TABAJARA, O JUSTO

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O Tabajara chegou vindo sabe-se lá de onde. Trazendo consigo uma mochila com algumas mudas de roupa e uns trocados no bolso, arrumou um quarto num dos simplórios dormitórios no entorno da Rodoviária José Rangel. Após alguns minutos de descanso, saiu zanzando pela cidade em busca de qualquer tipo de trabalho, pois a grana que tinha só dava para sobreviver uma semana. Assim foi passando pelos comércios e perguntando se precisavam de alguém para trabalhar. Nada nos três primeiros dias, até que no quarto se deparou com uma pequena borracharia nos arredores da rodoviária que lhe deu a oportunidade que precisava.

No entanto, a oportunidade não era tão boa assim: salário baixo e sem carteira assinada. Mas, sem alternativa, pelo menos para aqueles primeiros dias, resolveu encarar o emprego, o que lhe garantia, pelo menos, pagar o dormitório e se alimentar melhor. Bem treinado, com uma semana já estava craque no serviço. Foi justamente a partir daí que surgiu um terceiro problema: o patrão saia a todo momento e ficava horas e mais horas fora da borracharia, causando-lhe uma sobrecarga de trabalho que não era recompensada financeiramente.

Com um mês, resolveu que era o momento de ver seu salário aumentado. Assim, toda vez que o patrão saia, o Tabajara surrupiava determinada quantia do caixa. Como não havia controle sobre a quantidade de serviços executados, o patrão jamais percebia o rombo. Depois de seis meses, veio uma enorme novidade: a borracharia foi vendida. Já se considerando desempregado, veio a surpresa: o novo patrão não só aumentou o seu salário e assinou a carteira como também só saia do trabalho para almoçar e abaixar as portas no fim do expediente.

Hábito noturno do Tabajara era tomar umas pinguinhas num boteco lá nas redondezas. Foi lá que ele conheceu um sujeito do seu naipe e os dois se confidenciavam. Certa vez, o borracheiro disse:

– Ô danura, vou ter que deixar a borracharia, logo agora que eu já estou até recebendo mais que um salário mínimo e com carteira assinada.

O amigo estranhou por demais da conta aquela decisão do Tabajara, mas ouviu a explicação:

– Cê sabe muito bem que o antigo patrão, além de me pagar muito mal, jogava tudo nas minhas costas, por isso eu lhe surrupiava uma graninha boa. Agora tudo mudou, recebo bem e o patrão é gente boa demais da conta, não posso fazer isso com ele, todo dia eu com a mão coçando pra tirar dinheiro do caixa sem saber até quando vou resistir. É, vou largar aquela borracharia.

Foi-se o Tabajara, o justo, e sabe-se lá onde ele está atualmente.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 25/02/2020 com o título “Palacete Mariana na Década de 1960”.

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