MONSENHOR FLEURY OPINA SOBRE O CARNAVAL EM TEMPOS DE 2.ª GUERRA

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TEXTO: MANOEL FLEURY CURADO (1943)

A meu pedido, transcreveu “Folha de Patos” no seu penultimo numero o artigo − Carnaval com o paiz em guerra − que achei oportuno e sensato. No seu ultimo numero a mesma “Folha de Patos” estampou o artigo − Carnaval e Guerra − em velada oposição áquele primeiro artigo, que subscreveria “intotum”. Como estão em jogo os principios que defendo, e que aliás são os mesmos da Igreja e das pessôas sensatas, achei do meu dever fazer aqui alguns reparos ao mencionado artigo. E’ claro que as consequencias seguem as premissas. O homem pensa e age conforme os seus principios. Portanto, partindo-se de premissas diferentes, as conclusões hão também de ser diferentes. De principios falsos, chegaremos a conclusões tambem falsas. A Igreja não condena nem prohibe as diversões moderadas e honestas, condizentes com a qualidade de catolico e cristão. O que a Igreja condena de acordo com os ensinamentos de Jesus Cristo e com o bom senso, e outrossim prohibe aos seus filhos, são as loucuras e desregramentos do Carnaval, verdadeiras orgias e bacanais, improprias de gente equilibrada e que quer ser catolica de verdade. Pode-se divertir e expandir, mas sem perder o “controle” de sí, a compostura e o bom uso da razão. Do contrario o infelizmente tradicional “triduo carnavalesco” em vez de ser “colorido de alegrias”, terá sido um negrume de tristezas, ao depois. Em fim de contas, carnaval é sempre carnaval, isto é, diversão em que se excede, em que se toma a liberdade mais extremada, que atinge à licenciosidade mais revoltante. “A hora amarga que atravessamos é de concentração de forças e de energias”. Perfeitamente, e por isso mesmo é que não podemos concordar com este Carnaval espetaculoso, berrante e dispersivo que é o enfraquecimento e desfibramento de nossa mocidade, esperança da Patria. Falar em “espiritualidade” em um clube carnavalesco é o maior paradoxo que se haja ouvido. Espiritualidade e carnaval são termos que se entrechocam pela sua significação. Portanto, o carnaval com tal, não poderá nunca ser “hora de recreio e de espiritualidade” ao mesmo tempo, e ao contrario, êle está fadado a formar esses cérebros mórbidos e doentios, mediante as noitadas de orgias acompanhadas das infaliveis libações alcoolicas, tão do gosto da gente carnavalesca.

Não é ser nenhum “extremista” profligar os males do fatidico Carnaval, combater o seu maldito extremismo, que leva infelizmente a muitos senhores e senhoras ao extremismo da insensatez.

Até a defunta “democracia” tem que sair toda garbosa, mas coitada, entre “esgares e dichotes” no culto ao rei Momo! E note-se que isto, estando “a alma brasileira mergulhada no abismo da guerra”, e no carnaval e depois do carnaval, estará “pronta a suportar os maiores sacrificios”. Essa alegria não é “sadia” nem “palpitante”; é simplesmente doentia e saltitante. O carnaval carioca, que é a coisa mais séria que por lá existe, não nos serve de exemplo. Agora, porque o carioca toma rapé nós vamos espirrar?

Assim mesmo, vejamos o que disse o ano passado, numa entrevista, um ilustre professor francês, da Universidade de S. Paulo: “Senti profunda tristeza e nem podia deixar de sentir, porquanto amo o Brasil e sua gente. Cenas como essas se explicam em tribus selvagem do interior da África, não porém em um pais civilizado”.

E esta é a impressão partilhada por muitos outros estrangeiros ilustres, em nossa terra. Não é preciso que se tenha consciência catolica, nem o senso moral muito apurado para se perceber quão revoltante é o que se vê e se ouve nos dias licenciosos do Carnaval. Basta que se tenha um pouco de bom senso, uma dose de caridade e patriotismo para reprovar o esbanjamento de tanto dinheiro, em lança-perfume, confete, fantasias, vestidos, bebidas, etc., quando a vida está pela hora da morte, e tantos patricios nossos morrem na pobreza e na miseria, quando se apela, em todos os povos, pelas Legiões de Assistencia, pelos Serviços de Defesa Nacional! E o patriotismo carnavalesco vai desfibrando a nossa indefesa mocidade, sobretudo nesta hora tragica de nossa Historia!

* Fonte: Texto publicado com o título “Carnaval Com o País em Guerra” na edição de 14 de março de 1943 do jornal Folha de Patos, do arquivo da Fundação Casa da Cultura do Milho, via Marialda Coury.

* Foto: Arquivo da Escola Estadual Monsenhor Fleury.

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