SÍNDROME DA HIPERESTESIA FELINA

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Descrita pela primeira vez em 1980 por Tuttle, a Síndrome da Hiperestesia Felina (SHF) compreende uma serie de sinais clínicos que sugerem dor ou irritação em felinos domésticos e é conhecida também por “neurite aparente”, “neurodermatite atípica”, “síndrome da pele ondulada” ou “doença do gato nervoso”.

Não há uma relação causal entre o sinal clínico da dor neuropática e a SHF, visto que essa manifestação pode ser um sinal clínico de outra doença. Apesar da etiologia ainda incompreendida, a SHF pode estar relacionada a diversas doenças, dentre elas condições dermatológicas, comportamentais, ortopédicas, endócrinas e neurológicas. A SHF pode ocorrer em animais de qualquer idade, porém tem sido relatado que a sua incidência ocorre com maior frequência em gatos com idade de um a cinco anos. Essa doença não tem predileção racial, mas acomete com maior casuística siameses, birmaneses, persas e abissínios. Dentre os principais sinais de SHF, estão: vocalizações excessivas, espasmos musculares toracolombares, episódios de agitação excessiva, automutilação, movimentos exagerados de cauda e, inclusive, episódios convulsivos. Tal comportamento pode ser induzido com apenas um toque sobre o pelo do gato e também esses sinais ocorrem com maior frequência pela manhã e à noite. Um detalhado histórico e anamnese contribuem de forma significativa para compreensão do quadro, visto que muitos dos comportamentos relatados não serão reproduzidos em consultório.

Além do exame físico geral, o exame neurológico é importante, já que um grande número de casos tem relação com doenças degenerativas na coluna espinhal. Exames complementares como, hemograma completo, perfil bioquímico, exame de urina e radiografia da coluna vertebral, devem ser realizados em todos os casos. Exames dermatológicos complementares, como culturas fúngicas e bacteriológicas, raspados parasitológicos e histologia da pele e/ou do músculo, podem ser necessários de acordo com a suspeita. Sorologias para Toxoplasma gondii, vírus da leucemia felina (FeLv) e vírus da imunodeficiência felina (FIV) também devem ser realizados.

Dentre as doenças mais associadas com a presença de sinais de hiperestesia estão as dermatológicas, como a dermatofitoses, dermatite alérgica à picada de ectoparasitas, piodermites, escabiose, hipersensibilidade alimentar, doenças autoimunes e síndrome atópica cutânea felina. Assim, faz-se necessário, além de um detalhado histórico e anamnese, que sempre que se suspeite de SHF sejam excluídas as dermatopatias com exames específicos ou eliminação de outras caudas de pruridos. A miosite também já foi reportada como um fator desencadeante da SHF. Crises epilépticas podem, muitas vezes, apresentarem-se como movimentos musculares involuntários, alucinações, vocalizações e lateralizações de cabeça e membros. Mielopatias e doenças de disco têm sido descritas como desencadeadoras de SHF. Relatos relacionam a hiperestesia a uma doença ainda pouco descrita em gatos, a osteocondromatose. Trata-se de um crescimento ósseo anormal, geralmente ligado à infecção por um agente viral. Traumas em cauda têm sido relatados como um possível distúrbio relacionado à SHF. Doenças infecciosas de origem não viral também precisam ser levadas em consideração.

Estudos ainda correlacionaram a presença de sinais de hiperestesia muscular com o achado em animais infectados naturalmente pelo protozoário Toxoplasma gondii, que pode causar lesões dos nervos periféricos, músculos e SNC. As causas comportamentais são as mais relatadas. Muitas teorias sugerem um distúrbio compulsivo, que acaba resultando em um comportamento auto lesivo. Estresse e ansiedade também podem ser considerados como fatores predisponentes para a SHF. Animais com cistite intersticial, devido às suas disfunções diversas, acabam caracterizando a Síndrome de Pandora, sendo assim é comum esses felinos desenvolverem SHF por redução de seus comportamentos habituais. É importante ao clínico ter conhecimento de ambas as síndromes, visto que as duas são caraterizadas por sinais clínicos comportamentais.

O tratamento da doença primária deve ser estabelecido conforme diagnóstico, seja ela dermatológica, neurológica ou infecciosa. Para distúrbios de origem comportamental, o enriquecimento ambiental deve ser a primeira alternativa, visando atender as necessidades ambientais de acordo com os cinco pilares da foto. Uma vez que não se obtenha resultados, o derradeiro caminho é o Médico veterinário. Concluindo, a SHF possui uma importante variedade de fatores desencadeadores. Requer um estudo minucioso do histórico e anamnese do paciente, pois, por vezes, não será possível um diagnóstico claro e preciso, principalmente se fator desencadeante for um distúrbio comportamental. Entender como o animal se comporta em seu ambiente é fundamental. Além disso, descartar as possíveis causas primárias ou doenças concomitantes é indispensável para o diagnóstico e tratamento corretos.

* Fonte e foto: Síndrome da Hiperestesia Felina, de Aline Soares Silveira Brum, trabalho apresentado à Faculdade de Veterinária da UFRS como requisito parcial para obtenção do grau de Especialista em Clínica Médica de Felinos Domésticos, tendo como orientador, Daniel Guimarães Gerardi (2021).

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