Conhecidos desde tempos ancestrais pelos nomes de cabaça, cuia, porongo, coité ou cuité, os frutos de espécies vegetais distintas têm recebido múltiplos usos e sentidos ao longo dos séculos e em diferentes regiões geográficas, perdendo-se na história referências à época e ao local de domesticação dos cabaceiros (Crescentia lagenaria), porongos (Lagenaria vulgaris) e das cuieiras (Crescentia cujete) no país. No cenário cotidiano, como instrumento de trabalho e recipiente para líquidos e alimentos, na música, nos rituais, nas festas e brincadeiras, no artesanato tradicional e nas recriações de artesãos urbanos, entrecascas desses frutos multiformes constituem tanto objetos de uso corriqueiro quanto suportes de expressões que distinguem e identificam indivíduos e grupos da sociedade brasileira, num universo misto de referências culturais.
A cabaça está presente também numa lenda patense que surgiu na região onde se formou a Vila Garcia¹. Pouco acima, em 1953 foi construída a Vila Padre Alaor com a missão de abrigar os pobres sem lar, sob a liderança de Monsenhor Manuel Fleury Curado. O nome foi uma homenagem ao Padre Alaor Porfírio de Azevedo, falecido quando Vigário da Matriz de Santo Antônio, em março de 1952.
Bem antes da construção da Vila, provavelmente entre as décadas de 1930 e 1940, o local era um vale repleto de árvores cabaceiras. Eis que um dia um morador da região contou a todos os vizinhos que, passando por aquele cerrado aberto, ouviu gemidos estranhos, parecendo vozes de humanos, ora de crianças, ora de homens, ora de mulheres. A notícia se espalhou que nem fogo na pólvora. Vai daí que todos passaram a comentar que também tinham ouvido os gemidos. Não demorou muito e o local foi considerado assombrado por almas sofredoras.
Até os tropeiros, considerados homens cheios de coragem, mas tremendamente supersticiosos, davam notícias e procuravam cortar caminho para fugir daquele local assustador. Dessa forma, toda a população tinha conhecimento do lugar e ninguém queria saber de botar os pés por lá, pois, diziam com ênfase exagerada, que ali se reuniam almas penadas para os seus encontros.
Depois de muitos anos, dizem, um padre resolveu dar uma conferida no tal lugar maldito. Foi e voltou com o veredito. Na verdade, nenhuma alma penada se concentrava no que a população chamava de Vale das Cabaças Uivantes. As vozes, os gemidos humanos não eram outra coisa senão as cabaças entrechocando-se uma contra outras, tocadas pelo vento. De acordo com a intensidade das correntes de ar, é que maior ou menor era o ruído.
Bem, o padre falou e foi embora. O povo ouviu, entreolharam-se todos e… o tempo passou, o bairro Vila Garcia cresceu, a Vila Padre Alaor foi construída e hoje não se vê uma única cabaceira no local. Ainda assim, dizem os mais antigos, que mesmo no meio de tanta construção, as sofridas vozes continuam sendo ouvidas.
* 1: Em 1947, Genésio e Mário Garcia Roza adquiriram a Fazenda Limoeiro, loteando quase toda a área que viria a ser o Bairro Vila Garcia. Nela, ingressam no comércio cerealista, construindo armazéns para 50.000 sacas de cereais, instalando maquinário para milho, feijão, arroz e café.
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Fontes: Cultura.gov.br e Patos de Minas: Minha Cidade, de Oliveira Mello.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto de rfitaperuna.com.br.