SEU ADAMASTOR

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Seu Adamastor viveu uma boa vida no distrito de Major Porto, no tempo em que era Capelinha do Chumbo e da jardineira que fazia a ligação com Patos de Minas pilotada pelo João Mota e tendo José Cambraia como cobrador. Num determinado dia de muita chuva e um tremendo lamaçal na estrada, Seu Adamastor precisou ir com urgência à Sede para visitar um irmão internado numa UTI. Não restou alternativa senão fretar a jardineira, único veículo viável para enfrentar as péssimas condições do trecho. Enquanto o João Mota sofria ao volante, o solitário Adamastor brigava com uma janela aberta emperrada. A coisa ficou feia, já passando pelo trevo de Pindaíbas, quando a chuva se intensificou. Foi quando o motorista percebeu o único passageiro já quase ensopado na sua luta para fechar a janela.

– Credo em Cruz, Seu Adamastor, porque o senhor não troca de lugar?

– Mas trocar de lugar com quem, seu moço, se não tem mais ninguém aqui?

Seu Adamastor era fazendeiro, com recursos financeiros bem acima da média, tanto que não pestanejou em fretar a jardineira. O Rio Areado fazia divisa de sua fazenda com a do Seu Genaro. Os dois não eram amigos chegados, mas viviam na tranquilidade, sem problemas, e de vez em quando se encontravam no distrito. Certa vez, Seu Adamastor estava à beira do rio quando chegou, no outro lado, o vizinho, que de lá falou alto:

– Boa tarde, Adamastor, e o irmão, é verdade mesmo que ele faleceu?

– É, já tem uns dois meses, não teve jeito, fizeram de tudo para salvá-lo, mas o tal de canço é difícil de sustar.

– Meus pêsamos.

E daí a conversa fluiu para outros assuntos. Num momento, Seu Genaro começou a perscrutar uma boa extensão do barranco. Seu Adamastor ficou encucado e resolveu perguntar:

– Tá procurando o que Genaro?

– É que me disseram que tem um lugar por aqui que dá para atravessar para o outro lado. Você sabe onde é?

Seu Adamastor tirou o chapéu, coçou a cabeça com os ralos cabelos, olhou para os lados, pensou, pensou, até que encontrou a resposta:

– Ora, Genaro, o outro lado é aí onde você está.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 28/02/2013 com o título “Prefeitura em 1916”.

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