Não vamos tratar aqui do grande General, heroi da guerra com o Paraguai, e que acabou aceitando uma representação política no Senado do Imperio. Queremos tratar de Osorio Dias Maciel, que o Presidente Antonio Carlos “promovera” a general, nos momentos em que certos embaraços e complicações na familia politica de Minas exigiam da sua veia de sangue azul uma graciosa “sortie”, uma cartada de espirito cuja impressão agradavel perturbasse o assunto escabroso ou lhe desviasse o objetivo inconveniente.
A personalidade de Osorio Maciel tem feições interessantissimas, contrarias mesmo a certos aforismos filosoficos e sociologicos que, com serem anti-cientificos, se prestam a demonstrações de relações sociais doutrinariamente fixadas.
Não tendo filhos, nem por isto alimentou ideais ou criou fantasmagorias. Pertencendo a uma estirpe educada de politicos, preferiu acompanhar a corrente que, não se alheiando nos entrançados da Arte, procurava fugir ás responsabilidades de direção, eximindo-se, assim, de inevitaveis estigmas com que adversarios malevolos costumam ferretear os competidores. Muitos divisam, nesta faceta de Osorio, uma atitude dolorosa. Não há tal, entretanto.
A “arte de governar”, na expressão embora passadiça de Comte – o filosofo cujas doutrinas morreram com o seculo que o iluminou – se divide em politica, propriamente dita, e economia. Duas ramificações inseparaveis, que se completam, e que o dirigente tem que enfeixar nas mãos, mesmo com sacrificio de seus haveres particulares. Daí o afastamento de muitos dos que vêm nas posições de guias o perigo de desmoronamento dos arranjos economicos.
Osorio, espirito realista, sempre amou a liberdade democratica, conservando-se, porem, de braços com a liberdade economica. Via neste a segurança do outro ramo da questão politica, por isso mesmo que a segurança do que lhe era privativamente sagrado. E eis porque jamais tomara parte nos conciliabulos dos dirigentes, todos, aliás, irmãos e sobrinhos.
Convem, entretanto, examinar outro aspecto da figura desse legitimo descendente dos nobres da Taipa. Osorio foi sempre um dos “macieis” mais populares de Patos. Jamais subordinou suas relações de amisade ás conveniencias partidarias, guardando sempre, de par com a serenidade peculiar aos seus, a habitual gravidade, absoluta discrição e requintado decoro, nos transes mais difíceis das acirradas campanhas. Bondoso, na verdadeira acepção do vocabulo, nunca se ouviu de seus labios a menor recriminação contra um adversario, tivesse este por mais injusto nos conceitos à sua dignidade, às suas atitudes publicas e privadas. Esta bondade de Osorio, que envolve todos os ramos de beneficencia, tornou-se proverbial em Patos e considerada até na capital do Estado, ao tempo da presidencia do saudoso irmão. Antes, em sua terra, como para significar a confiança, a familiaridade, na expressão mais pura dos rincões mineiros, ele era simplesmente o “Osorio Dias”, o “Osorio Maciel”, sem abstenção da designação de familia, para se não confundir com os inumeros “Osorios” existentes, muitos deles, talvez, apadrinhados nas qualidades morais e sociais que exornam a simpatica figura do respeitavel sozia.
Já na capital do Estado, apezar da culminancia politica a que guindou a familia, Osorio não se deixou minar pelo orgulho e vaidade, guardando, antes, a mesma simplicidade, distribuindo favores e intermediando dissenções se toda especie. Tornou-se de tal forma conhecido em Belo Horizonte, pela fidalguia, pelo acentuado espirito de generosidade, que a referencia – “Coronel Osorio” – cedeu logar ao singelo e ultra-popular – “Coronel”, simplesmente, sem outra nomeação, resumindo o gracioso posto militar toda a estimativa das prendas morais de que é portador.
Se é verdade, como está nas Escrituras, que o prolongamento da nossa vida não é sinão uma dadiva de Deus, então, bem que se afirme, o bonissimo Osorio vai recebendo as bênçãos do Alto, pelas preces da multidão que o venera.
Rio, 5 – 44.
Damião Jesícola
* Fonte: Texto de Damião Jesícola publicado com o título “Osorio” na edição de 02 de julho de 1944 do jornal Folha de Patos, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Destaque individual da foto original publicada em 20/06/2014 com o título “Encontro de Titãs em 1930”, do arquivo de Newton Ferreira da Silva Maciel.