No final da década de 1950 ocorreram fatos estranhos na então Capelinha do Chumbo, hoje distrito de Major Porto, sendo o personagem principal a rústica porteira de uma fazenda às margens do Rio Areado. Contam os antigos do lugar que o proprietário da fazenda era o cão de ruim, principalmente com a esposa e seus três filhos homens. Para se ter uma idéia, ela jamais ia sozinha ao povoado. Além disso, o tirânico detestava a presença de pescadores, que invariavelmente eram ameaçados com uma espingarda quando passavam pela estrada em frente à porteira da fazenda.
Numa determinada noite um cavaleiro chegou assustado à vila contando pra todo mundo que, depois de ter passado pela porteira, ela bateu três vezes. Pensando ser o vento, não deu atenção. Na volta, deu-se o mesmo. Então ele resolveu conferir. Foi quando percebeu que a porteira estava bem taramelada e não poderia bater. Sem entender, resolveu ir embora. Mal virou as costas e a porteira bateu três vezes. Outra conferida e lá estava ela muito bem amarrada. Aí ele se assustou e saiu à galope ouvindo o batido insistente da porteira.
De antemão o povo não deu muito crédito às palavras do cavaleiro. Ainda estavam discutindo o assunto quando outro cavaleiro chegou com a mesmo informação, mais assustado ainda. Não demorou muito e uma comissão de dez cavaleiros foi verificar. Mas nada aconteceu.
O tempo foi passando, pelo menos um ano, e o caso da porteira assombrada era comentado por muitos que afirmavam categoricamente terem ouvido as três batidas. Mas a maioria do povo não acreditava naquela aparente maluquice.
Numa noite um dos filhos do fazendeiro encheu a cara de cachaça num boteco da vila. Um de seus poucos amigos puxou conversa na tentativa de amainá-lo os espíritos. Ouviu uma história trágica. A mãe havia cometido adultério com um “vizinho de cerca”. Inconformados, pai e filhos trancafiaram a mulher no porão dominado por ratos. Alguns meses após, bastante debilitada, morreu, talvez afetada por leptospirose. Com medo de se contaminarem, seus algozes selaram o porão.
Sem perceber o que acabara de declarar, e sentindo-se cansado, o rapaz resolveu ir embora.
Havia no boteco umas dez pessoas que passaram o restante da noite discutindo o que acabaram de ouvir. Dois dias depois resolveram visitar a fazenda. Houve uma enorme surpresa: não havia ninguém, nenhum sinal de morador.
Três anos se passaram. Enquanto a fazenda permanecia abandonada o número de pessoas que afirmavam ter ouvido a porteira bater aumentara. Até que um comprador de Quintinos adquiriu a fazenda. Veio então a segunda surpresa: foi encontrado no porão o esqueleto de um ser humano e, ao lado, restos de roupa feminina. Decretaram imediatamente que eram os restos da falecida esposa do cruel fazendeiro. Foi uma verdadeira comoção no povoado. Todos passaram a admitir que era a alma da falecida que provocava as batidas da porteira para avisar de seu estado de “morta sem enterro”. E a morta foi enterrada no mesmo dia, lá mesmo na fazenda.
Durante pelo menos seis meses não se ouviu o bater da porteira. Mas, de um dia para o outro, a porteira voltou a bater. Resolveram conferir o local onde a mulher foi enterrada e veio mais uma surpresa: não havia restos de esqueleto.
Ninguém soube o que aconteceu, nem o porquê e muito menos o como. Durante muito tempo várias pessoas continuaram ouvindo as batidas da porteira. A fazenda, nesse tempo todo, não teve outros moradores. Dizem que o caso se encerrou quando demoliram o antigo casarão, mas ainda tem gente que ouve barulhos estranhos no local.
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann, coletado de Fernando Kitzinger Dannemann e povo do distrito de Major Porto.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto de rfitaperuna.com.br.