TEXTO: JORNAL O COMMERCIO (1911)
A sós, nas ruas desta Cidade, vagueião, de ha muito, diversos criminosos sentenciados e recolhidos á Cadêa deste lugar.
Entre eles ha assassinos vulgares, uns; fatricidas outros, e outros… ignoro quaes os seus crimes.
Alguns, diariamente, p’uma fuga de 10 horas, de sol a sol, fasem feria regular trabalhando para particulares e conseguindo mesmo reunir soffrivel peculio que, seja dito de passagem, de muito lhes serve e eu não condemno, uma vez que tamanha liberalidade lhes é concedida pelos executores da sentença emanada do tribunal julgador; o que, entretanto, não posso calar è, a liberdade maxima que álguns é concedida, chegando ao ponto de se apresentar em publico, em casas commerciaes, em dias de festa e, portanto, de agglomeração de gente, um sentenciado pelo Jury − em estado de embriaguez e só e vir ainda contar bravatas, expôr seus mundos e fundos e amolar a sociedade que o segregou de seu seio, mas que tem de supportal-o dada a facilidade, a transigencia na Lei e mesmo o abuso de poder de quem autorisa, faz ou manda fazer semelhante arbitrariedade!…
Si a Cadêa de Patos é, como nestas columnas tenho dito, um pardieiro immundo, prestes a desabar-se, que não póde abrigar os condemnados pelo Jury desta Cidade, removão-se os mesmos para qualquer Cadêa de outro logar, para uma Penitenciaria que possa acolhel-os mas não se abrão as portas de um carcere a criminosos que a segurança publica, a sociedade, a moral e a justiça exigem fiquem reclusos.
Qual o resultado futuro de semelhante relaxamento dos gonzos de nossas enxovias?
O futuro dirá que è o seguinte: Criminosos que aqui cumprem pena, findo o tempo de sua condemnação, voltão ao seio de suas familias mais viciados e mais perversos do que quando de lá forão arrancados pela Justiça Publica; e, pouco tempo depois, sentindo saudades da vida de flôres dos presos na Cadêa, voltão novamente, apòs segundo e mesmo terceiro delicto quando, sua vida viciada, perigosa e affrontante não obrigar a cidadãos honestos e de bem a perpetrarem um crime atirando-os na valla commum dos infelises assassinados.
O que nos aguarda no futuro será a consequencia logica do que presenciamos no presente.
E’ facto o que venho de expôr?
E’ uma verdade a falta que venho de apontar?
Si o é, como attesta a nossa sociedade em peso, que se cohiba tão arbitraria condescendencia, que se profligue tão revoltante abuso!
Até aqui fallou Zé Ninguem, o rabiscador destas linhas; agora vai fallar o cidadão, o particular, o amigo destes desgraçados que a sorte atirou na estrada do infortunio, na vereda do crime até que a Justiça os enclausurasse em nossa Cadêa.
Attentas as circunstancias em que se acha nossa Cadêa, de caridade è que, de quando em quando, diariamente mesmo, aos nossos presos seja concedida a liberdade de se conservarem fóra do carcere, porém no pateo ou immediações da Cadêa, sob ás vistas vigilantes do destacamento local. Que se lhes faculte uma volta pela Cidade devidamente acompanhados dos guardas competentes… transeat; o conrartio (contrário), porém, soltal-os ao Deus dará, é que a sociedade não quer e o mais humanitario coração não pode exigir, nem mesmo o do
Zé Ninguém.
1911 − 2 − III.
* Fonte: Texto publicado sem título na coluna Usos e Abusos VI na edição de 02 de abril, do arquivo da Hemeroteca Digital do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, via Altamir Fernandes.
* Foto: Início do texto original.