JOGATINA

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Na segunda metade da década de 1910 a jogatina em “clubs” corria solta na cidade. Participavam dela tanto o escol da sociedade quanto o mais humilde. O negócio era tão comum que até havia publicações a respeito incentivando a prática, como bem atesta o anúncio publicado na edição de 25 de junho de 1916 do jornal A Carapuça¹. Mas havia reações contrárias, principalmente de admoestações vindas do meio religioso.

Outro jornal da época, A Metralha², publicou sobre o assunto três artigos bastante sarcásticos, num intervalo curto de tempo, assinado pelo diretor Dimas Pinto:

A METRALHA É A FAVOR DO JOGO – 24/07/1917

O nosso jornal sentiu-se orgulhoso com a abertura dos clubs de jogo.

Não ha industria q’ supere a arte de Grimaut. É tão mais agradavel ganhar dinheiro palestrando em reuniões animosas q’ vão até alta madrugada; dinheiro liquido, sem negociatas; dinheiro que tem o mesmo valor que o cobre ganho á custa de um trabalho insano, ao sol ardente.

Agora sim, com este gesto brilhante de um grupo de progressistas, a nossa cidade vai se rejuvenecer cheia de vida, alegre e prospera. Não é tão bello contemplarmos á noite, os vastos salões dos clubs, profusamente illuminados?

Pois bem. É lá q’ os paes vão ganhar o sustento de seus filhos e dar-lhes um bonito exemplo, ensinando-lhes o bom caminho.

As ceias, as bebidas são mais deliciosas pela noite a dentro.

Isto do homem trabalhar e julgar que ao lado de sua esposa e seus filhos é que se encontra paz e tranquillidade d’alma é muito antigo, e a falar verdade, é proprio de gente tola.

Por isso, ao abridor dos clubs, “A Metralha” leva sinceros parabens pelo consolo que vai bater às portas […].

AINDA O JOGO – 01/08/1917

Foi muito mà a nota severa que o dr. Sandoval queria empregar contra o jogo, pois, aqui em Patos, já se tornou mais q’ natural este vício.

Não saberão illustre delegado que é uma cousa muito divertida assistir aos banqueiros rodar a bolinha fatal? Não apreciará tambem o movimento do rôdo, aquelle simpathico movimento de venha dinheiro e mais dinheiro? Creio que sim, e até deve ter ficado muito satisfeito com a abertura dos clubs e pelo acto nobilitante, digno mesmo de appauso dos contraventores da lei.

É lá no jogo que os homens vão deixar a honra, a dignidade e o credito. Como então prohibir tão delicioso passa-tempo?

É de se admirar o dr. Delegado querer represal-os, pois, os banqueiros não haviam de gostar, como não gostaram de semelhante abuso empregado por um representante da lei.

Não haverá ainda o dr. Sandoval que a propria lei manda que os mais velhos ensinem a arte de jogar a menores de 10 anos? Pois manda, sim, senhor. Esperamos brevemente que os pais de familia assim procedam com seus filhos.

E nem deveria ser outra a medida dos mesmos. Aproveitar emquanto antes e incutir no jovem espirito das creanças que o melhor trabalho é encher barrigas de banqueiros e nada mais.

Estes vos esperam afflictos, impacientes. Porque demoraes? Não os deixeis parar, pois são os vossos lucros, senhores jogadores.

Levem vossos filhos. Não percais tempo, que tempo é dinheiro e dinheiro nesse divertido passa-tempo não se custa a ganhar. Avante, progressistas! Não esmoreçam logo no principio de tão util melhoramento.

UMA BANCA NO JARDIM – 14/08/1917

Sabemos de fonte limpa que vai ser montada uma banca de roleta no Jardim do Rozario.

O pessoal “d’A Metralha” que sempre tem se batido a favor de tão grandiosa causa, vê, agora, coroado de exito o esforço titanico que empregou para levar a effeito tão util instituição.

Sabemos que serà banqueiro o cel. Farnese, e a exma. sra. d. Ritinha será sócia capitalista da sociedade.

Os ponteiros socios do club alliados-nocturnos serão os srs: dr. Agenor, dr. Albergaria, dr. Sandoval, Capm. Fortunato, Aurelio Caixeta e Severino Neves. Ficheiros – Olyntho e Deusdedit. Chocolateiro – Tonico Maciel. Bebidas finas, como sejam: Pirosca, pinga, cachaça e Paraty.

O jogo é grosso e o que não souber baixar 6 e levantar 9 não deve se arriscar.

Roleta viciada por arames em excellentes condições.

Todos podem furtar, comquanto que furtem com arte, agilidade e com decencia. A banca roga aos socios q’ não saiam a clamar que jogam e ganham que furtam ás claras ou ás escondidas.

O club nocturno encetará o jogo ao meio dia em ponto.

Se houver pavuna o baralho será devidamente marcado com antecedência.

Amanhã, pechincha! Grande revolução! Jogo grosso e pessoal amestrado. Acceitam-se de preferencia para ponteiros, mulheres e creanças.

DSC00855* 1: Em formato de revista, sendo diretor Alfredo Borges, “A Carapuça” circulou durante algum tempo. Não abandonava o humorismo, nem as notícias, nem a literatura. Mas, fazendo jus a seu título, sempre colocava a carapuça naqueles que gostavam de menosprezar a nossa terra. Sintam isto através do poema Os incomodados, publicado no n.º 14, à pagina 7, de 08 de abril de 1916, sendo assinado por “Patense”: Já ouvi (não é gracejo) “Alguém” dizer que Patos é lugarejo onde o viver / É sem confôrto!… Não vejo razão de ser de semelhante motejo… Isso faz crer / Que o “Alguém” fala, sem freio, de papo cheio, sòmente para debochar… / Pr’outro lugar, se aqui não lhe serve, rogo que mude logo.

* 2: O jornal “A Metralha”, sob a direção de Dimas Pinto, circulou durante o ano de 1917 e fez época, pela sua irreverência e textos sarcásticos sobre qualquer assunto referente à cidade, como neste caso dos “clubs” de jogos. E levava como subtítulo “Folhinha das moças e dos rapazes”.

* Fontes: Jornais A Metralha e A Carapuça, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam; Patos de Minas: Capital do Milho, de Oliveira Mello.

* Foto: Jornal A Carapuça.

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