DEIXAREI SAUDADE − 238

Postado por e arquivado em 2023, DÉCADA DE 2020, FOTOS.

Não me olhe assim com esse sentimento de dó. Se você me olha assim é porque, das duas, uma: ou me conheceu quando eu, simplória assim desde a minha nascença, era bem ajeitadinha e hoje estou em ruínas, ou agora está sabendo dessa lástima em que me transformaram. Não me olhe assim com esse jeito de desdém, já ruminando o porquê um traste como eu estou ainda presente na fisionomia da Cidade. Quando fui erguida, isso por aqui não tinha praticamente nada. Era mato puro à beira do Córrego do Monjolo. Essa rua hoje asfaltada era terra pura, com matagal dos dois lados, Assim, com meus moradores, vivi muitos anos, humildemente, mas ciente de que estava sendo teto para eles. Eis que o tempo foi passando, veio a Avenida Fátima Porto¹, veio o progresso, veio o aparecimento de uma enormidade de edifícios, e o meu drama, conjuntamente com aqueles que eu hospedava, foi se acentuando. Certo dia, que não tenho a mínima condição de lembrar, se foram aqueles que eu aconcheguei na minha humildade, eis que todos se mandaram e deixaram-me na solidão. A partir desse momento, iniciou-se a minha degradação, a minha ruína. Mesmo fazendo parte da História de Patos de Minas, hoje não sou nada além do que um trambolho que machuca os olhos de qualquer um. Triste fim o meu. Tenho total ciência de que, não vai demorar muito, serei extinta para ceder lugar a, praticamente com certeza, um edifício. E quando esse dia chegar, não vou choramingar, mas partir com a certeza de que, mesmo simplória, fui útil. E deixarei saudade!

* 1: O imóvel localiza-se na esquina da Avenida Fátima Porto com a Rua Cinco de Maio, essa que vem lá da Praça Abner Afonso, a eterna Praça dos Boiadeiros.

* Texto e foto (16/04/2023): Eitel Teixeira Dannemann.

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