MARIA ESTHER MACIEL LANÇA “LITERATURA E ANIMALIDADE”

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digitalizar0001Os animais habitam o universo da literatura há muitos séculos. Interessada nos escritos que refletem essa constatação, a escritora e pesquisadora Maria Esther Maciel vem se dedicando ao estudo dessa temática, o que resultou no livro Literatura e Animalidade, a ser lançado hoje, na livraria Scriptum. Na obra, ela reúne uma série de ensaios em que a abordagem dessa questão surge amparada pela presença de reflexões de filósofos, a exemplo de Michel de Montaigne, Jacques Derrida, Gilles Deleuze e Giorgio Agamben, e da análise de textos de Machado de Assis, Clarice Lispector, Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, Franz Kafka, Jorge Luis Borges, J. M. Coetzee, entre vários outros.

Um exemplo é o conto “Ideias de Canário”, de Assis, publicado em 1863. Nesse texto, o escritor narra o encontro entre o pássaro e um ornitólogo, que fica espantado com a inteligência demonstrada pelo bicho. “Machado de Assis é quem primeiro, no Brasil, empreendeu reflexões sobre a questão do animal com vistas a uma crítica também à própria noção de humano e humanismo que vigorava no século XIX. Ele chama atenção para alguns problemas relativos à situação dos animais na modernidade. Ele também escreve crônicas em que se posiciona contra as touradas, os experimentos com animais em laboratórios e defende a criação de sociedade protetora dos animais no país”, pontua.

Ao longo dos capítulos, a estudiosa recorda, assim, diferentes momentos da produção literária e como eles se relacionam com pensamentos expressados em diferentes épocas. “A partir das ideias de Descartes, no século XVIII, houve uma cisão na fronteira entre homem e animal, o que já tinha acontecido também na Idade Média. O animal surgia desprovido de alma e era associado à violência, à luxúria. Na era moderna, ele foi ligado à ideia de máquina de pensamento cartesiano. Se os bichos não pensavam, logo eles eram entendidos como máquinas”, enfatiza.

Essas perspectivas passam a ser questionadas, principalmente, a partir do século XIX. Por isso, em “Literatura e Animalidade”, Maciel dá prioridade aos escritores que atuam entre os séculos XX e XXI. “Nesse recorte, nós percebemos que há muitos autores que já lidam com a questão do animal movidos por inquietações de ordem ecológica, ética e política. Ou seja, diante das catástrofes eminentes de extinção de espécies surge uma conscientização maior sobre a condição soa animais e a maneira como nós lidamos com eles”, afirma.

Ela cita Guimarães Rosa como “o grande animalista da literatura brasileira”. “Rosa lida com animais de uma maneira que consegue mostrar que eles são seres providos de sentimentos, de habilidades e de saberes sobre o mundo. Há, sobretudo, uma relação de afeto, de respeito pelos animais e uma interação com eles que é apresentada de uma maneira muito intensa”, comenta Maciel, que reforça a contribuição da literatura nesse campo de estudos. “Até os filósofos reconhecem isso em relação à poesia. Derrida, por exemplo, afirma que se a razão animal houver cabe à poesia trazer isso para o leitor”, conclui.

NOTA: Maria Esther Maciel de Oliveira Borges nasceu em Patos de Minas a 1.º de fevereiro de 1963. Mora em Belo Horizonte desde 1981. É escritora e professora de Teoria da Literatura e Literatura Comparada da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). É mestre em Literatura Brasileira pela UFMG e doutora em Literatura Comparada pela mesma instituição, com Pós-Doutorado em Cinema pela Universidade de Londres. Integra o projeto internacional “Problematizing Global Knowledge -The New Encyclopaedia Project”, do Theory, Culture & Society Centre, da Nottingham Trent University (Inglaterra). Suas publicações incluem os seguintes livros: As Vertigens da Lucidez – Poesia e Crítica em Octavio Paz; Vôo Transverso – Poesia, Modernidade e Fim do Século XX; A Memória Das Coisas, ensaios de literatura, cinema e artes plásticas; O Cinema Enciclopédico de Peter Greenaway (org.), O Livro de Zenóbia (ficção), O Livro Dos Nomes (ficção), O Animal Escrito (ensaio) e As Ironias da Ordem (ensaios). Foi Professora Residente do IEAT – Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares da UFMG (2009/2010). Desenvolveu, como pesquisadora do CNPq, os projetos “Poéticas do Inventário” (2004/2007) e “Bestiários Contemporâneos – animais na literatura” (2007-2010).

* Fonte e foto: Texto de Carlos Andrei Siquara publicado com o título “Olhares para as fronteiras entre o humano e o animal” e subtítulo “A autora Maria Esther Maciel lança o livro ‘Literatura e Animalidade’ hoje na livraria Scriptum” na coluna Livros do caderno Magazine da edição de 09 de abril de 2016 do jornal O Tempo.

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