Eu só sei que essa região na baixada do Rio Paranaíba começou a ser invadida por casebres, só isso, não me lembro de quando isso começou. Também não me lembro de quando fui erguida, pobre, tremendamente pobre, um casebre como todos os outros. Eu não tinha esgoto, não tinha energia elétrica e nem água tratada. Sei lá como as humildes almas que me construíram aqui se arranjavam¹. Vivi muitos anos assim, tive águas nas minhas bases em algumas enchentes do rio. Era uma mosquitaiada tremenda, cobras, escorpiões e teve uma vez que um coitado dum casal de tatus por aqui apareceu com três filhotes e não deu outra: meus ocupantes cozinharam os cinco. Vida difícil, deveras difícil para quem morava dentro de mim. E assim, nessa pobreza, o tempo foi passando, até que começaram a retirar os casebres daqui e deslocaram o pessoal pra não sei aonde². Então fiquei esperando a minha vez. Sei lá porque, mais tempo passou e eu continuei inteira, rústica e pobre, mas inteira. Então, poucos metros adiante de mim, cercaram o matagal beirante o rio e colocaram um portão. E eu continuei sem ser molestada. Será que isso importa? Afinal, venho me degradando todo esse tempo e não consigo vislumbrar uma oportunidade de ter minhas estruturas melhoradas. Colocaram brita e areia aí em frente. Pra quê? Sei lá quanto tempo isso está aí e nada acontece. Será que algum dia vão melhorar a minha aparência? Não importa tudo isso, só me importa que, mesmo sendo como sou, fazendo parte do outro lado da moeda, sou, com todas as minhas deficiências estruturais e econômicas, integrante inquestionável da História de Patos de Minas. Isso ninguém me tira, assim como quando eu não mais existir, deixarei saudade!
* 1: O imóvel localiza-se no final da Rua José Dias Vieira, no Bairro Jardim Paulistano.
* 2: Leia “Entrada do Parque Ecológico Dercílio Ribeiro de Amorim”.
* Texto e foto (09/10/2022): Eitel Teixeira Dannemann.