JORNAL “A CARAPUÇA” ZOMBA DA ENERGIA ELÉTRICA EM 1916

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A1O fim das lamparinas, candeias e lâmpadas Aladim, assim esperavam os empreendedores, começou a 14 de agosto de 1915, quando a recém-criada Força e Luz da Cidade de Patos sem ainda o “de Minas” inaugurou, com muita festa, a luz elétrica na cidade. Apesar da alegria inicial, a maior parte dos habitantes preferia continuar utilizando a luz de candeias à óleo ou lamparinas à querosene. Isso porque a iluminação era muito inconstante. Uma campanha chegou a ser feita pelo jornal Cidade de Patos, em várias edições, apelando para que o povo instalasse a energia em suas casas. Dois eletricistas da época, João da Luz e seu irmão Dedeco, com escadas ao ombro, montados em suas bicicletas, varavam a noite atendendo chamados, “para ver como a luz está fraca”. O Zé Albino (era infalível a sua crítica) gostava de riscar um fósforo “para ver se a luz estava acesa”.¹

Pouco menos de um ano após a inauguração da Força e Luz da Cidade de Patos, a situação foi ridicularizada pelo jornal A Carapuça (edição de 26/04/1916), editado por Alfredo Borges e que tinha por hábito fazer humorismo com as mazelas da cidade. Num texto alegórico, o semanário brinca com os piscas-piscas e apagões da luz e, aproveitando a oportunidade, cutuca a administração pública² por causa da infestação de pernilongos e comparando os dirigentes a pardos gatos da noite:

– Mamãe, a D. Usina tambem soffre dos olhos?

– A D. Usina?

– Sim, pois, a Sara, não disse que o maninho tem o sestro de piscar, porque soffre dos olhos?

– E’ verdade! Mas, Usina não é gente, não é animal e, portanto, não tem olhos…

– Pois, como é que, de vez em quando, eu a vejo piscar? Ainda uma noite d’estas, ella foi piscando, piscando, até fechar os olhos, deixando tudo ás escuras. Eu estava á cata dos pernilongos que infestavam o meu quarto, quando a coisa escureceu como pó de café, mesmo no momento em que eu ia descarregar o golpe de chinella em um dos taes que estava redondo de cheio…

– Esta piscação da Usina è devido aos cochilões do vigia d’ella.

– Ah! De sorte que quando o vigia cochila, a Usina é que pisca; e quando elle dorme, ella è que fecha os olhos?

– É isso mesmo!

– Ah! então, na sexta-feira da paixão, elle dormiu muito, heim, mamãe?

– Dormiu! Tanto que não ouviste o berreiro do povo na Egreja para acordal-o?

– Si ouvi! Ainda me arrepia o cabello quando me lembro! Eu tive tanto medo que, quando vi a escuridão, ou antes quando não vi nada, embarafustei-me pela Egreja a fora e fui-me esconder. Estava eu bastante quietinho, quando senti que puxavam minha perna; dei um grito de terror, e ouvi em seguida o baque de um corpo no chão. Feita a luz, reconheci que tinha me escondido no gavetão da sacristia, e alli ao pè de mim jazia estatelado o velho sacristão.

– Cruz! Credo! A escuridão não foi a causa do pavor, do panico, não, a causa principal foi o reflexo da luz dos phosphoros nos oculos d’aquelles que dominavam o povo. Pois não notaste que elles pareciam gatos enormes… no escuro? Por isso é que dizem que, de noite, todos os… pardos são gatos.

* 1: Leia  “Eletricidade: Da Lamparina à CEMIG – Histórico da Força e Luz”.

* 2: Marcolino de Barros era o presidente da Câmara e chefe do Executivo.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Fonte: Arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam, foi publicado com o título Calinada³.

* Foto: Estação Distribuidora que ficava localizada na hoje Praça Desembargador Frederico, do arquivo da Fundação Casa da Cultura do Milho.

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