IMPACTO DA DESCOBERTA DO FOSFATO, O

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TEXTO: OSWALDO AMORIM (1975)

Como inúmeras descobertas, a do fosfato de Patos de Minas aconteceu por acaso. Em junho último¹, um engenheiro da Companhia de Pesquisas de Recursos Minerais foi ao pequeno povoado da Rocinha², no extremo oeste do Município de Patos de Minas e a 64 km da cidade, a fim de acertar um acordo de terras com um fazendeiro, relativo a um projeto de pesquisa da CPRM³. Isso era uma rotina para Ademir Gonçalves Chaves, responsável por mais de 200 outros acordos. Mas o que ele viu ao chegar ao destino estava fora da rotina: uma espécie de oásis, uma área de um verde exuberante, no meio de uma paisagem semi-árida. Experimentado engenheiro de minas e metalurgia, Ademir comparou a formação dos dois terrenos e uma certeza fulminante o deixou trêmulo e pálido de emoção: ali estava a maior jazida de fosfato do país. O motorista pensou que ele estivesse se sentindo mal. Ademir procurou recompor-se e disfarçar, para guardar o grande segredo, (se o segredo é importante nos negócios em geral, na faixa de pesquisas de minerais é muito mais, pelas corridas que uma simples inconfidência pode provocar). Um bom exemplo disso foram aquelas desvairadas corridas do ouro do velho oeste americano, mostradas pelo cinema. Se alguns colegas de Ademir receberam com ceticismo seu entusiasmo, a análise das amostras levadas por ele acabou com as dúvidas: o minério era mesmo rocha fosfática, com um teor de 25% de ácido fosfórico. A notícia entusiasmou a CPRM, que instruíra seus técnicos para “encontrar o minério a qualquer custo”, a fim de permitir que o Brasil se tornasse auto-suficiente em fertilizantes fosfatados, súbito e violentamente encarecido no mercado internacional, justamente quando o País mais necessitava deles, por causa da expansão de suas fronteiras agrícolas principalmente a partir do lançamento do Polocentro4.

Houve então uma grande mobilização para a pesquisa do fosfato de Patos de Minas, com um rápido e inusitado remanejamento de técnicos e máquinas, de vários pontos do país, “no maior esforço já feito nos últimos anos em pesquisa de um recurso mineral, que só encontra paralelo no petróleo”. O front da guerra para a auto-suficiência em fosfatos estava na Rocinha, onde um exército de 150 homens lutava dia e noite para levantar a jazida em tempo recorde, atendendo a ordens do Ministro das Minas e Energia. Quinze sondas perfuram fundo as entranhas da terra. Retroescavadeiras cavam sem descanso. Um laboratório, com oito químicos, trabalha em tempo integral. As informações vão se somando e a importância da jazida se consolidando e ampliando.

Os técnicos da CPRM comportam-se com discrição exemplar. Mas a descoberta é importante demais para continuar oculta. Eu mesmo escrevi aqui, na “Folha Diocesana”, em fins de janeiro: “Os técnicos são gaúchos, catarinenses, baianos, cariocas. Mas em Patos de Minas todos eles trabalham mineiramente em silêncio. Entretanto era difícil ocultar por muito tempo a importância das descobertas feitas. E assim, de conversa em conversa – como na letra do samba – as informações acabaram vazando e saltando para as páginas dos jornais e revistas e noticiários das rádios e televisões”. Logo, o Brasil inteiro tomou conhecimento das fabulosas jazidas de fosfato de Patos de Minas, com cerca de 350 milhões de toneladas (só na parte levantada). Sem dúvida, elas abriram para o país a ansiada possibilidade de auto-suficiência em fosfato, cujo preço saltara de 16 dólares a tonelada em junho de 72, para 83 dólares, em outubro de 74. Ou seja, quase 520% em pouco mais de dois anos.

Finalmente, no dia 11 de abril, o ministro Shigeaki Ueki, das Minas e Energia, visita as jazidas, em companhia do governador Aureliano Chaves, e dali mesmo, anuncia para todo o País a decisão do governo de apressar a exploração do fosfato de Patos de Minas, entregando à própria CPRM a tarefa de construir e operar – 11 meses depois – uma usina-protótipo, com capacidade para produzir até 150 mil toneladas/ano de concentrado fosfático. E agora posso revelar que a montagem se fará de forma a permitir a duplicação desta produção.

Enquanto isso, como escrevi na “Folha Diocesana” de 24 de abril, “se discutirá quem construirá a grande usina de beneficiamento, que dentro de 30 meses poderá produzir 900 mil toneladas de nutrientes fosfatados por ano e o dobro em 1980. Isso além de outras indústrias que poderão e deverão, surgir em função do nosso fosfato ou da produção em larga escala do concentrado fosfático”.

“A usina-protótipo ao mesmo tempo em que satisfará em parte, a nossa cada vez maior fome de nutrientes fosfatados, economizando divisas para o País (que importa 81% do fosfato consumido na fabricação de fertilizantes, no valor de 237 milhões de dólares), certamente fortalecerá a posição de Patos de Minas na corrida para a construção de uma grande usina, cujas discussões não tardarão a pegar fogo, atiçado por um intrincado de interesses”.

