JUVENAL E FILOMENA − PARTE 3/3

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– Juvenal, você acaba de se dar mal e já está pensando em aprontar outra pra ela?

– Entenda uma coisa, amigo, a mulher está uma fera comigo. Se eu não fizer alguma coisa, meu inferno astral dentro desta casa vai aumentar.

– Juvenal, se sua vida é esse inferno astral, já passou pela sua cabeça se separar?

– Um monte de vezes, amigo. As oportunidades se apresentaram e eu não tive coragem de largá-la. Agora, com três filhos, é difícil.

– Sei não, posso estar errado, mas esse negócio de filho não segura casamento.

– É, mas eu não teria coragem de sair de casa agora e morar longe de meus filhos. O que eu preciso é me impor à Filomena. Por isso, caro amigo, tive uma ideia brilhante. Coragem, amigo, esta é a palavra chave.

– Coragem é a palavra chave, né? Pois é justamente isso que falta a você. Tem dó, Juvenal, você caga de medo da mulher e vem me falar em coragem?

– Presta atenção, Marcelo, o negócio é o seguinte: vou simular um assalto e…

– Como é que é? Simular um assalto? Você pirou de vez.

– Peraí, Marcelo, deixa eu terminar. Vou chamar a Filomena para darmos uma caminhada, como estamos fazendo agora. Aí, de repente, aparece um cara armado para nos assaltar. Num gesto de muita coragem, eu enfrento o cara, que sai correndo. A Filomena vai ficar bestificada com a minha coragem e vai cair nos meus braços. Tenho certeza de que depois disso ela nunca mais vai me dar ordens. Simples, não?

– Pena que aqui em Patos de Minas não tenha sanatório.

– Uai, pra que?

– Pra te internar imediatamente.

– Ora, pare de brincadeira, Marcelo.

– Pare de brincadeira digo eu. Ficou louco, rapaz? Onde já se viu simular um assalto para provar macheza para a mulher? Sei não, estou precisando parar de andar contigo, sabe-se lá se loucura pega.

– Marcelo, você é ou não é meu amigo? Se é…

– Sou muito seu amigo, por isso estou dizendo que você ficou louco. Sou tanto seu amigo que te ajudei na armação da quermesse. E no que deu? Todo mundo vendo sua mulher de bunda de fora. E no que deu? Todo mundo vendo a calçola da tua mulher. E agora vem você com essa de simular um assalto e ainda por cima imaginando minha ajuda. Tô fora!

– Pode ficar tranquilo, Marcelo, nessa você não vai participar diretamente.

– Como assim não vou participar diretamente?

– Eu preciso que você…

– Num vem, Juvenal, não vou fazer nada. Você está é pronto para cometer outra loucura.

– Pode até ser outra loucura, mas vou fazer. Marcelo, se eu não arrumar um jeito de mostrar à Filomena que sou corajoso, mesmo que sendo armação, eu vou sofrer muito nas mãos dela.

– Poxa, cara, separa logo e fique livre disso tudo.

– Já disse que isso não vou fazer agora, principalmente por causa da Rosinha.

– Então quer dizer que não tem jeito, você mais mesmo fazer esta doidice?

– Já me decidi.

– E quem vai ser o ator para representar o papel do bandido?

– Aí é que entra você para me ajudar. Precisa ser alguém que eu e a Filomena não conhecemos, como um de seus primos lá do Leal. A sua ajuda será justamente arranjar a pessoa para fazer o serviço, só isso.

– Juvenal, você acha que algum primo meu do Leal vai querer fazer um troço desse?

– É só fingir, só isso, trem fácil demais da conta.

– É, não tem jeito, mas não conte comigo.

– Peraí, Marcelo, cadê o meu grande amigo?

– O seu grande amigo está tirando o time. Tchau!

– Peraí, Marcelo, não faça essa sacanagem comigo. Eu te prometo por tudo quanto é mais sagrado nesse mundo que é a última armação que vou aprontar pra cima da Filomena.

– Mas num vou mesmo.

– Marcelo, Marcelo, por favor, você é meu melhor amigo, só mais essa vez, vai.

