Não tenho por hábito comentar sobre a minha vida de imóvel. Por dois motivos simples: o primeiro é porque não gosto mesmo, e o segundo é porque isso pouca interessa aos humanos. E nessa, nem sei quanto tempo que fiz algum comentário sobre mim ou sobre esta região onde fui erguida¹. Agora sinto que chegou o momento de falar alguma coisa, por pouco que seja. É que, com o passar do tempo, venho percebendo que a segurança do cidadão honesto diminui proporcionalmente ao progresso da Cidade. Antes de mim, as casas por aqui eram simplórias e nenhuma delas tinha alguma proteção contra roubos, e as ruas não eram calçadas. A região foi se transformando, os calçamentos viários vieram, as casas simplórias foram desaparecendo e as novas, mais sofisticas, começaram a se proteger com muretas altas e grades nas janelas. Enquanto o progresso avançava e os amantes do alheio cresciam, surgiu outra novidade por aqui: edifícios. Há poucos anos não havia um. Hoje, já se tornou uma ameaça seríssima para todas nós. Se eu me preocupo com isso? Ora, você aí se preocupa com a sua morte aparente? Pois é, né, não há como fugir dessa preocupação. Voltando ao problema dos amantes do alheio, meus donos foram obrigados a colocar esses troços aí em cima da grade da mureta e ainda instalou câmaras e alarmes. E mesmo assim, não faz muito tempo, tentaram me arrombar enquanto eu estava sozinha. Falando sinceramente, o progresso não é tão saudável como divulgam por aí. Quando não existia iluminação pública, era muito difícil você ser assaltado. Hoje, acontece em plena luz do dia. É, tá na hora de parar com essa baboseira porque sei que os humanos pouco se importam conosco, tanto que, quando surgir a oportunidade, é vapt-vupt, surge um edifício no meu lugar. E fazendo parte da História de Patos de Minas, deixarei saudade!
* 1: O imóvel localiza-se na esquina da Avenida Paranaíba (à direita) com a Rua Cônego Getúlio (à esquerda).
* Texto e foto (05/05/2024): Eitel Teixeira Dannemann.
