Tem uma turminha frequentadora do Mercado Municipal que é tão apaixonada por carteado que, quando um deles por um motivo qualquer não pode ir num determinado dia, chega a passar mal e muitas das vezes acaba sendo hospitalizado. E não é só carteado não, o negócio deles é apostar em qualquer coisa, isto é, tudo para eles é motivo de aposta. Mesmo concentrado nas cartas, nada passa despercebido para eles no seu entorno e fora dele. Por exemplo:
– Aposto cinco contos que aquele cachorro vai mijar naquele poste.
– O Zequinha já fumou quantos cigarros hoje? Aposto em 30.
– O Tonho vai ou não vai ser operado. Vou que sim.
– Aposto deizim que aquela mulher de vermelho é sirigaita.
A melhor época de apostas para ele é durante as eleições:
– Tá pra surgir um prefeito aqui capaz de acabar com a desgraceira dessas motos e carros com som. Aposto cenzim que não será dessa vez.
– Aposto que a primeira providência dos vereadores eleitos será aumentar seus salários. Vamos de vinte?
– A xaropada dos candidatos é sempre a mesma e por isso ainda estou em dúvida se vou votar ou não. Quem aposta?
E assim, entre um carteado e outro, era aposta para tudo. Certa dia, chegou um deles esbaforido contando que o Tião tinha sido atropelado, foi levado para o Hospital Regional, mas não teve jeito, morreu. E agora, qual deles iria levar a notícia para a esposa dele? Durante um tempo, pararam com o carteado e discutiram quem seria o responsável por levar a trágica notícia à esposa do Tião. Depois de muitos vai você-vou não, um deles se prontificou a ir e foi mesmo. E foi porque morava praquelas bandas e estava mesmo na hora de ir embora. Pegou sua bicicleta e varou o Centro em direção à residência do Tião, na Rua Prefeito Camundinho, no Bairro Santa Terezinha. Chegando ao local, muito nervoso, bateu palmas e logo a porta se abriu e uma senhora foi até o passeio. Era a esposa do Tião, que com um pano de prato aconchegado no ombro direito e uma panela na mão esquerda foi logo perguntando o que o presente queria. E o companheiro de carteado do Tião não perdeu tempo:
– Bom dia, minha senhora, eu sou amigo do Tião, daquela turma lá do Mercado Municipal. Por um acaso a senhora é a viúva dele?
Assustada com a pergunta, a senhora respondeu:
– Uai, sô, eu sou a esposa dele, mas não sou viúva dele não.
O amigo do Tião deu uma respirada forte, estufou o peito e clamou:
– Vamos apostar?
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 25/02/2020 com o título “Palacete Mariana na Década de 1960”.