DIETA, A − 4/5

Postado por e arquivado em CANTINHO LITERÁRIO DO EITEL.

– Geruza, que história é essa do Jerônimo ter desmaiado hoje na escola enquanto jogava bola? E a Catarina aqui está me dizendo que se sente fraca.

– Adamastor, depois a gente conversa sobre isso, deixa eu dar o suco de beterraba para o Jerônimo.

– Pai, eu tô fazendo cocô vermelho e o Jerônimo também.

– Catarina, para com essa conversa fiada, vá lá pro seu quarto ver televisão. Geruza, que história é esta do Jerônimo ter desmaiado?

– Não é nada não, amor, foi apenas um mal estar passageiro.

– Como mal estar passageiro? O Jerônimo se sente tão fraco que não está aguentando jogar bola e até desmaiou.

– Adamastor, são sete da noite, já está na hora de preparar a nossa janta vegetariana, e hoje caprichei nuns deliciosos bifes de soja. Depois que os meninos forem dormir a gente conversa, tá bom?

– Mas Geruza, o Jerônimo mal consegue tomar essa porcaria, quer dizer, esse suco de beterraba e você ainda fala em jantar vegetariano com bifes de soja?

– Amorzinho do meu coração, vai tomar seu banho, vai, e depois vamos saborear as delicias que preparei, toda essa trabalheira pensando unicamente na nossa saúde.

Para não gerar mais discussões, Adamastor foi se banhar. Após o maravilhoso jantar, somente apreciado pela Geruza, os meninos foram devidamente aconchegados para uma tranquila noite de sono. Enfim sós, o casal pôde conversar à vontade.

– Antes de mais nada quero saber o que aconteceu na empresa. Por que você voltou cedo?

– Antes de mais nada quero saber o que está acontecendo com os meninos?

– Fala você primeiro.

– Não, Geruza, você primeiro.

– Não, Adamastor, você primeiro.

– Que diacho, sô, fala logo, mulher.

– Mas por que eu tenho que falar primeiro?

– Primeiro as damas.

– Nada disso, desembucha logo, homem.

– Tá bom, tá bom, eu falo primeiro, pronto. Sei não, hêim, mas alguma coisa estranha está acontecendo comigo. Tô me achando meio desligado, ando sonolento no trabalho e outras coisas. Meu gerente me recomendou vir mais cedo hoje e na segunda-feira procurar um médico para identificar a causa dessa minha esquisitice. Aí então vamos ficar sabendo o que está acontecendo comigo, apesar de que já desconfio do que está acontecendo comigo.

– Como assim?

– Deixa pra lá.

– Deixa pra lá coisa nenhuma, o que você acha que tem?

– Deixa estar, Geruza, vamos esperar o diagnóstico do médico.

– Não senhor, por um acaso você está insinuando alguma coisa?

– Geruzinha do meu coração, esqueça o que eu disse. Vá, conte o que houve com os meninos.

– Adamastorzinho do meu coração, por um acaso você está querendo insinuar que estas tuas esquisitices têm alguma coisa a ver com a minha dieta?

– Eeeeeeuuuuu, que é isso, amor? Jamais passou pela minha cabeça que minhas sonolências no trabalho, a fraqueza dos meninos e o desmaio do Jerônimo, a sua palidez e a sua falta de vontade de sexo têm qualquer tipo de relação com a sua maravilhosa, estupenda e fenomenal dieta.

– Olha aqui, Adamas…

– Ah, e nem o cocô vermelho de todos nós.

– Adamastor, quer parar com isso.

– Mas não estou fazendo nada.

– Está sim, sendo irônico.

– Longe disso, Geruza. Agora me conta logo. Desde quando o Jerônimo está desmaiando?

– Não se preocupe, foi só hoje na escola.

– E desde quando o Jerônimo está reclamando de fraqueza?

– Ah, isso é questão de umas duas semanas para cá.

– Geruza, a coisa está começando a ficar feia. Eu estou me sentindo fraco, você está se sentindo fraca, os meninos estão se sentindo fracos. Será que você não consegue fazer uma ligação disso tudo com alguma coisa?

– Que alguma coisa é essa, Adamastor? Você não está querendo se referir à minha dieta, não é?

– Geruza, olha só pra você, já reparou como está pálida? Agora, olha só para mim, já reparou como estou pálido. Reparem nos meninos e vai ver que estão pálidos e fracos. Por que será que todos nós estamos assim, hêim?

– Nada a ver.

– Como nada a ver? Você não pode fugir dessa triste realidade, tá na cara que essa sua dieta não está nos fornecendo a totalidade dos nutrientes que precisamos.

– Mas você está tão magrinho, tá uma gracinha.

– Concordo que emagreci e minha barriga diminuiu muito, mas este sacrifício ainda vai acabar nos levando ao hospital.

