi o caso de Antônio Nogueira de Almeida Coelho e Fortunato Pinto da Cunha, que criaram o primeiro jornal de Patos de Minas, O Trabalho, lançando o primeiro número em 15 de agosto de 1905.
Surgem então os jornais que, apesar de não circularem regularmente, reclamam para si a responsabilidade de propagar e exaltar valores e normas de conduta que, não raro, estavam em conformidade com as representações vigentes da ordem e do progresso. Neste sentido, a imprensa passa a simbolizar mais do que a informação, e por ser portadora da verdade, apresenta‐se altiva e inquestionável aos olhos do povo, como demonstram as palavras do Dr. Antônio Nogueira:
Nestas colunas nunca tal permitimos, nem permitiríamos, pois compreendemos a imprensa como a luz serena e imperturbável que com seus raios tranquilos nos apontam o caminho do bem, pois quer a Liberdade; da razão, pois quer a Justiça; do coraçãopois, quer a Dignidade, do benefício de todos nós, pois tem por fim problemas a se resolverem, princípios a se discutirem, fins a colimarem, todos tendendo o benefício comum (“O Trabalho”, n.º 36 – 15/08/19).
Dessa forma, a Imprensa segue produzindo e cristalizando no seu interior valores e personagens, ditando regras de bem viver, exaltando a necessidade de se combater valores que ameacem a ordem social vigente, bem como as representações que por ventura possam desmistificar os ideais que apontam para o progresso.
Os jornais, mediante os seus artigos, enalteciam a educação como elemento de instrumentalização que lançaria as novas bases de sustentação para a configuração de uma sociedade democrática, viabilizando a construção da grande nação brasileira, como podemos observar neste texto publicado no jornal O Riso em 19 de junho de 1915:
A Eschola é um sagrado templo, onde se prepara o destino de um povo. A felicidade ou infelicidade de um paiz, deve‐se á boa ou má educação do seu povo, e uma ou outra dimana da eschola. O progresso humano, sob os seus varios aspectos, tem na eschola suas raizes, que dão a grande arvore, sob cuja copa cada um de nós descansar dos horrores desta vida, buscando conforto e coragem para arrostar todas as difficuldades contra a ignorancia. Espalhae escholas, disseminando uma bôa e san educação, que veremos feliz o povo que as tiver. Não tenha escholas um povo, que vel‐o‐emos praticando todos os vicios, cego a se perder pela escuridão das trevas da ignorância.
Existia, por parte da imprensa, uma verdadeira campanha no sentido de consubstanciar na cidade a instalação do grupo escolar em decorrência da reforma do ensino primário. É importante ressaltar que esses grupos iriam configurar‐se como principal elemento propagador dos ideais republicanos, que via na instrução pública o melhor caminho para legitimar seus preceitos, fazendo emergir uma nova sociedade, calcada nos princípios da ordem e do progresso. Outro momento registrado com ênfase pelos jornais foi o empenho dos “representantes do povo” na luta pela construção do grupo escolar, que iria preparar e instruir convenientemente o povo patense rumo ao desenvolvimento, renovando, assim, a sociedade dentro da ordem.
O grupo Escolar Marcolino de Barros se tornara, finalmente, parte do cenário da cidade. O sonho republicano dos benfeitores patenses se materializara. O povo agora se desdobrava em comemorações cívicas e fervorosos discursos ecoavam pela cidade, exaltando o símbolo da modernidade e do progresso. A elite republicana erguia, na cidade, seu principal reduto, e, embalados pela euforia do povo patense, os jornais anunciavam o grande acontecimento com louvor. O empenho dos articulistas dos jornais em exaltar a importância da educação é reafirmado em seus artigos. Oportunamente, conclamavam suas esperanças no progresso anunciado, via instrução, e apelavam para todos os patenses, convidando‐os a fazerem parte da grande marcha educacional, privilegiando, para tanto, os estabelecimentos de ensino. As comemorações eram permeadas pelos ideais de civilidade da ordem e do progresso, sendo assim transformados em grandes e fervorosos espetáculos oferecidos pela população que, enaltecida, desfilava pela cidade aclamando a Pátria e abrilhantando os grandes acontecimentos. Nesse sentido, a Semana da Pátria era uma das principais datas festejadas, pois consubstanciava as ideias de nacionalismo e amor à pátria, verdadeiros ícones do ideal republicano.
