Os bandeirantes foram os exploradores iniciais do sertão patense, como no Brasil todo. Vinham, inicialmente, com o único objetivo de encontrar riquezas minerais para sustentar suas ambições materiais. A movimentação freqüente de vários deles propiciou o aparecimento de pequenas povoações. Os habitantes não tinham preocupação com plantios da lavoura para produção de alimentos. O aproveitamento do tempo era quase total para a busca dos metais preciosos. Ano após ano as pequenas povoações foram se avolumando e se transformando em vilas e cidades, enquanto as pedras preciosas rareavam. Os víveres, além de muito caros também foram se tornando escassos. Chegou a ponto de os homens transportá-los por várias léguas, sobre os ombros, levando mais de 4 a 6 meses para conduzir uma carga pequena. Os homens das novas colônias de mineração se debatiam com a carestia de mantimentos, a ponto de chegar a uma quase dissolução total devida à fuga de seus moradores.
Foi nesse caos alimentar que surgiram os primeiros tropeiros e seus muares, que se serviam das picadas para transportar as mercadorias e víveres necessários para os rincões mais distantes onde a civilização plantara povoados, arraiais e vilas, muitos de vida efêmera. Desde meados do século 18, quando surgiu, e até há bem poucos anos, a tropa de muares foi sistema de transporte de suma importância para o desenvolvimento econômico e social do Centro-Sul, Centro-Oeste e Extremo-Oeste.
Devido às específicas necessidades da tropa, surgiu o rancho. Cada um era um núcleo de povoações e de comércio e a vida circulava pelas estradas barrentas ou cheias de pó, conforme a estação, percorridas pelos lotes, palmilhados pelos tocadores até o fundo dos sertões. Patos de Minas constituiu-se num desses ranchos dos tropeiros lá pelos idos de 1800, uma vez que faziam pouso à beira de uma das suas lagoas, na então picada que se construiu de Pitangui a Paracatu, bifurcação da picada de Goiás, que já existia. Os tropeiros, portanto, no afã de conduzir os víveres às minas distantes, inconscientemente também iam plantando povoados, desenvolvendo regiões, social e economicamente. Além dos alimentos, difundiam conhecimento, na transplantação de culturas, na vinculação de rincões afastados, tudo por processos orais. Eles salvaram, assim, a obra efêmera dos bandeirantes, graças ao trabalho modesto e paciente. Se não fosse o seu destemor, a sua persistência, a sua argúcia em saber localizar os ranchos, talvez não tivesse surgido a cidade de Patos de Minas.
Com o trabalho constante de vai e vem nas viagens a serviço da profissão, os tropeiros foram comparados aos corpos celestes que, em relação aos astros e planetas aparentemente fixos no espaço, percorrem a imensidão do espaço sideral. Passaram a ser chamados, então, de cometas.
O cometa não era instrumento apenas de movimentação econômica porque trazia do litoral a última moda do vestuário, o último passo da dança, as últimas anedotas e o último boato ou comentário político. Não existindo uma rede bancária para atender às necessidades das pessoas, o cometa era o veículo de toda a riqueza circulante de então, conduzindo em suas grandes malas de couro cru milhares de contos de réis, anualmente. Ele geralmente conduzia uma comitiva de 5 a 6 burros, com dois empregados – arrieiro e cozinheiro. Este último indispensável, uma vez ser totalmente desprovida de hospedaria a região inóspita por onde transitavam.
Em Patos de Minas os cometas, via de regra portugueses, vinham com sua tropa toda enfeitada, e quando chegavam à cidade pequenina, despertavam a atenção de todos pelo tilintar compassado do cincerro da madrinha da tropa. Como eram bem recebidos! Motivo de novidades para o habitante, isolado do resto do mundo, fosse quanto às notícias que traziam dos grandes centros, fosse ainda quanto às mercadorias e às amostras para pedidos futuros dos comerciantes.
João Borges foi quem construiu o primeiro rancho para hospedar os cometas, localizado na Rua Tiradentes, esquina com o Beco do Queiroz. A seguir veio o Rancho do Gote, em frente ao atual Cine Tupã; mais tarde, com a ausência dos cometas transformou-se em rancho para os carreiros. Finalmente, o Rancho de Virgílio Borges, ao lado do atual Hotel Magnífico.
Com o surgimento dos ranchos, a tradicional figura do cozinheiro foi desaparecendo. Mas não só a cozinha foi diminuindo até o seu total desaparecimento; também os cometas começaram a escassear-se com a chegada dos primeiros automóveis. Com a extinção das luzidas e atraentes comitivas dos cometas, os ranchos perderam a sua razão de ser. Vieram então os hotéis, mais confortáveis. Assim surgiu o primeiro hotel na cidade, construído por Virgílio Borges, com a denominação de Hotel da Luz.
Os tropeiros e os cometas de hoje são outros, mas os objetivos não mudaram. Ficaram para sempre na memória como grandes responsáveis anônimos pelo progresso de Patos de Minas.
* Fonte: Patos de Minas: Capital do Milho, de Oliveira Mello.
* Foto: Tela “Rancho Grande dos Tropeiros”, de Benedicto Calixto, coletada em Novomilenio.inf.br, na qual retrata as atividades dos tropeiros.