SOBRE O I SEMINÁRIO MUNICIPAL DA CULTURA

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Ufanismo tolo e falso tomar Patos como locus desvairado de efervescência cultural. Outra coisa é a gênese do espernear conseqüente. Mas há agito e agito. Ambos presentes no I Seminário Municipal da Cultura, sob os auspícios da municipalidade e organização da Casa da Cultura. Significativo em dois tempos: expressão histórica da necessidade e desejabilidade social de uma política cultural coerente por parte da administração pública. E abertura tardia do primeiro grande debate acerca da problemática cultural local e nacional no âmbito das atividades militantes da Casa da Cultura e doutros (grupos, entidades, autoridades, intelectuais, etc.).

Deixemos de lado a impropriedade de um “seminário” para um encontro cujo principal objetivo formal era fazer emergir o espaço dialógico em torno de um momento cultural que nos compreende mais que o revés. E não se esqueçam que exprimo impressão pessoal, confusa, xereta mas sincera. Depois, principalmente aos amigos não devemos fazer concessões demagógicas.

O ponto alto de todo encontro assim é sempre o próprio ato de reflexão coletiva pelo qual, em mutirão, se amplia a visão do horizonte histórico e o campo de visibilidade crítica da realidade, composta, de imediato, por um qüiprocó de fatores, atividades, eventos, verdades, e falseamentos perturbadores. Então a inteligência nos dá seu recado em favor de uma praxis renovada. Por isso rendo aqui homenagens ao sub-grupo de debates do qual participei. Arranhamos importantes temas.

Por exemplo. Pensamos que os grupos e instituições artístico-culturais preocupadas com o folclore e com aquilo que se poderá denominar cultura popular precisa trazer a luz o entendimento e a mecânica das profundas mudanças que vêm se processando no campo em nossa região, quando a penetração decisiva do capital na agricultura, acompanhada das transformações na estrutura fundiária e nas relações sociais de trabalho, provocam verdadeira desestruturação do universo simbólico do homem do campo. Qual o futuro próximo das folias de reis? O que significa a autenticidade cultural de um grupo? Como respeitar essas práticas: O que tem a ver os mídia eletrônicos (TV, rádio, etc.) e a cibernética com isso e com a democratização?

Outro papo importante que aconteceu foi sobre a relação Educação/Cultura. Sendo a língua o instrumento vital para a produção e reprodução cultural, não valeria pensar, com o mestre Antônio Houaiss, que o problema da cultura hoje é o próprio problema educacional, caminho para superação do baixíssimo domínio do vernáculo?

A associação dos mutuários aqui! Mas o que tem o BNH a ver com cultura, meu Deus do céu?! Mas tem. E aí percebemos que o direito à dignidade indica morada que indica democracia econômica que indica socialização da democracia com valor universal.

A dica maior de nosso sub-grupo para aquele “encontrão” foi que temos muitos toques a dar em comum nesse acender das luzes para a vivência cultural consciente. Mais buscamos vetores de direção do que propomos um rol de projetos certeiros desarticulados com prioridades realistas e com o potencial do Estado; quase sempre supervalorizando-se erroneamente a própria responsabilidade de uma administração municipal simplesmente atacada de raquitismo pela União.

“Cuidado para não passar o carro na frente dos bois”. Os provérbios não existem em vão. Sirvo-me desse aí para ilustrar o ponto baixo do Seminário. Certa feita, Delfim disse “matemática é fácil, difícil mesmo é a economia”. Meias verdades! Difícil mesmo é política. Mais ainda é agir democraticamente. Provavelmente bons juristas e até bons políticos irão participar do poder constituinte em 86. Mas isso não garante a superação da hipocrisia formal da constituição vigente.

Já o ensinava Gramsci que a racionalidade quantitativa da votação não significa democracia e muito menos expressa fidedignamente um verdadeiro embate público. Foi preciso que o prefeito nos dissesse, a seu modo, exatamente isso em sua participação no Seminário, diga-se reafirmando a atitude firme e liberal de seu governo para com a coisa pública.

Penso que o astral do Seminário caiu muito quando se procurou retirar do encontro uma carta contendo uma lista de propostas votadas uma a uma. Propostas a quem, até agora não entendi (infelizmente não foram balanceadas devidamente as boas idéias de um participante naquele momento, o Comini). A primeira proposta em votação por exemplo, indicava a velha bobagem de antepor estatutos e orientação regimental à própria praxis grupal, coisa típica, aliás, durante esses anos todos de Casa da Cultura, marcados pela seqüência de sinucas entre a falta de humildade e incompetência e a inquietação revolucionária que toma a cultura como imperativo categórico pro-democratização.

Enfim, interessa pouco aqui demonstrar negativamente o documento oficial que saiu do Seminário. Parece mais se dar corda ao próprio ato de debater, pois constata-se que tem muita gente a fim de caminhar lado a lado nessa jornada historial de todo dia. Vem aí o Encontrão trazendo novas esperanças. Até quando?

* Fonte: Texto de Bráulio Porto publicado com o título “O Seminário e a Casa de Espetáculos” e subtítulo “Ao Marcinho, Bastião da Boa Vontade” na edição n.º 116 de 31 de maio de 1985 da revista A Debulha, do arquivo de Eitel Teixeira Dannemann, doação de João Marcos Pacheco.

* Foto: pmpf.rs.gov.br, meramente ilustrativa.

* Edição: Eitel Teixeira Dannemann.

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