Os jornais também elucidavam as ideias educacionais vinculadas ao positivismo, elemento dinamogênico essencial aos preceitos do novo regime, como diz O Trabalho em sua edição de 27 de agosto de 1905:
A instrucção é a base do progresso; sem ella que desenvolve as faculdades pensantes de cada individuo ou cellula social; sem ella que faz o cidadão comprehender os misteres da vida e os deveres para com a sociedade; sem ella, enfim, que reveste o homem dos poderes para lucta quotidiana pelo viver, é impossível avaliar‐se o benefício e prosperidade que possa trazer à nossa Pátria.
Ante essas breves análises acima (re)construídas, julgamos importante ressaltar que todas as estratégias usadas no período republicano eram ações planejadas; ações essas que objetivavam penetrar no imaginário popular, incutindo no povo um conjunto de representações que legitimavam valores republicanos, que criasse uma unidade nacional em prol de uma nação desenvolvida, aos moldes dos grandes países rumo ao progresso. Essas estratégias eram, portanto, mais um instrumento de doutrinação cívica.
Portanto, vê‐se que a análise do período proposto oferece a compreensão do ideário da elite dirigente do país. Com a implantação do Regime Republicano, ela tomou para si a responsabilidade de alcançar a passos largos o progresso da nação, usando como elementos de sustentação os princípios liberais de democracia e cidadania e os preceitos harmônicos do positivismo. Esses elementos iriam contribuir para disseminação dos ideais de civilidade e da ordem e progresso por todo o país.
Para atingir seus objetivos, esse segmento social precisa que os governantes reestruturassem a sociedade aos moldes do novo regime. Para tanto, deveriam criar um novo homem que em consonância com o novo tempo, contribuiria de maneira efetiva para a constituição de uma nação. Nesse sentido, o regime republicano fez da educação o instrumento ideal para amalgamar as massas, recrutando o povo, via instrução para a grande marcha em prol de desenvolvimento do país. Este processo deveria propiciar o ajustamento social do indivíduo que, inserido em uma sociedade que buscava a ordem e o progresso, não poderia destoar da estampa harmônica que ilustrava a nação, sob pena de transformar‐se em um grande mal, que deveria ser extirpado da sociedade, para não comprometer a harmonia vigente.
Entretanto, para que estas concepções educativas penetrassem no imaginário das pessoas e se transformasse em um corpus social, era necessária sua disseminação. Dessa forma, a imprensa apresenta‐se como principal elemento propagador dos ideais republicanos. Nesse sentido, o pensamento divulgado pela imprensa patense ia de encontro aos setores dominantes nacionais, ao divulgar a necessidade de criação de escolas na região, enfatizando com caráter de urgência, a importância da instrução para o progresso da nação e chamando o povo para participar da condução do país em direção à modernidade. Por fim, é preciso ressaltar que a imprensa reflete o pensamento de uma época e veicula, quase de maneira palpável, o ideário dos grupos governantes.
* Fonte: “Educação e Imprensa em Palcos Republicanos: Análise de jornais de Patos de Minas-MG (1889-1930)”, de Márcia Helena Rodrigues de Matos (Mestre em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia) e Humberto Aparecido de Oliveira Guido (Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas. Professor associado do Departamentode Filosofia da Universidade Federal de Uberlândia).
* Foto 1: Primeira página do primeiro número do jornal O Trabalho, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto 2: Grupo Marcolino de Barros, do arquivo da Fundação Casa da Cultura do Milho.