Uma ação judicial contra a fábrica de farinha de osso (Indústria de Rações Patense), movida por um morador da vizinhança há cerca de uma década, foi a primeira tentativa de tirar do perímetro urbano de Patos de Minas o mau cheiro exalado pela atividade da empresa, que atinge uma distância superior a 1.000 metros, causando problemas a mulheres grávidas, idosos, crianças e pessoas enfermas. Agora, depois de enviar um abaixo-assinado, em setembro de 1985, à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, finalmente os moradores tiveram satisfeitas as suas vontades: a Indústria de Rações Patense terá que ser transferida para uma área especial, fora do perímetro urbano.
O proprietário da empresa, Antônio Gonçalves, através de seu contador, reclamou há cerca de 10 dias atrás que a fábrica nunca foi tão perseguida como nos últimos tempos e que muita gente, inclusive Romero Santos, o vereador que encaminhou o abaixo-assinado à COPAM (Comissão de Política Ambiental) em 85, pedindo providências imediatas para a solução do problema, não vêem o lado bom da indústria que, ainda segundo o contador, é a segunda firma em arrecadação de ICM no município. A importância da Indústria de Rações Patense para o município é realmente inegável: o ICM representa divisas (recursos) para os cofres públicos. Por outro lado, sua relocalização representará, de imediato, a melhoria das condições de vida dos moradores dos Bairros Lagoinha, Nossa Senhora das Graças, Rosário, Caramuru e Alvorada, que sofrem hoje com a poluição.
E, se o aspecto da grande arrecadação de ICM poderia ser uma boa desculpa para que a empresa continuasse no mesmo local – entre os bairros Lagoinha e Rosário –, na verdade ela se transforma no extremo oposto. Uma firma que gera um ICM alto, com toda a certeza possui um faturamento proporcionalmente grande a uma relocalização, assistida pela Prefeitura Municipal, que já colocou o terreno à disposição, não irá, de forma alguma, desestabilizar uma empresa sólida como a Indústria de Rações Patense. Bom para os moradores dos bairros afetados, que terão seu direito e suas vontades satisfeitas dentro de no máximo 18 meses. Melhor ainda para o município, que continuará usufruindo dos benefícios gerados pela arrecadação do ICM de produtos industrializados e comercializados pela empresa.
Até que a COPAM decidisse pela relocalização da fábrica de farinha de osso, vários caminhos foram percorridos pelos moradores. No dia 14 de setembro de 1985, foi enviado o abaixo-assinado dos bairros afetados pela poluição do ar. Juntamente com as assinaturas seguiu uma solicitação do vereador Romero Santos, pedindo providências àquele órgão do governo estadual – a Secretaria de Ciência e Tecnologia. No dia 23 do mesmo mês, conforme correspondência enviada ao vereador, a Indústria de Rações Patense foi vistoriada pelos técnicos da COPAM, “tendo sido constatado o fato denunciado”. A empresa teria então 20 dias para discutir com a comissão um Termo de Compromisso visando a solução do problema.
O Termo de Compromisso acabou sendo assinado no dia 27 de dezembro daquele ano. Nele, Antônio Gonçalves, proprietário da empresa, assumia vários compromissos, todos eles destinados ao controle da poluição, com a implantação de sistemas próprios para eliminar o mau cheiro e a presença de moscas e, aliás, “proteger o corpo receptor da poluição por lançamento de efluentes líquidos”, como diz o texto do documento. As medidas teriam que ser tomadas até o dia 28 de fevereiro de 1986 e, segundo Antônio Gonçalves garantiu várias vezes, foram tomadas realmente. Os efeitos, porém, não foram os esperados e a poluição continuava, com mau cheiro, moscas e tudo o mais, o que levou a Câmara de Poluição Industrial da COPAM, no dia 14 de agosto do ano passado, a decidir pelo estabelecimento de um termo Aditivo ao Termo de Compromisso, anteriormente firmado.
