Nasceu em Bom Despacho, Municipio de Pitanguy, Minas, a tres de Fevereiro de 1831; era filho do capitão de ordenanças Antonio Dias Maciel e de D. Maria Rosa da Silva Capanema; o primeiro oriundo de velho tronco paulista que, como outros, emittiu um ramo a fructificar nas paragens auriferas de Minas; a ultima, filha do velho Capanema, portuguez, provinha, d’outro lado, da mesma raça audaz, que viera desbravar o Pitanguy.
Orphão de pae desde 1940, viu-se logo na necessidade de lutar pela vida; aprendidas as primeiras lettras em sua terra natal, ahi mesmo empregou-se no commercio.
Mas cedendo ás sollicitações de sua natural inclinação, seguiu, aos 17 annos de idade, para Pitanguy, ahi se matriculando no Collegio Zacarias Fernandes da Silva.
Cursou, com esmero, o latim, o francez, a philosophia e outras materias.
Em 1856, submetteu-se a exames perante o Visitador das aulas da Parochia de Pitanguy, obtendo diploma de habilitação para ensinar particularmente aquellas materias; por esse modo apparelhado, fundou em sua terra natal um curso particular das referidas disciplinas, contribuindo valiosamente para a instrucção da mocidade de sua terra patria.
Em 1857, em companhia de seu irmão, Coronel Antonio Dias Maciel, mudou-se para esta cidade, então simples arraial de Santo Antonio dos Patos.
Exerceu aqui e na visinha cidade do Patrocinio, o comercio.
Em 1871, abriu uma pharmacia, depois de haver legalmente habilitado.
Casou-se em 1872, com D. Ethelvina Maciel.
Já desde 1861 apparecera na arena publica; mas de 1875 em deante a sua vida foi toda absorvida por encargos publicos.
Foi, successiva e as vezes accumuladamente, vereador, delegado de policia, juiz, presidente da Camara no antigo regimem, autoridade escolar, collector de rendas publicas de Patos, Carmo do Paranahyba e do Paracatu, agente executivo municipal e presidente da Camara municipal no regimen republicano.
Morreu a 13 de agosto de 1906, com quasi setenta e seis annos de idade.
Já de industria escorçamos ahi simplesmente a sua vida. Vê-se que exerceu suas actividades em vasta zona de Minas.
Posto em destaque pelos conterraneos, foi distinguido pela confiança dos governos; cercou-se de acatamento e conquistou sympathias em toda a parte que percorreu.
Só entrou para actividade publica quando já era homem feito á experiencia e já constituira um peculio proprio.
Sua actividade, como particular e como homem publico, foi múltipla, extensa e fecunda.
Physicamente robusto, era lhano, franco e cavalheiroso.
Dotado de memoria notavel, de intelligencia viva, de caracter recto e singularmente puro, possuía abundante cultura mental para seu tempo e para seu meio.
Exerceu, pois, naturalmente, entre conterraneos e amigos, o poderoso ascendente desses predicados e foi o elemento preexcellente e indispensavel , com que poude contar a todo instante, no engrandecer este logar, o seu irmão Antonio Dias Maciel, a quem couberam as qualidades activas e combatentes da familia.
Filiados ambos ao partido liberal, irmanados tanto pelo sangue como pela communidade do sentir e do querer, deram-se as mãos e, mutualmente se auxiliando, completaram-se numa unidade forte, que fundou aqui o predomínio das idéas liberais e fomentou o progresso local. Não houve aqui, até hoje um só emprehendimento notavel a que não se ligassem os seus nomes.
Quando para aqui se internaram, em 1857, esta cidade não era senão um pobre e pequenissimo arraial, ainda pertencente ao municipio do Patrocinio. Desde logo, porem, se fez valer, na Camara municipal, aonde enviou a Jeronymo Dias Maciel, e do prestigio e orientação com que se houve, dão ainda testemunho os seus velhos correligionários.
Na sociedade, emtanto, como nos organismos vivos, o ponto em que se ajuntam elementos de vitalidade, centraliza uma cellula, que se destaca e vae viver áparte; o então districto de Patos, rico de culturas e pastagens, extenso e povoado, queria viver separadamente.
Dessa aspiração se fizeram orgams os irmãos citados.
Para conseguir esse geral desideratum, Jeronymo Dias Maciel, de sua parte não poupou esforços; tomando parte activa em sua realisação, poz em acção o seu proprio prestigio deante de correligionarios e amigos.
A Lei mineira n.º 1291 de 30 de outubro de 1866, elevando á cathegoria de villa o antigo arraial de Patos, satisfez os seus intuitos. E, preenchidas as condições legaes, installou-se a nova villa em 19¹ de fevereiro de 1868, governando a então provincia o Sr. Dr. Elias Pinto de Carvalho.
Jeronymo Dias Maciel foi o primeiro presidente da nova municipalidade.
Por occasião da posse da villa, pronunciou um discurso que, por conter parte das ideias politicas que professava e exprimir os largos votos, que já então fazia pelo progresso deste logar, trasladamos para aqui. Eil-o:
“Srs. Vereadores.