O problema preocupava agudamente o governo: de um lado fertilizantes cada vez mais caros no mercado; de outro, uma necessidade cada vez maior de adubos em todo o país. Então, como conciliar as crescentes necessidades de importação de fertilizantes sobretudo fosfatados, com o propósito do Governo de reduzir o “déficit” da balança de pagamentos? A descoberta veio resolver o problema e trazer um grande alívio aos responsáveis pelos destinos do País, que muitos consideram comparáveis à descoberta do Petróleo de Campos. Afinal, de acordo com estudos realizados pelo governo brasileiro de gastar cerca de 1 bilhão de dólares com a importação de adubos fosfatados (do Marrocos e dos Estados Unidos) em 1980. A previsão é que, neste ano, a agricultura nacional necessite de 1.600 toneladas de concentrado fosfático e de importar 820 mil para cobrir o déficit da população brasileira, que seria de apenas 720 mil, isso, de acordo com os dados disponíveis na época, nos quais não entrou o fosfato de Patos de Minas, cuja produção será maior do que o de todas as jazidas conhecidas juntas.

Estas são as jazidas, com as respectivas produções previstas, em 1980 (em toneladas de P205).

Jacupiranga (SP) – 90.000
Araxá (Arafértil) – 187.000
Tapira (CURD) – 330.000
Catalão (Goiás) – 175.000
Ipanema – 40.000

O total é de 822 mil toneladas. No caso de confirmar-se a jazida de Olinda, Pernambuco, estimada em 60 mil toneladas, o total subirá para 882 mil toneladas.

Enquanto isso, estudos preliminares indicam a possibilidade de, em 1980, se produzir 1 milhão e 800 mil toneladas de concentrado fosfático em Patos de Minas, com base apenas nas reservas já quantificadas.

A produção de concentrado fosfático em Patos de Minas, a começar tão depressa e programada para multiplicar-se com igual velocidade e, como escrevi recentemente, um franco convite para implantação de uma grande indústria de fertilizantes em Patos de Minas. “Principalmente quando se leva em conta a existência na região (a bomba está por estourar) de uma possivelmente imensa jazida de potássio – outro macro-nutriente essencial à nutrição das plantas e, portanto, outra matéria-prima para o fabrico de adubos”.

“Também as gigantescas jazidas de sulfato de zinco de Paracatu, cuja descoberta o governo deverá anunciar brevemente, e as faladas jazidas de Coromandel podem ajudar a transformar Patos de Minas num poderoso pólo de fertilizantes. As últimas são uma extensão natural de nossas próprias jazidas que, portanto, crescem em tamanho e importância. A industrialização das primeiras nos dará um importante sub-produto: a ácido sulfúrico, essencial para a transformação do concentrado fosfático em super fosfato.

Com o fósforo (P) e o potássio (K) temos 2 ou 3 macro-nutrientes. Para completar o trio, falta-nos o nitrogênio (N), que tem uma excelente fonte de gás de petróleo. Solução seria estender até Patos de Minas o ramal, programado para Araxá, do gasoduto Bolívia-Refinaria de Paulínia, em São Paulo. O ramal foi planejado justamente para a produção de adubos e mais 120 km não pesam muito na enorme extensão do gasoduto.

Por tudo isso e levando-se em conta que Patos de Minas possui água e energia com fartura, uma grande rede rodoviária (parte construída) e parte por construir uma infra-estrutura e uma capacidade de prestação de serviços difíceis de encontrar noutra cidade do mesmo porte, pode-se dizer que ela está apta para receber uma grande indústria de fertilizantes. Sobretudo levando-se em conta que estamos no centro de uma região altamente consumidora, a região dos cerrados, compreendida pelo Polocentro. Não teria sentido econômico, que o fosfato de Patos de Minas fosse transportado para um ponto distante e depois voltasse, em forma de adubo, tremendamente onerado pelo frete.

Em vez de pensar em carregar o fosfato de Patos de Minas e da região para industrializá-lo em outros centros, é mais razoável pensar em transportar para aqui os minérios ou elementos (como gás de petróleo), necessários à ampliação e sofisticação de nossa linha de fertilizantes.

* 1: Este texto foi publicado no jornal Folha Diocesana em 24 de maio de 1975 com o título “Da Descoberta do Fosfato à Perspectiva de um Pólo de Fertilizantes em Patos de Minas”.

* 2: Localizado no Distrito de Pilar.

* 3: O Decreto-Lei Nº 764, de 15 de agosto de 1969, autorizou a constituição da CPRM (Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais), que teve seu primeiro estatuto aprovado pelo Decreto Nº 66.058, de 13 de janeiro de 1970, iniciando suas atividades em 30 de janeiro de 1970. Em 28 de dezembro de 1994, pela Lei Nº 8970, a CPRM passa a ser uma empresa pública, com funções de Serviço Geológico do Brasil, sendo seu estatuto aprovado pelo Decreto Nº 1524, de 20 de junho de 1995.

* 4: Programa de Desenvolvimento dos Cerrados, foi criado em 1975 e teve como objetivo o desenvolvimento e a modernização das atividades agropecuárias da região Centro-Oeste e do oeste do estado de Minas Gerais, mediante a ocupação racional de áreas com características dos cerrados e seu aproveitamento em escala empresarial. O programa selecionou áreas específicas para atuação e, posteriormente, forneceu crédito altamente subsidiado a todos os produtores que desejassem investir em exploração agropecuária empresarial.

* Fonte: Queixa ao Bispo, de Oswaldo Amorim, coletânea póstuma editada em 2002 sob coordenação de Oliveira Mello e Oswaldo Guimarães Amorim Filho.

* Foto: Uma História de Exercício da Democracia – 140 Anos do Legislativo Patense, de José Eduardo de Oliveira, Oliveira Mello e Paulo Sérgio Moreira da Silva.

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