– Para de pensar coisa ruim, Adamastor.

– Por um acaso você não está com saudades daquelas noites?

– Que noites?

– Ora, Geruza, antes dessa dieta era raro a gente dormir sem fazer amor. Agora, a gente bate na cama e só quer saber de dormir, pois não há ânimo pra mais nada.

– Também não é assim, né. A última foi boa, não foi?

– Claro que foi, mas lembre-se que foi há três semanas. Olha, vou marcar uma consulta com um Nutricionista para…

– Adamastor, não começa a inventar moda.

– É isso mesmo o que vamos fazer, vamos bater um papo com um Nutricionista sim. Aliás, era o que deveríamos ter feito antes de começar com a dieta. Ele vai nos dizer se essa sua tal dieta está nos fazendo bem ou mal.

– Para com essa bobagem, a dieta está nos fazendo bem e…

– Maaaaãaaeeeeee, eu quero vomitar.

Assustado, o casal correu para o quarto dos filhos.

– Viu só, Geruza, olha só a cor do Jerônimo, agora ele está é amarelo, daqui a pouco vai ficar azul.

– Adamastor, vai lá pra sala, vai.

– Tô indo, mas saiba que segunda-feira, além da minha consulta, nós dois vamos ao Nutricionista.

Que sufoco! Já uma hora da manhã de sábado, Adamastor e Geruza tiveram que levar o Jerônimo a um hospital. Devidamente medicado e coletado sangue para o hemograma, o casal pode enfim dormir. Veio o domingo e muito desânimo. Veio a segunda-feira, o Jerônimo foi resguardado da escola, mas a Catarina foi. O Adamastor foi à sua consulta. E da escola ligaram para dizer que a Catarina teve uma mal estar súbito e que estava sendo levada para casa. O casal levou a menina ao mesmo Médico, que detectou os mesmos sintomas do irmão. Anoitecendo, Geruza sentiu um tremor forte nas pernas e foi obrigada a repousar. Mais à noite, Adamastor sentiu uma forte queimação no estômago, que só se acalmou com uma dose caprichada de um antiácido. Já na madrugada da terça-feira, Geruza dormia tranqüilamente e Adamastor não teve dúvida de que era preciso acabar imediatamente com a tal dieta da esposa. Ou eles acabavam com a dieta ou a dieta acabava com eles. Foi muito difícil dormir naquela noite, e o porquê de ter dado ouvidos a Geruza e concordado com essa de comer mato e produtos naturais o intrigava. Veio a manhã, patensemente serena.

– Bom dia, meu amor Adamastor.

– Bom dia, meu amor Geruza, e bom dia meus meninos.

– Bênça, pai, bênça mãe.

– Deus te abençoe, Jerônimo.

– Bênça, pai, bênça mãe.

– Deus de abençoe, Catarina.

– Melhorou, Gerusa? − Indagou o Adamastor.

– Tô ótima.

– Tô vendo. Por um acaso você passou talco no rosto?

– Eu não, por quê?

– Nada não, é que seu rosto está tão branco que…

– Não começa, tá!

– Tá bom, vamos tomar o gostosíssimo café da mamãe?

– Pai, eu tô enjoado de tomar suco de beterraba.

– Eu também, pai.

– Vocês dois, podem parar de reclamar e tomem o suco todo − decidiu a mãe.

– Geruza, já está decidido − retrucou o pai.

– Decidido o que?

– Ontem fui ao Médico, fiz os exames e agora é esperar os resultados para a avaliação do doutor. Hoje nós dois vamos nos consultar com um Nutricionista.

– Ê, lá vem você de novo.

– Presta muita atenção, Geruza, vamos sim ouvir a opinião dele. Nada melhor do que a orientação de um Nutricionista para nos indicar a dieta ideal.

– Que dieta ideal, Adamastor? Não tem alimentação mais saudável do que esta que estamos comendo.

– Geruza, não estou dizendo que vamos acabar com legumes, verduras e afins aqui em casa. Não é possível que você ainda não enxergou que só comer isso não está nos fazendo bem.

– Não seja exagerado.

– Longe de mim ser exagerado. Olha só pra nós, eu tenho que viajar, mas estou com uma preguiça danada. Lembra de como eram os meninos sentados à mesa na hora de comer? Pois é, não paravam de falar um segundo. Olha só pros dois aí tão caladinhos, mal têm forças para mastigar um pedaço de pão integral. E você, por que está escorando o queixo com as duas mãos, hêim? Não precisa responder, pois é claro que está fraca. Então, querida, não está enxergando que uma dieta assim tão radical está nos prejudicando? Geruza, Geruza, está me ouvindo?

– Hêim, o que você estava falando?

– Tá vendo só, não tem forças nem para ouvir.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Pngitem.com, meramente ilustrativa.

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