Facilmente me deixo empolgar por um homem, pelas suas qualidades e virtudes. José Rangel é um deles. Foi o pioneiro do progresso de Patos de Minas. Talvez nesta cidade ainda não tenha pisado homem tão extraordinário, trabalhador, organizado, honesto à toda prova.
Veio para nós de Estrela do Sul, sua gloriosa terra natal, então conhecida por Bagagem. Fixou sua residência ali na Rua Olegário Maciel, onde hoje reside D. Juninha.
Casou-se com D. Quita Rangel, também de Bagagem – hoje viúva com residência em Ipanema, no Estado do Rio. Deus não lhe deu filhos, mas criaram filhos dos outros. Foram eles: Joaquim, Lília e Lourdes, ainda vivos, no Rio de Janeiro. Em 1933 mudou-se Rangel para o Rio, onde, em pouco tempo, cercou-se de uma grande roda de amigos, que sabia cativar.
José Rangel era homem de uma personalidade ímpar. Exigia respeito, sabendo respeitar a todos. Na parede de sua oficina mecânica, colocara um lembrete: “Não converse em serviço. Tempo é dinheiro”. Exigia de todos seus empregados o máximo de pontualidade. À hora de abrir a oficina pela manhã, ele pessoalmente o fazia, não aceitando atraso de um minuto de quem quer que fosse.
O empregado que chegasse atrasado não assinava mais o ponto, ficando obrigado mesmo assim a trabalhar o dia todo. Em caso de doença, Rangel não descontava uma hora que fosse, de ninguém, a não ser que se tratasse de doença venérea. Sua oficina era ali no local onde se ergue hoje o edifício do Sr. Ilídio Pereira.
A corrida de ônibus para Catiara também pertencia a Rangel. Ele foi quem fez a estrada e os transportes coletivos deviam manter-se rigorosamente dentro do horário. Certa vez, o Delegado de Patos de Minas ia viajar a Belo Horizonte, devendo embarcar lá em Catiara. O ônibus saia às 11 horas da manhã. O Delegado telefonou para a agência, avisando que ia também. Quando o relógio da agência bateu as onze horas, o motorista ficou em dúvida, sendo logo advertido por Rangel: “Motorista, cumpra o seu horário”. Minutos após chega o Delegado, todo esbaforido, alegando que havia telefonado para a agência, pedindo que o esperasse. Rangel foi positivo:
– Excelência, o horário do ônibus é onze horas. Mas aqui está o meu carro para levá-lo, onde desejar.
E mandou seu carro levar o Delegado até Catiara.
A corrida de ônibus de Rangel era regular. Seu ônibus (grande na época) só comportava 16 passageiros sentados. Só aceitava passageiros assentados. Nunca, porém, deixou um passageiro excedente sem condução. Se em Catiara chegassem 17 pessoas, dezesseis vinham no ônibus e o outro (ou outros), ficava aguardando mais um pouco e Rangel mandava seu carro ir buscá-lo em Catiara, pelo mesmo preço do ônibus. Isto é coisa que hoje ninguém acredita, pois não se vê mais. É atitude somente de um homem corretíssimo como José Rangel.
Pode-se dizer que o primeiro telefone, a primeira oficina mecânica organizada, a primeira corrida de ônibus, a melhor loja da cidade, a Lusitana, eram de Rangel. A Lusitana era ali na Major Gote, ao lado do gabinete dentário do Dr. Sebastião Borges. O José Ventura Malheiros era sócio na Lusitana. José Rangel era ainda encarregado do Escritório do Banco do Comércio em Patos e da Agência Chevrolet e Ford. Foi o primeiro patrão a pagar férias aos seus empregados. A visão da justiça social era uma de suas características mais marcantes.
Todos que trabalharam para Rangel nada tinham a reclamar deste homem íntegro, justo e honesto. Encontram-se ainda vivos e saudosos de tão abnegado e humano patrão, Itagiba e Antônio Caixeta, o nosso popular Zé Mico, o Sebastião Batista, o Randolfo Pinheiro, o Tuniquinho (charreteiro), o Zé Augusto de Melo e o João Cirino Neto. E falecidos há pouco tempo, tiveram o dia de conhecê-lo a trabalhar para ele, os Srs. Benedito Caixeta, Militão, Renato Dias Maciel, Juquinha Caixeta e Antônio Silva, João Cocão (diga-se de passagem, Rangel detestava apelidos), José Batista, José Silveira, Jorge Nascimento e mais outras dezenas de ótimos empregados. O Alino Campos era o agente de escritório de passagens e atendia o telefone. D. Amazilia Garcia passou a trabalhar no escritório de Rangel em 1930, juntamente com José Frazão e D. Aparecida Caixeta, recebendo as primeiras orientações de escritório, ali onde se ergue a casa do Ilídio Pereira. Aliás, pertencia a Rangel quase a metade do quarteirão onde se encontra, hoje, o imponente edifício do Ilídio Pereira. No escritório bancário, trabalharam para Rangel dois guarda-livros: Vivente Tavares e Matos, que não correspondiam bem aos desejos do patrão. Advertidos duas vezes, da terceira vez ao chegarem no serviço encontraram a conta acertada, o dinheiro contado e a desagradável ordem de Rangel: Está aqui a conta de vocês. Estão despedidos”.
José Rangel foi um homem de um dinamismo e energia fora de série. Patos deve-lhe muito do que hoje ela é. Pena que Patos de Minas não lhe tenha dado um reconhecimento à altura do que ele merece. Pelo menos uma das ruas principais da cidade devia perpetuar o seu nome. É certo que existe uma rua já ostentando o seu nome. É ali entre a Prefeito Camundinho e a Avenida Paranaíba. Mas não passa de uma ruela, pequena demais. Rangel merece muito mais, ou então significa que nós não damos valor àqueles nossos antepassados, que trabalharam e deram tudo de si para grandeza da cidade. Parabéns a D. Amazilia Garcia, que no reconhecimento do valor de Rangel, consagra-lhe a longos anos uma escola de datilografia com o nome “Escola de Datilografia J. Rangel”.
Parabéns, Dona Amazilia!…
* Fonte e foto: Texto de Padre Tomaz Atílio Olivieri publicado na edição de 18 de outubro de 1978 do Boletim Informativo da Gráfica e Papelaria Olivieri, do arquivo de Newton Morais Andrade.