Nos idos de 1930, na antiga Casa Gotte, observei um rapagão, tipo sanguineo, de físico avantajado, alegre, simpático ao extremo, transportando um saco de 60 quilos debaixo de cada braço e depositando sobre um estrado. Ainda era um rapazola, estudante do ginásio, também curioso perguntei ao meu tio-avô, Coronel Amadeu Maciel, dono do estabelecimento. Quem é este homem atlético? É o meu braço direito, Pacífico Soares. Assim tomei conhecimento com um dos homens mais destacados de nosso município.
Com o passar dos anos, nossa amizade foi sempre aumentando, quando nos tornamos caçadores. Acompanhei seu progresso vertiginoso. De empregado passou a proprietário de um Armazém, onde hoje se acha um belo edifício na rua Dr. Marcolino. Havia de tudo nessa Mercearia, de cabos de tambú, para as ferramentas dos agricultores, até um açougue higiênico com produtos bovinos e suínos. Sua freguesia multiplicou-se fantasticamente, seus lucros corresponderam ao seu trabalho honesto, conseguindo educar todos os filhos, sua maior ambição durante a vida. Estou quase certo que em Patos de Minas nunca houve outro cidadão com o compadresco de Pacífico. Até falecer¹, contava com quase dois mil compadres; seus amigos e admiradores, mesmo que lhe não tivessem dado um filho ou filha para batizar, tratavam-no de Compadre.
Foi vereador, jurado, diretor ou presidente de inúmeras associações beneficentes. Esportista entusiasmado, filiado à antiga UDN, etc., e prestou ajuda financeira aos irmãos, cunhados e todo amigo que lhe pedia alguma coisa. Talvez não haja uma única Igreja Católica Romana por aqui, a qual não tenham uma porta ou janela, ou vitral, cimento, madeira em geral, que não tenham sido doadas por Pacífico Soares.
Foi um dos pioneiros em máquinas beneficiadoras de arroz, milho, café, etc., assim como serraria para desdobrar madeiras. Caridoso por natural, construiu mais de 200 casas, dando emprego a dezenas de pedreiros, marceneiros, bombeiros etc., fornecendo material e auxiliando este ou aquele compadre. Tivesse eu espaço para falar muito mais das virtudes deste insigne benfeitor para a pobreza e Comunidade Patense.
Outrora caçávamos nos campos verdes e alagados, próximo às Alagoas, atrás de codornas, pombos ou nhambus. Um cão Pointer de sua propriedade, cujo nome não me vem à memória atualmente, estacou diante de uma moita de capim provisório, quando Pacífico, com a face radiante de entusiasmo e emoção exclamou: Compadre, vai voar uma, vamos ver quem derruba. Havia uma árvore mais alta que as comuns naquela parte, destacando-se das demais. Na fração de segundo que a codorna se levantou em voo horizontal, um gavião pombo que estava vigiando na árvore se lançou vertiginosamente sobre a vítima. Disparamos nossas espingardas ao mesmo tempo. O gavião e a codorna caíram fulminados. Quem teria matado os dois pássaros? Ao questionar o caso, meu saudoso companheiro concluiu com modéstia: Foi você compadre, é claro! Até hoje me pergunto, teria sido eu mesmo? Assim foi Pacífico Soares meus caros leitores, bom, educado, humilde, prestativo, sem orgulho e um grande caçador.
* 1: 26 de setembro de 1988.
* Fonte: Texto de Adhemar Ferreira Maciel, do arquivo de Grace Soares (filha do Pacífico).