TEXTO: JORNAL O COMMERCIO (1913)
Si é certo que a nossa cidade vai trilhando para um futuro de progressos materiaes, tambem o lado moral deve ser tratado com carinhosa dedicação. Habitos inveterados fazem com que faltas graves appareçam no scenario social como factos licitos, acceitaveis.
Dentre esses factos, destacam-se certos abusos e illegalidades que precisam de remedio efficaz por parte das auctoridades competentes, que no seio da sociedade têm a nobilitante missão de garantir a ordem, a paz e a tranquillidade na communhão social. Referimo-nos ás condescendencias abusivas e illegalidades predominantes no departamento criminal desta comarca, estando longe de nós censurar a individualidades, pois fallamos em these, deante da verdade dos factos que vêm abrangendo um longo periodo de tempo.
No departamento criminal da Comarca de Patos, a posição de um delinquente pronunciado ou sentenciado, pouco differe da de um homem livre, deante da ostentação abusiva e criminosa com que são calcadas as mais comesinhas normas impostas pela lei penal.
De certo tempo a esta parte, não temos cadeia¹, servindo o quartel policial de prisão. Ha mais de um anno, lá se apresentam “para se livrarem”. O que jà tivemos occasião de observar é simplesmente vergonhoso: o quartel transformado em casa de pandegas e os presos (mesmo condemnados) tém andado pelas ruas, tém sido contractados para serviços fóra da cidade por qualquer pessôa que d’êlles tém precisado.
Uns têm andado armados e outros dormindo em suas próprias casas!
“Falta de cadeia, o xadrez é pequeno e as obras da cadeia nova parecem que só d’aqui a muito tempo, serão concluídas”, dizem alguns. Não é tanto assim: è verdade que a cadeia está fazendo grande e sensível falta; mas, ha espaço sufficiente no quartel para não se permittirem presos pelas ruas e atè commettendo delictos. Em havendo força, sejam remettidos para as cadeias das cidades visinhas, como é de praxe. Mas, o mal vem de habitos antigos e repetidos. Quando existia a antiga cadeia, nos commodos superiores do predio, havia jogos e até visitas de amasias prezos là recebiam, o que não é para se admirar, porque um comandante do destacamento policial ostensivamente, quando o Jury funccionava no velho predio do forum, ficava qual sultão da Turquia, em patuscadas no quartel, com meretrizes! Este jornal, ha mais de dous annos, censurou certos abusos, citando casos de presos sentenciados, bebados, pelas ruas e lojas da cidade².
Um escrivão foi certa vez entregar copia do libelo, si bem nos lembramos, a um preso e teve de esperar bastante tempo, porque o preso (?) estava na roça!
Fugas de presos se repetem frequentemente aqui, sendo isso, cousa banal em Patos. Muitos criminosos condemnados a grandes penas, têm fugido desta cidade, desta cidade e não da cadeia, e isso é tido como acontecimento sem importancia alguma. Bom exemplo para os guardas de prisão que não tiveram algum escrupulo.
Quando se dão fuga de presos, em qualquer outra parte, lemos nos jornaes que o carcereiro foi detido, que a sentinella foi presa, que se abriu inquerito, etc.
Não individualisamos censuras, fallamos em these, pois não è de agora que se observam esses tristes factos nesta cidade. Propugnamos pelo bem, pelo progresso moral de Patos e unicamente e exclusivamente com essa intenção. Ha bem pouco tempo, o juiz executor de sentença que condemnou um individuo a sete mezes de prisão ao receber os autos para providenciar sobre a soltura do réo, soube que este não estivera preso: andava armado pelas ruas e retirava-se para longe da cidade. Pedio informação ao carcereiro; o réo ao saber d’isso, fugio. Ora, sem a punição merecida as leis de nada valem, são formulas sem valor a lei nenhuma garantia poderá offerecer á sociedade, em taes condições.
* 1: Leia “Cadeias”, “Inauguração da Antiga Cadeia Pública: Revisão da Data”.
* 2: Leia “Vida boa dos presos em 1909”.
* Fonte: Texto publicado com o título “Pelo Bem” na edição de 30 de novembro de 1913 do jornal O Commercio, do arquivo da Hemeroteca Digital do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, via Altamir Fernandes.
* Foto: Primeiro parágrafo do texto original.