Se não me engano está amanhecendo, sinto uma parva luminosidade nos meus olhos semimortos. Quase não ouço, já sou praticamente nada. Ainda me resta o sentimento de vibrações no solo. Sinto vibrações, parece que estão tirando terra do meu entorno. Estarão, porventura, já cavando a minha cova? Espaço não falta, ainda. Espaço, tudo por aqui era espaço, amplo espaço, matas, nascentes que corriam límpidas para o Paranaíba aqui bem pertinho. Tinha até onça por aqui. Nas cada vez mais vagas lembranças, estão meus moradores, simplórios que trabalhavam nas roças que abundavam por este pedaço de Cerrado patense.
O tempo é mesmo o senhor da razão. Ele não perdoa, ele nos envelhece, nos reduz a pó e cinzas. Estou próxima, muito próxima de virar pó. Com meus olhos foscos de negritude já pouco percebo as transformações: Avenida João Cirino, Rua Libânio Silvério da Rocha, e esta assentada há pouco tempo às minhas portas e janelas que já não funcionam como portas e janelas. Hoje, estou envolta pelos Bairros Nossa Senhora de Fátima, Residencial Sorriso, Coração Eucarístico e Residencial Barreiro. Todos ocuparam o meu espaço, espaço onde as consciências que me habitaram transitavam sem preocupações a não ser a responsabilidade de sobrevivência. Se foram, todos, e a sobrevivência não mais me resta.
A única emoção que ainda sobrevive no meu carcomido corpo é a certeza de que faço parte da História de Patos de Minas. Não tenho como mudar o destino, mas depois que eu me for esta cidade não mais será a mesma. Vou deixar saudade àqueles que me amaram, a quem fui útil, que um dia passarão por mim com um lindo sorriso estampado no rosto, mesmo eu não estando mais no lugar em que tanto fui feliz.
* Texto e foto (23/11/2016): Eitel Teixeira Dannemann.