TEXTO: NEWTON FERREIRA DA SILVA MACIEL (2013)
O Brasil já teve, depois de sua independência, nove tipos de sistemas monetários. A variação das moedas foi do chamado réis, criado em 1871, cuja unidade principal era mil réis, até o atual real. Certamente os leitores mais novos não conheceram o mil réis. No final da existência deste sistema, em 1941, um picolé custava cem réis, ou seja, a décima parte da moeda. Curiosamente, mil mil réis (não há erro de digitação, é isto mesmo), equivalia ao cognominado “conto de reis”, que representava uma quantia bem significativa. A introdução acima é para melhor entendimento dos que lêem esta história que será narrada abaixo, pois se trata de um acontecimento verdadeiro, o qual teve origem aqui na cidade de Patos, lá pelo ano de 1939.
O personagem central, já falecido, era pessoa conhecida na cidade, que gerou diversos filhos, dos quais alguns são meus amigos e gente de bem. Não designo seu nome real, criando um prenome fictício, aleatoriamente chamando-o Pedro. Por ocasião do episódio aqui descrito, a cidade era pequena e seus moradores, mesmo os da classe média, eram de poucas posses. Desta forma, a situação dos mais pobres, evidentemente, era quase insustentável, normalmente com famílias numerosas. Era essa a situação do Pedro. Apesar de trabalhador, seu meio de sustento era precário, principalmente devido à sua humilde profissão. Alguns de seus filhos, todos menores, já estavam frequentando o grupo escolar. Pedro, muito preocupado com sua situação financeira, não obstante trabalhar muitas horas por dia, não conseguia o suficiente para alimentar adequadamente todos aqueles sob sua responsabilidade.
O que fazer? Já estava desesperado. Foi então que a tentação surgiu em sua vida. Havia chegado recentemente em Patos um malandro proveniente da capital mineira, o qual se encontrou com Pedro. Conversa vai, conversa vem, eis que surge o assunto dinheiro. Prometeu o embusteiro que conseguiria uma máquina de cunhar moedas em Belo Horizonte, permitindo ao seu proprietário “fazer” dinheiro, muito dinheiro. O impulso foi óbvio. Após pensar rapidamente Pedro combinou com o interlocutor que o negócio seria realizado, sendo que a quantia acordada deveria ser paga com dinheiro verdadeiro, em módicas prestações mensais. Quando chegou às mãos de Pedro a pequena máquina ele ficou surpreso, pois a mesma nada mais era que uma prensa manual, com uma base na parte posterior. Seu novo dono ficou muito satisfeito, pois estaria garantida sua sobrevivência.
A fabricação da moeda de mil réis – a de maior valor — seria efetuada da seguinte maneira: fundia-se metal amarelo em determinada temperatura e, com uma das faces de uma moeda verdadeira embaixo, jogava-se sobre ela certa quantidade previamente calculada, prensando o material em seguida. A sequência era a repetição da mesma pasta de metal, utilizando a outra face enquanto o material estava quente. Em poucas palavras, seria uma adulteração de dinheiro praticamente artesanal.
Depois de treinar o mecanismo adequadamente e perceber que as moedas produzidas poderiam enganar seus usuários, Pedro entrou em ação. Permitiu o tempo a propagação das moedas falsas. Algumas pessoas, mais argutas, perceberam falhas. A notícia circulou na cidade velozmente. Assim, todos os moradores souberam que aqui em Patos circulava dinheiro falsificado. Lembro-me que testávamos as moedas referidas quando a recebíamos jogando-as, com força, no passeio. O tilintar da falsificada era bem diferente da verdadeira. Este era o principal método que permitia diferenciar uma da outra. Chegando ao conhecimento da polícia civil a existência deste engodo, tentavam os detetives descobrir quem seria o autor deste dinheiro que circulava pela cidade. Curiosamente, Pedro só cunhava suas moedas quando necessitava de dinheiro, motivo que dificultou, sobremaneira, a eficiência policial. Na realidade, conforme diziam os adultos, somente o acaso permitiu a descoberta da “Casa da Moeda Patense”, conforme narrado abaixo.
Uma manhã surgiu na padaria Santa Terezinha, pertencente a Tito Silva, empresário de nacionalidade portuguesa aqui radicado há muitos anos, existente na esquina da Rua Doutor Marcolino com Rua Silva Guerra, um dos filhos do falsário. Solicitou a criança “um mil réis” de pães que, diga-se de passagem, era uma quantidade bem expressiva. Uma vez embrulhada a encomenda, o padeiro perguntou ao garoto pelo dinheiro. A resposta foi imprevista:
– Meu pai está fabricando o dinheiro e logo que esfriar eu o trago para o senhor…
* Foto: Moeda de 100 réis, meramente ilustrativa.
* Edição: Eitel Teixeira Dannemann.