A COPAM, na realidade, chegara à conclusão de que somente a relocalização da indústria daria solução ao problema da poluição e numa reunião realizada em Belo Horizonte, a 24 de novembro de 86, viria a estabelecer os prazos para a transferência da empresa para uma área fora do perímetro urbano de Patos de Minas. Na mesma reunião a COPAM estabeleceu um prazo de 30 dias para Antônio Gonçalves apresentar à Comissão de Política Ambiental o Formulário de Estudo do Local (FEL), para que o mesmo seja julgado e o órgão dê o “parecer de viabilidade de localização”, aprovando a área onde a Indústria de Rações Patense terá que implantar sua unidade industrial, num prazo de 18 meses, após aprovação do projeto pela COPAM.
Apesar da solução do problema estar já encaminhada, os prazos estabelecidos na reunião do dia 24 de novembro do ano passado têm preocupado o vereador Romero Santos e, segundo ele, também os moradores dos bairros vizinhos à fábrica. Para o vereador, “a coisa está correndo muito solta, não estão amarrados os prazos”. Ele se queixa do não cumprimento das datas estabelecidas, uma vez que até os primeiros dias de janeiro o FEL ainda não havia sido enviado à COPAM, o que “já atrasou o prazo de 18 meses, estabelecido para a transferência da fábrica”. O vereador Romero Santos entende que a população, a maior interessada na questão, não foi ouvida para a definição dos prazos. “Da maneira que nós agora vamos convocar o Superintendente do Meio Ambiente, José Cláudio Junqueira Ribeiro, para comparecer a Patos de Minas com sua equipe técnica e discutir, com a comunidade, a igreja, a escola, as associações de bairros, políticos, vereadores, com o povo interessado, esses prazos”, afirma Romero.
Com relação ao terreno onde será reinstalada a fábrica, o Prefeito Arlindo Porto disse já ter colocado à disposição da empresa uma área especial para indústrias poluentes, localizada às margens do Córrego do Nogueira e às margens da estrada municipal que liga Patos a Curraleiro/Boassara. Essa área está há três quilômetros, aproximadamente, da ponte velha do Rio Paranaíba (na antiga saída para Santana de Patos). O prefeito informou também que já ofereceu apoio ao empresário para a execução do projeto de relocalização da fábrica e a rede para eliminação de dejetos da indústria, numa extensão de 1.200 metros, do local até o Ribeirão da Cota, e será toda ela construída pela Prefeitura, que já assinou um documento assumindo este compromisso
Enquanto o vereador Romero Santos acredita que o povo não foi ouvido e que o poder público municipal não tomou nenhuma iniciativa no sentido de representá-lo e defender seus interesses nas reuniões da COPAM com o proprietário da fábrica, o Prefeito Arlindo Porto diz que a cessão do terreno e o compromisso firmado para a construção de toda a rede de eliminação de dejetos “demonstra que nós estamos procurando fazer o que é contrapartida da Prefeitura”. Para Arlindo Porto, “fazer visita de casa em casa e tomar atitudes demagógicas”, não é a maneira correta de agir. A bem da verdade, o que mais importa é a solução do problema da poluição, que ainda está preocupando a população dos bairros afetados. Lógico que providências devem ser tomadas para garantir o cumprimento dos prazos estabelecidos e agilizar ao máximo a mudança da fábrica para fora do perímetro urbano.
* Fonte: Texto publicado com o título “O Fim do Mau Cheiro” e subtítulo “Depois de vários anos de luta, os moradores vizinhos à fábrica de farinha de ossos conseguiram sua mudança para fora da cidade” na edição n.º 155 de 31 de janeiro de 1987 da revista A Debulha, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto 1: Foros.elsiglodetorreon.com.mx.
* Foto 2: Eitel Teixeira Dannemann (09/12/2015). Antigas dependências da fábrica de farinha de ossos da Indústria Patense de Rações, localizada no final da Rua Rio de Janeiro (na cabeceira do Córrego Água Limpa), no Bairro Nossa Senhora das Graças.