Somos os eleitos do povo e os nossos concidadãos acabão de assistir ao juramento que prestamos. Esse acto solemne constitue a posse deste novo Municipio, e, essa posse constitue a instalação desta nova Villa.
O mandato directo do povo é um objecto de não pequena consideração e os seus mandatarios tomão em seus hombros, posto que honrosa, difficil tarefa!
Porque alem de formularem as Leis Municipaes que immediatas lhe dizem respeito, têm de representar os seus interesses perante os altos poderes do Estado.
Consideremos a nossa missão: ella é nobre, ella é grandiosa por ter sua origem na nossa Constituição, e, comquanto a Lei de 1.º de Outubro de 1828 tenha considerado a Camara − corporação meramente administrativa − comtudo representa o Municipio.
Vamos luctar com difficuldades que soem apparecer nas novas Villas, e attendendo os interesses particulares dos nossos Municipes, devemos harmonizar do melhor modo possivel a receita e as despezas, procurando, no lançar nossos impostos, aquelles que forem menos vexatorio, e, esperamos do Providencia que esse dever será preenchido satisfactoriamente.
Cidadãos, aqui reunidos, congratulai commigo na presente solemnidade. Ella me enche de ineffavel jubilo, por que, aspirando immenso á elevação deste logar á categoria de Villa, para isso não poupei esforços , nem passos e agora os vejo coroados do mais bello resultado.
A menor opposição não se encontrou por parte do corpo legislativo, quer da Presidencia, quer mesmo do nosso Dr. Juiz de Direito que justiceiro e benevolo advogou a nossa causa, fazendo ver a necessidade da prompta posse do nosso municipio.
Esse apoio de todos os poderes seria somente por benignidade?
Não, por certo; a posição topographica deste logar, suas immensas mattas de uberrima cultura, que constituem verdadeiro e perenne manancial de riqueza; seus habitantes já numerosos, dotados de indole pacifica e laboriosa, sua collocação á barranca do rio Paranahyba, cujas aguas, percorrendo varias provincias do Imperio, offerecem, conforme os dados expendidos no relatorio do Conselheiro Saldanha Marinho, quando Presidente desta Provincia, grande parte navegavel, por certo impellirão os poderes competentes para crear este Municipio.
Talvez vos pareça que a navegação do Paranahyba seja uma fixão ou um sonho…
Não é assim; o que era Patos a bem poucos annos?
Um campo inculto, hoje já é um foro!
A ideia de se aproveitarem as aguas de nossos rios como mais rapido meio de communicação é geralmente acceita e muitos já contam vapores a deslisarem-se por suas aguas.
Pois bem: quem sabe si em menos tempo que levou este logar a ser creado e attingir á cathegoria de villa, que ora tem, veremos do barranco do nosso Paranahyba, o fumo dos vapores?…
E com estes, o desenvolvimento da industria do commercio, da civilisação, e emfim tudo quanto se possa desejar!
Para tudo conseguir, depende da força; a força nasce da união; unamo-nos, pois, concidadãos, que teremos prosperidade; desterremos as intrigas, as pequenas vinganças; desprezemos os enredos e os calumniadores, que a felicidade nos virá affagar no seio da nossa prosperidade!…
E nada disso se obtem sem a vontade do ALTISSIMO; assim, pois, convido a vós todos para irmos assistir a um Te-Deum, que em acção de graças se vae entoar na nossa Matriz, e, alli recolhidos, no Sanctuario de Deus, bemdiremos os que nos proporcionaram tantos favores. Sala da Camara, 19¹ de fevereiro de fevereiro de 1868.
J. D. Maciel”.
Si essa singela allocução não foi pronunciada, é certo que della se encontrou o manuscripto entre velhos documentos. É certo tambem que dá a medidas das aspirações de seu autor e mostra o programa da festa da installação desta então villa. Em todo caso, um precioso documento para a sua historia, como tantos outros que se encontraram.
A visão a que nos faz assistir a esse velho papel certamente se ha de realisar um dia e o destino, é de crer, não nos ha de negar a satisfação e a justiça de sermos tambem obreiros dessa obra grandiosa.
* 1: Na realidade não é “19” e sim “29”. O jornal O Trabalho não era impresso, e sim redigido pelo proprietário, Fortunato Pinto da Cunha, que também foi um dos pioneiros da fotografia na Cidade. Nesse caso da troca do “29” pelo “19”, Fortunato se enganou, só pode!
* Fonte: Texto publicado com o título “Jeronymo Dias Maciel − Homenagem do Trabalho / O que deixar após si a memoria de uma vida nobre, deixa á posteridade uma fonte de bem inexgottavel. Samuel Smiles” na edição de 13 de agosto de 1907 do jornal O Trabalho, do arquivo da Hemeroteca Digital do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, via Altamir Fernandes.
* Foto: Do livro Domínios de Pecuários e Enxadachins, de Geraldo Fonseca.