CÓDIGO, O

Postado por e arquivado em CANTINHO LITERÁRIO DO EITEL.

Nos áureos tempos da Zona Boêmia, principalmente na Rua Padre Brito e adjacências, cena comum era a presença de gente importante da Cidade e dos Distritos nas casas, boates e pensões das mulheres da alegria. Algumas ganharam fama na profissão, como a Brama, a Eva, a Joaninha, a Maria Cachorra, a Marietinha e a mais famosa delas, a . Fato é que naquele tempo, a maioria das esposas daquela gente importante sabia da realidade de seus maridos e aceitava candidamente para evitar maiores aborrecimentos.

Mas, porém, todavia, contudo, enquanto os maridos se divertiam com as mulheres da alegria, algumas esposas mais decididas um pouquinho do que as outras, resolveram dar o troco na surdina. Mas, para ficar bem com o Divino, após o troco partiam para a confissão na Matriz em busca do perdão, tantas vezes quantas fossem necessárias. Para o caso, o confessor decidiu criar um código para elas no intuito de evitar vazamentos constrangedores a ouvidos estranhos sensibilíssimos. O negócio era o seguinte: na confissão para pedir perdão pelo adultério elas deveriam dizer trombei no poste.

Legal por uns tempos, mas eis que, subitamente, o confessor faleceu e nenhum outro pároco sabia da combina. Quando o novo confessor assumiu o posto, ficou praticamente sem saber que penitência aplicar à mulher que confessava ter trombado no poste. Afinal, canonicamente falando, desde quando é pecado uma dona de casa trombar num daqueles postes no meio das ruas?

O novo confessor ficou tão intrigado com aquelas mulheres que estavam trombando nos postes – já imaginando alguma doença nova que estava atacando exclusivamente os olhos das mulheres patenses – que resolveu procurar um afamado vereador da época para que ele intercedesse junto ao prefeito:

– Coisa esquisita isso, de uns tempos para cá as mulheres deram pra trombar nos postes, por isso venho, encarecidamente, solicitar ao senhor que, junto com todos os membros da Câmara Municipal, pressione o prefeito para que o acordo com a CEMIG venha e que estes postes sejam retirados do meio das ruas para evitar que mulheres continuem trombando neles.

O tal afamado vereador riu às pampas, pois ele não tinha conhecimento de que mulheres estavam trombando nos postes, aliás, ninguém da Cidade tinha conhecimento desse negócio de mulheres trombando nos postes, e isso não agradou ao confessor, que rebateu:

– Desculpe vereador, o senhor que está zombando da minha solicitação, não deveria estar zombando dela, pois a sua esposa confessou que já trombou no poste cinco vezes.

A CEMIG veio, os postes do meio da rua se foram, a Zona Boêmia se foi, as mulheres da alegria continuam mais ativas do que nunca em pontos estratégicos, os maridos continuam nas deles e elas, as esposas, bem, não é da minha conta, pois só sei como era!

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 25/02/2020 com o título “Palacete Mariana na Década de 1960”.

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