TEXTO: EITEL TEIXEIRA DANNEMANN (2016)
Prezado presidente,
Talvez vosmicê até saiba que eu, Jerônimo Dias Maciel, fui eleito o primeiro presidente da Câmara Municipal de Patos de Minas e também o primeiro chefe do executivo, que hoje é o prefeito. Para avivar a sua memória, isso se deu em 29 de fevereiro de 1868. É, faz muito tempo mesmo. Eu sentei naquela cadeira com muito orgulho e não ganhava um único real para exercer as duas atividades, que aconteceram mais seis vezes. Aliás, nenhum de nós tinha salário e muito menos assessores, verbas de custeio e outras benesses como estas que estão aí. Mesmo assim, vosmicê pode acreditar, sem receber salário ou qualquer outro tipo de benefício, democraticamente fizemos a cidade crescer dentro dos preceitos da moralidade.
Vosmicê pode imaginar que, por falta de salário, nós trabalhávamos ao bel prazer da vontade. Na verdade, a gente trabalhava de graça ao bel prazer do tempo que disponibilizava os nossos afazeres profissionais, que era quem nos sustentava. Já que vosmicê é hoje o presidente da Câmara, que está localizada numa rua que leva o nome de um grande amigo meu, José de Santana, homem que muito fez por esta cidade, confira nas atas a rotina de nosso trabalho, gratuito!
Eu li o comunicado de vosmicês a respeito da diminuição do número de sessões ordinárias. Sinceramente, não foi uma decisão sábia. Vosmicê até pode se perguntar quem é esse tal de Jerônimo Dias Maciel para querer lhes ensinar alguma coisa. Eu não sou e nunca fui do tipo “sabe com quem está falando”. Só quero deixar bem claro que no nosso tempo a gente também era muito cobrado para trabalhar mais. Acontece, prezado presidente, como eu relatei aí acima, nós não tínhamos salário, exercíamos a legislatura por dever cívico. Mesmo assim, confira lá nas atas, as reuniões eram frequentes. Hoje vosmicês recebem salários. E, isso no meu entendimento, se recebem salários são “funcionários”. E se são funcionários têm que trabalhar, não podem se dar ao luxo de se reunirem duas vezes por mês.
O principal argumento de vosmicês para decidirem por duas sessões ordinárias de quatro horas por mês é que “o trabalho do Parlamentar não se limita em reunir-se em Plenário”. Eis aí a mais pura verdade, desde os tempos dos edis de Roma. Mas vosmicês se esqueceram do detalhe fundamental: todo trabalho do parlamentar só é decidido em plenário. Vosmicês ainda alegam que fora do plenário “fazem reuniões de comissões permanentes, visitas fiscalizadoras, estudos e análises de projetos, atendimento à população nos gabinetes e assessoramento ao Poder Executivo Municipal e que estas atividades demandam tempo”. Então, presidente, vosmicê considera que depois de todo este tempo dispensado vão conseguir resolver os problemas encontrados em duas sessões ordinárias de quatro horas por mês? Se vosmicê disser que sim, sou obrigado a dizer que estão zombando do povo!
Atente que a cidade está um verdadeiro caos. E se a cidade está um verdadeiro caos é por que o executivo não está sendo eficiente. E nesta questão do executivo, o comunicado diz que uma das funções do vereador é o “assessoramento ao Poder Executivo Municipal”. Assessoramento, do verbo transitivo direto assessorar, que significa “auxiliar alguém de alguma necessidade ou tarefa, orientando-o”. É isso mesmo o que vosmicês fizeram nestes três anos de legislatura? Neste tempo todo vosmicês se reuniram quatro horas por semana para auxiliar a ineficiência do executivo? E ainda por cima orientando-o? Eis então o porquê a cidade se encontra no caos em que está, pois vosmicês não têm que assessorar o executivo, vosmicês têm que exigir do executivo que ele cumpra com suas obrigações. Se ele não as cumprir, assim como vosmicês… bem, não preciso ensinar-lhes o que fazer.
Não foi inteligente a explicação sobre os gastos com TV. No meu tempo não tinha TV. Hoje, que eu saiba, nenhuma Câmara Municipal tem por obrigação dispensar verba para pagar transmissão de TV das reuniões. Então, afirmar que um dos aspectos positivos da diminuição do número de sessões ordinárias é promover a redução dos custos com TV é, no meu simplório entendimento, outro gesto de zombaria com o povo.
Presidente, se vosmicês se debruçarem sobre o Código de Posturas e a Lei Orgânica vão entender o porquê a cidade está um caos. Só com esses dois Códigos vosmicês têm assunto para se reunir todos os dias durante anos. Se vosmicês obrigassem o executivo a fiscalizar e exigir o cumprimento da lei, Patos de Minas seria um paraíso. Aqueles dois códigos, presidente, são a chave para o sucesso. Mas, infelizmente, vosmicês demonstram dia a dia que eles não existem. Como vosmicês não trazem a solução, fazem parte do problema.
Presidente, vosmicês recebem 10 mil reais por mês mais as benesses e os assessores (pra que servem os assessores?). Ponham seus assessores para pesquisar e registrar as necessidades do cidadão. Vosmicês, durante quinze dias nas ruas, jamais resolverão os nossos problemas. Vosmicês são úteis é no plenário, dia a dia, julgando e determinando ao executivo o que deve ser feito. Repito: ponham seus assessores para pesquisar e registrar as necessidades do cidadão e atentem para os nossos Códigos, pois eles são a solução. Ou então, prezado presidente, isentem-se de salário ou qualquer tipo de benesse para que o povo tenha mais respeito por vocês, pois, se não fizerem muito por ele, o povo, como atualmente, pelo menos vosmicês terão a justificativa de que não estão recebendo um centavo sequer!
Prezado presidente, meu irmão Antônio Dias Maciel, que estava ao meu lado quando redigia esta missiva, me alertou para um detalhe que eu não havia percebido: estamos a oito meses das eleições, e época de eleição é quando o corpo a corpo se torna mais do que necessário, torna-se primordial para o candidato. Será que é por isso que vosmicês estão precisando de mais tempo fora da Câmara?
Despeço-me, respeitosamente.
Jerônimo Dias Maciel, o primeiro presidente desta casa.
* Foto: Thoth3126.com.br.