Um tatuador teve uma ideia visionária. Há anos ele vem percebendo que os povos vêm cada vez mais escondendo as peles de seus corpos com tatuagens e agredindo os mesmos com penduricalhos para todo lado do corpo, não importando o sexo. Baixa autoestima? Moda? Para ele, profissional do ramo, pouco importa, pois o que importa é que ele está tatuando, e como é costume se dizer no Noroeste Mineiro, com bôrra. Foi então que ele, o tatuador, em conjunto com um especialista médico, desenvolveu uma técnica para tatuar o bebê ainda no útero, e, além disso, aplicar-lhe os acessórios no nariz, na língua, na orelha, na pleura e por aí vai. Então, quando o bebê vem ao mundo, já vem com todo o corpo coberto, quer dizer, já nasce sem ser original.
O ladino carroceiro Amaral acordou sobressaltado com esse sonho. Será que isso é realidade ou mesmo só um sonho? Ele não quis nem saber, pois, há muito tempo querendo vender sua veterana égua preta já passando dos vinte anos de idade, veio-lhe uma jogada genial para se livrar do equino. Primeiro, sem noção das consequências, ele comprou uma daquelas tintas em spray branca para pintar qualquer objeto. Segundo, buscou na internet a foto de uma zebra. Terceiro, seguindo as nuances das riscas, transformou sua velha égua numa autêntica zebra. E quarto, resolveu passar a perna no seu simplório vizinho Tião, também carroceiro, que, candidamente, depois de dois dias, aceitou a troca de sua égua de 10 anos por aquela zebra, imaginando o Tião que faria o maior sucesso em Patos de Minas.
O Tião, animadíssimo, passou o dia todo dando um trato geral na sua zebra, incluindo um banho caprichado, e óbvio que a tinta branca das listras não saiu, pois queria apresentá-la ao público com ela puxando sua carroça o que, na cabeça dele, seria um verdadeiro estardalhaço, que cairia nas redes sociais e ia viralizar, que viria gente da TV e rádio entrevistá-lo e que com isso seria muito afamado na Cidade por ter uma zebra puxando a sua carroça e ainda, rindo às pampas, perguntou a si mesmo como o vizinho Amaral foi tão trouxa em trocar uma zebra por uma égua comum a todas as éguas.
No outro dia, o Tião acordou animadíssimo para preparar e atrelar a zebra à carroça e começar a ficar famoso. Foi quando começou a dar zebra. Chegando à simples baiazinha no fundo do quintal, a zebra estava arriada. Desesperou-se o Tião, correu ao vizinho Amaral, este não estava, desesperou-se mais ainda o Tião, voltou à baiazinha, a zebra já estava com a cabeça no chão e respirando com enorme dificuldade, correu o Tião até um Médico Veterinário sem nem ter ideia de como ia pagar a consulta, o doutor veio, mas quando chegou, a zebra já não tinha mais vida. E aí então, o Tião descobriu a verdade. Explicação do doutor: a tinta provocou uma dermatite alérgica severa na pele da égua e com as constantes lambidas do animal nas listras pintadas, ela, depois de quase três dias, morreu por intoxicação.
Como terminou? De dó, o doutor não cobrou consulta e prometeu jamais comentar nada a ninguém para que ninguém passasse o resto da vida chamando o Tião de otário. O Amaral? Pilantra de marca maior, ameaçou o Tião, pois se houvesse represaria, espalharia para todo mundo. E assim, o Amaral continuou com a égua da troca pela zebra e o Tião teve que comprar outra égua. Dizem as boas línguas que os atritos entre os dois são constantes e, sei não, sabe-se lá o que pode acontecer!
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 25/02/2020 com o título “Palacete Mariana na Década de 1960”.