Pouquíssimas pessoas sabem da existência de uma entidade que tem por finalidade trabalhar com a literatura, ou melhor, deixar que a literatura siga seu próprio caminho, mas discutindo os problemas daqui e de outros lugares, mesmo sabendo que os tempos não têm sido interessantes aos poetas, aos literatos de uma forma geral, a não ser pelas banalidades e mediocridades diárias. Nesta entrevista ao companheiro Heitor Mendonça, o presidente do CCRB, Hipólito Ivo, fala do movimento cultural, da falta de livraria em patos e ainda faz suas considerações sobre a recém-nascida FUNCCEP, sobre o Conselho Municipal da Cultura e a política e literatura.
Como é que você avalia o movimento cultural em Patos de Minas?
Sem dúvida passa por uma crise em quase todos os segmentos. A começar, o movimento não está acontecendo, ou melhor, não está engrenado, no sentido mais exato da palavra, os grupos que formam o movimento se encontram dispersos, justamente por reflexo de uma série de acontecimentos que vieram a desagregar todo um trabalho que estava se formando a muito tempo.
E o trabalho do Centro Cultural?
Às vezes, as pessoas menos esclarecidas sobre o CCRB, nos cobram eventos e acham que nós aparecemos muito pouco nas praças, etc… e isto aliás não é uma função do Centro, nosso trabalho é na área literária, e o fazer do escritor, do poeta aflora naturalmente, é uma coisa espontânea e, sempre nós nos encontramos e as coisas acontecem de forma até muito bonita, porque sempre se mostra um poema para o outro, tudo isto indiferente de ser em reuniões formais. As coisas às vezes acontecem de forma mais lenta, como é o caso do nosso grande poeta Wilson Pereira, depois de muitos anos de trabalho nos mostra um livro, outro também está para ser lançado, do Afonso Paixão, que é também do Centro Cultural. Nós estamos caminhando e estamos planejando para este ano uma coletânea, com todos os poetas patenses.
Não existem livrarias em Patos. As pessoas não lêem?
Quanto às livrarias, acho um assunto muito sério. Não só por não ter livrarias, mas porque não há o hábito da leitura. Acho que não existe quase o incentivo às crianças, ao povo em geral em ler. Portanto as livrarias simplesmente fecham as portas, uma vez que suas vendas são muito baixas. Acho que o Centro Cultural consegue uma abertura muito importante com relação a este problema que é a feira do livro, que pelo menos sendo uma só vez por ano vende, e até já se tornando tradição. Este ano acontecerá a terceira e acredito que terá êxito.
O Centro Cultural era filiado à Casa da Cultura, hoje está com a FUNCCEP. Porque a criação de uma nova entidade?
Bom, a entidade surgiu justamente pelo anseio de uma retomada de trabalho. Trabalho este que foi esfacelado pela forma de condução da Casa da Cultura, justamente por causa do seu presidente, então nos desfiliamos e criamos a FUNCCEP, relembrando que o único motivo deste racha não chegou a ser nem a diretoria da Casa da Cultura, mas apenas seu presidente, o qual achamos que poderia colaborar com o movimento exercendo seu atual cargo de vereador e não dirigente de entidade que aliás de artista ele nada tem. Uma coisa é ser artista e político, outra é querer usar as entidades para alcançar seus objetivos políticos.
Mas existem muitos políticos literatos ou artistas.
Acredito que os atuais políticos que estão no poder, com exceções, não estão interessados no desenvolvimento cultural, estão muito mais preocupados é com a proteção dos seus latifúndios, suas mordomias e etc… Agora nos resta apenas uma esperança quando percebemos que apesar de tudo, muitos resistem, e falo aqui independentemente da condição de presidente do CCRB, acredito no trabalhador brasileiro, estes trabalhadores que foram nossos avós, nossos pais e agora somos nós. Sempre oprimidos, mas no entanto sempre os que mantém toda uma força que consegue manter este país, acredito também na sensibilidade social do artista e muito me alegro quando os vejo tomando a frente e até mesmo disputando cargos, como é o caso do Gilberto Gil na Bahia e outros mais.
O Conselho Municipal de Cultura tem cumprido sua função?
O Conselho Municipal de Cultura, do qual sou um de seus integrantes, é formado por pessoas eleitas por entidades e é representativo, desde que a prefeitura considere as decisões tomadas por este Conselho. Até agora nosso trabalho foi mínimo, porque nos coube somente a aprovação de verbas destinadas às entidades culturais. Espero que este ano tenhamos mais trabalho e mais autonomia naquilo que decidirmos, sem esperar que as coisas sejam cumpridas de acordo com os interesses da Prefeitura, que até agora nos tem colocado em último plano. Para eles talvez seja mais interessante politicamente fazer obras faraônicas que aparecem muito mais, que responder às nossas reivindicações tão antigas. Ainda existem pessoas que acreditam que uma sociedade pode sobreviver sem cultura.
* Fonte: Texto publicado com o título “Centro Cultural Rui Barbosa: em Vida?” na edição de 10 de fevereiro de 1988 da revista Vox Patos, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Universidadefalada.com.