– Santa misericórdia!

– Por favor, amigão, só mais essa vez.

– Juvenal, faz um favorzinho para mim?

– O que você quiser.

– Me interna agorinha mesmo numa cela do Satirão.

– Sem brincadeiras, Marcelo. Vamos, diga que vai me ajudar, diga, por favor.

– Tá bom, tá bom, mas preste muita atenção, meu caro Juvenal, é a última vez que faço uma coisa dessas pra você, ouviu bem? Nunca mais me peça para te ajudar nessas tuas doidices. Está muito bem claro?

– Claríssimo, amigão. Vem cá…

– Para com isso, Juvenal, sem agarramento, por favor.

Mesmo não concordando com a maluquice do amigo, Marcelo foi até o Leal e convenceu um de seus primos a representar o papel de assaltante. A trama seria simples. Juvenal e Filomena iriam dar uma caminhada. De repente, surge o bandido com uma arma – obviamente de brinquedo, é claro, mas daquelas bem convincentes que parecem de verdade – e anuncia o assalto. Filomena, desesperada, cai em prantos enquanto o heroico marido parte para cima do bandido. Enquanto lutam, um tiro é disparado – obviamente, o revólver de brinquedo é daqueles que dá tiros de espoleta bem convincentes – e o assaltante sai em disparada fugindo da estupenda reação de Juvenal. Aí então, Filomena cai nos braços do marido, tremendo que nem vara verde, dizendo: − Meu Juvenal, você me salvou, você é um herói, meu homem, que coragem. Bem, a partir do acontecimento, tudo mudará na vida de Juvenal. Filomena enxergará que tem um verdadeiro homem dentro de casa, e viverão felizes para sempre, com ele, Juvenal, passando a dar as ordens em casa.

Manhã seguinte após a trama. Marcelo chega até a casa do amigo na Rua Duque de Caxias e encontra a filha Rosalva aguando o jardim.

– Bom dia, Rosalva. Uai, você não foi à escola?

– Fui não, seu Marcelo, é que o papai tá doente e…

– Uai, o que houve?

– Seu Marcelo, o papai quase morreu ontem à noite. Ele foi assaltado quando estava…

– Assaltado? Meu Deus do céu, cadê ele?

– Está lá no quarto.

Assustado, Marcelo adentra ao quarto do casal.

– Santa misericórdia, o que aconteceu contigo, homem?

– Marcelo do céu, que sufoco eu e o meu amorzinho passamos ontem. Mas esse homem aqui botou o bandido pra correr que você precisava ver.

– Mas, Filomena, o que aconteceu?

– O Juvenal vai te contar. Amorzinho, enquanto você conversa com o Marcelo vou preparar um chazinho de camomila, viu?

– Pô, Marcelo, que negócio é esse que você me aprontou?

– Mas Juvenal, eu…

– Esse seu primo é doido, sô, ele usou um revolver de verdade.

– Juvenal, eu…

– Olha aqui, depois que eu me recuperar vou lá falar umas poucas e boas para ele. Onde já se viu…

– Mas Juvenal, presta….

– Cara, ele atirou de verdade, onde já se viu isso? Eu poderia ter morrido. Esse cara vai ver só.

– Juvenal, Juvenal.

– O que é que foi, por que você está tão nervoso assim? Eu é que tenho motivo para ficar…

– Mas Juvenal…

– O que é, Marcelo, desembucha logo.

– Juvenal, minha Nossa Senhora da Abadia, o meu primo…

– Pô, Marcelo, aquele fdp não poderia ter usado revolver de verdade.

– Cala a boca, Juvenal, deixa eu falar. Eu vim me desculpar em nome do meu primo porque um contratempo o impediu de vir e ele mandou avisar que hoje è noite vem e…

– Como é que é?

– É isso, amigo, meu primo não veio.

– Seu primo não veio? Quer dizer então que o cara era assaltante mesmo? Ah!, minha nossa, oooooohhhhhhhhhhhh….

– Filomena, Filomena, Filomena, chame depressa o doutor que o Juvenal desmaiou.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Materiaincognita.com.br, meramente ilustrativa.

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