POR QUE ME MALTRATAM TANTO ASSIM?

Postado por e arquivado em 2016, DÉCADA DE 2010, FOTOS.

Quanta saudade tenho do tempo em que eu era virgem. Só não me lembro quando me defloraram, entrando sem pudor em meu ventre puro e cristalino. A tristeza duradoura teve início na década de 1950, quando acharam por bem modificar a minha estética selvagem. Lá, naquele momento, instituíram em meu corpo um sofrimento atroz, sem fim, maquiavélico e desumano. De lá para cá fui sendo carcomida pelas beiradas; fui sendo devorada pela especulação imobiliária e interesses promíscuos. Fui, ano a ano, sendo violentada em meus pudores. Hoje, o que sou, além de um monte de água poluída e um joguete nas mãos dos incapazes?

Por que me maltratam tanto? O que fiz de errado para ser tão vilipendiada assim? Recentemente, sem um mínimo de planejamento e compostura profissional, deixaram-me à mingua, sem água, feia, descabelada e inoperante durante meses. Enquanto a Velha da Foice fazia-me companhia diária, nos gabinetes os engravatados discutiam o nada, pois eles são nada. E eu, voltada ao pó da terra, à mercê de incautos, era motivo de chacota e comentários débeis, mas verdadeiros, a respeito de minha tez. Ufa, respirei aliviada, quando finalmente devolveram a minha água. Naquele dia, serenamente, dormi em paz, imaginando ingenuamente que outra catástrofe jamais aconteceria comigo.

Oh amarga ilusão! Vieram de novo e de novo me violentaram. Arrancaram a minha calçada, deixando o pó, enfeando-me como de costume. Todo o meu entorno está destruído, o asfalto que me rodeia está repleto de pó. E como de costume, vieram sem planejamento algum, sem qualificação profissional alguma, simplesmente me enfearam e assim me deixaram. E assim estou há dias, longos e tenebrosos dias. Sei, assim vou ficar envolta pelo pó e na incompetência administrativa por um longo período, como sempre foi. Oh, o que fiz de errado para ser tão maltratada assim? Oh Praça Abner Afonso, choremos juntas!

DSC03078* Texto e foto (15/08/2016): Eitel Teixeira Dannemann.

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