TEXTO: JORNAL O COMMERCIO (1911)
De Jaguára ao Araxá, por onde tem de passar um ramal da Goyaz para Uberaba são 15 leguas.
Do Araxá a Patrocinio mais ou menos 12, passando por esta o tronco em demanda de Catalão.
Fica demonstrada a distancia relativamente pequena para conter a bagatela de trez linhas ferreas, as duas últimas passando por campos descobertos, cortados aqui e alli por capões e restingas e que não se prestam ao desenvolvimento de fazendas agricolas.
A pequena producção de cereaes, pois que é quasi nulla a de café e canna, pouco excedendo do consumo local toma de preferencia o transporte pela Mogyana, devido a superioridade dos respectivos mercados, em São Paulo.
Atravessando aridas campinas de meras fazendas de criar, distanciadas umas das outras, está claro que a Goyaz não ha de fretar seus wagons somente com queijos e requeijões, ou cascalhos de Farinha Podre, mas cahirá na desoladora contingencia dos deficts, agravando ainda mais as já arruinadas finanças do Estado e da Republica.
Ao passo que as grandes extensões de culturas de primeira ordem, mattas frondosas, que constituem a Zona da Corda, com grandes jazidas de preciosos minerios, quasi inexploradas, debatendo-se na desolação asphyxiante da estagnação de suas forças por falta de communicação e transportes; verdadeiras fontes de riqueza que jorrariam para o erario publico como bençãos providenciaes, foi tudo posto à margem para sò atender á cabala do governo, nas eleições presidenciaes.
Acolà, na distancia, relativamente pequena e sem elementos para satisfazer as fauces insaciaveis de trez locomotivas, o governo as derrama com mãos prodigas e favores officiaes.
Aqui, n’uma extensão enorme de culturas e outras riquezas d’um sòlo fecundissimo, o espaço vago de mais de 50 leguas sem uma estrada − o vacuo da desolação por menagem…!
Ninguem mais soffreu com o dislate administrativo que torceu o percurso natural da Goyaz, do que a chamada Matta da Corda, comprehendendo toda margem esquerda do Rio Abaeté e suas vertentes, pela serra desde a Lage, Arapuá, Salgados, Lenheiros, Carrancas e Fabrica, estendendo-se por uma gemma de culturas, pela chamada Matta dos Fernandes − povo cheio d’ardor pelo trabalho e cioso de seus direitos, até o Arraial de Santa Ritta e alem a desdobrar-se na immensa e futurosa tela, culminando o alto Goyaz, que por mais remoto mais se resente do desvio da estrada.
Carmo do Paranahyba, Patos, sem esquecer Lagôa Formosa, Alegres e a benemerita Paracatú, já deviam ter representado aos poderes competentes, aliás, fazendo ranger os prelos da alta imprensa para obter a reconsideração da impatriotica e inopinada mudança do trajecto, maduramente estudado e criteriosamente resolvido por successivos governos. Mande o governo actual examinar a questão por uma commissão d’engenheiros, e se convencerá da necessidade de reactar o antigo plano de viação, que tão bem consultava os interesses da Zona e da Republica.
Ainda é tempo.
Formem-se comicios, organisem-se comissões populares, abaixo assignados, fazendo-se representar no Congresso do Estado e da União, que isto não é fazer revolução armada, mas mostrar o civismo d’um povo tantas vezes provado por actos de grandeza e glorificação histórica.
E a altiva Patos, com suas ruas arborisadas, ajardinadas, praças, optimo serviço d’agua potavel, illuminação publica, edificios publicos de primeira ordem, grupo escholar e fazendo modelo, acordará ufana com o sibilar argenteo da locomotiva!
Será este o corollario do grande acontecimento, consequencia logica da operosidade e civismo de seus filhos, brilhando em lettras de ouro seus dilectos nomes em cada um dos apontados melhoramentos. Avante!
Um brasileiro.
* Fonte: Texto publicado com o título “Descarrilamento da Goyaz” na edição de 30 de julho de 1911 do jornal O Commercio, do arquivo da Hemeroteca Digital do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, via Altamir Fernandes.
* Foto: Início do texto original.
