TEXTO: DÉLIO BORGES DA FONSECA (1955)
NOVA MODALIDADE DE “CONTO DO VIGÁRIO”
Estamos dentre aquêles que vêm com bons olhos e aplaudem com entusiasmo, as iniciativas arrojadas que redundam em progresso para a nossa Patos de Minas.
Ao focalizarmos o administrador Municipal, procuramos fazê-lo humanamente, visando, não os seus defeitos exclusivamente – que todos nós os temos em profusão, mas também as suas virtudes, as suas boas qualidades, o lado positivo de sua personalidade. Não é apontando à execração pública o nome dos nossos dirigentes, que conseguiremos estimular-lhes o trabalho e as boas iniciativas em pról do nosso progresso.
Calando no entanto, sôbre aquilo que está evidentemente errado, estaremos pecando por omissão, desde que nossas observações e nossas críticas, visam melhorar e não destruir o que está feito.
Êis aí o ASFALTO, êste empreendimento de vulto sôbre o qual, à cata de votos, gritou-se e berrou-se tanto na última campanha eleitoral. Realidade forte, arrojada, de pulso.
Gosto do nosso asfalto, imundo assim mesmo, graças aos máus tratos que lhe dispensam os poderes públicos, não obstante o alto preço que o povo pagou por êle. Patos de Minas, deve a maior parcela de seu progresso, à colaboração efetiva de seu povo, voluntária ou não, ao dinheiro que êste povo é obrigado a dispender, para fazer face às novas iniciativas, numa demonstração inequívoca de boa vontade. Mesmo que isto lhe custe os olhos da cara.
E ai daqueles párias, que têm a desventura de não poderem arcar com o ônus do progresso, que bate à sua porta de maneira inexorável, como um intruso, como um impostor.
Vê-se o POBRE, que não tem culpa de ser pobre, altivo em seu desespero, e nobre em sua humildade, numa contingência terrível e angustiante, em um dilema grandioso, que faz vibrar tôdas as cordas imensamente sensíveis de sua alma ingênua e boa: OU PAGA o asfalto e permanece em seu lar de tantos anos, onde as lágrimas foram tantas, os sorrisos bem poucos e tamanhas as recordações, gastando aquilo que não tem…
OU MUDA o seu domicílio mais para a margem da cidade, renunciando ao seu sagrado direito à casa, que é sua e muito sua!
Drama grandioso e pungente, que sabemos aconteceu aqui nesta terra, onde tantas coisas inacreditáveis acontecem!
Quando transitarmos distraídos e absortos pela cidade que tanto nos envaidece, não nos esqueçamos, das lágrimas da gente pobre e humilde, LÁGRIMAS PROFUSAS, que foram sófregamente tragadas pela voragem da terra, que serviu de leito ao calçamento de que nos ufanamos, que serviu de túmulo às alegrias de muitos infelizes. Recordemos o grandioso sacrifício daqueles, que teriam também o direito de viver em sua cidade natal, na casa que lhes abrigou o próprio berço e o berço dos próprios filhos, não fosse a sua grande, imensa pobreza a impedir-lhes o intento.
O progresso é grandioso, é belo, é magestoso! Esconde muitas vezes em seu bôjo, a pequenez dos homens, a fealdade da miséria, e a tristesa e a fome que aniquilam o povo pobre e sofredor! E como está mal feito, como está sujo, como a água empoça por tôda a banda, nos dias de chuvarada!
No entanto, os poderes públicos e a própria Companhia que “EXPLORA” o asfaltamento, fazem ouvido de mercador aos reclamos desta gente, que pagou tão caro por um melhoramento, PAGOU ADIANTADAMENTE, sem saber ao certo SE O RECEBERÁ OU NÃO!
Os moradores do trecho final da “Major Gote”, nas vizinhanças da Praça de Esportes¹, que há mais de UM ANO, pagaram as suas quotas de asfaltamento estão “comendo” poeira e barro até hoje. Enquanto isto, o trecho final da Av. Liberdade² e também da Av. Brasil, cujos editais foram publicados posteriormente, estão com o serviço em andamento um pouco menos moroso. Disse-me o meu cunhado, o FILHINHO QUEIROZ, que mora na “Major Gote”, lá “pras bandas da POEIRA TOTAL (OU BARRO), que o pessoal do asfalto, tem MAIS má vontade com aquêle pedaço de rua.
Não podemos atinar com a razão, já que o encarregado do serviço, Sr. Matias, é pessoalmente tratável e educado; quando o procuramos certa vez, fomos atendidos integralmente em nossas pretenções e da maneira mais cavalheiresca possível. Talvez que a sua conduta neste caso, obedeça diretrizes superiores, às quais não pode fugir, como subalterno que é.
O asfalto é definitivo. Que façam uma coisa que preste, que se estude e se resolva a questão do acúmulo de água da chuva, nas esquinas barrentas de nossas ruas! É lamentável, para os Engenheiros responsáveis pelo asfaltamento, e também para o Serviço de Óbras da Prefeitura, que nós, absolutamente leigos no assunto, enxerguemos e apontemos os erros grosseiros que aí estão, para quem quizer ver, sob os olhares complascentes daqueles a quem CABERIA a responsabilidade, numa demonstração pública de desinteresse pelos compromissos assumidos!
* 1: Patos Tênis Clube – PTC.
* 2: Que já foi Avenida Municipal e hoje é a Avenida Getúlio Vargas.
* Fonte: Texto publicado na edição de 06 de fevereiro de 1955 do jornal Correio de Patos, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Buscawallpaper.com, meramente ilustrativa.